Marcos Nobre: convulsão social vai esperar até 2018?
Do professor Marcos Nobre, no Valor:
Sabe-se lá como, o governo Dilma conseguiu sobreviver a uma tempestade perfeita até o momento em que o ministro Teori Zavascki ordenou a prisão de Delcídio do Amaral, senador no exercício do mandato, líder do governo no Senado. Nesse mesmo dia 25 de novembro de 2015, a decisão do ministro foi referendada pela 2a. Turma do STF e confirmada em votação no Senado. A partir desse momento, o sistema político entrou em estado de pânico permanente.
A barbaridade jurídica perpetrada pelo STF com a prisão do senador abriu a caixa de Pandora das atrocidades jurisdicionais. Foi a senha e a chancela para a multiplicação das arbitrariedades em todos os níveis. E não apenas no Judiciário. Não por acaso, o acolhimento do pedido de impeachment de Dilma Rousseff por Eduardo Cunha aconteceu exatamente uma semana depois da prisão de Delcídio.
A interpretação do sistema político do episódio foi inequívoca: o governo Dilma não tinha condições de oferecer proteção a quem quer que fosse. Se mesmo parlamentares no exercício do mandato e com privilégio de foro podiam ser presos após o vazamento de uma gravação, ninguém poderia se considerar a salvo da exclusão direta e imediata do jogo. Foi quando o impeachment surgiu como tática para travar a Lava-Jato e enquadrar o Judiciário. O preço máximo que o sistema estava disposto a pagar era aquele já pago quando do processo do mensalão: circunscrição limitada, clara e prévia do círculo de mortos e feridos para que o restante pudesse se salvar.
A recente vitória de Renan Calheiros na queda de braço com o STF pode dar a ilusão de que o impeachment finalmente alcançou seu objetivo e que a Lava-Jato será travada, pelo menos no que diz respeito a quem tem privilégio de foro naquele tribunal. O contrário parece mais provável. O STF não tem força para fechar a caixa de arbitrariedades que ele próprio abriu. A última instância do Judiciário não pode desferir golpes abaixo da cintura constitucional e manter ao mesmo tempo a posição de árbitro imparcial.
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O Brasil chegou a uma situação que, na Argentina da crise de 2001, encontrou sua formulação no “Que se vayan todos”, na exigência de renúncia coletiva de todo político com mandato. Na Argentina, a crise se arrastou por quase um ano e meio, até a eleição presidencial de 2003. No Brasil não será diferente. Não há outra saída para o impasse atual senão a realização de eleições para a presidência da República e para o Congresso. O que não se sabe é se a convulsão social que está à espreita vai aceitar esperar até 2018. O sistema político parece continuar a acreditar que sim. É alta a chance de que vá errar uma vez mais.