“Me preocupo com a ilusão de que a moralidade é capaz de resolver nossos problemas”, diz Dira Paes
Uma das lembranças que Dira Paes, 50, tem dos anos 1990 é a “atitude das apresentadoras da MTV”, conta Bruno Soraggi, em reportagem na coluna de Mônica Bérgamo, na Folha.
“Nunca tinha visto na televisão nenhuma menina parar com aquela postura meio assim”, diz a atriz enquanto faz uma pose despojada, com as pernas descruzadas. “Tinha algo novo ali. Eu imitava aquele jeito de Marina Person [risos]”, conta, referindo-se a uma das VJs da emissora.
Dira está no ar com a novela “Verão 90”, cujo enredo se passa naquela década. Na trama, a paraense interpreta Janaína. “Ela é o despontar da mulher contemporânea. Não é como a Lucimar, de ‘Salve Jorge’ [que Dira interpretou], que não tinha espaço para o romance”, avalia. “É uma trama oportuna porque fala do feminino agindo na sociedade.”
Também atua no filme “Divino Amor”, exibido no festival de Sundance, nos EUA, na semana passada. “[O filme propõe] uma discussão que vale muito a pena a gente ter, da fé e do ser humano. Para onde ela te leva?”.
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A atriz conversou com a Folha nos Estúdios Globo, no Rio.
Feminismo e assédio
“[Nunca tive a experiência] de ser coagida, imprensada, trancada [contra a sua vontade]. Mas já fui mexida em situações em que não podia me defender. Na rua, andando, ter que fugir. Tinha 12 anos quando tive o primeiro assédio. Eu e uma amiga estávamos na frente do colégio e um homem ficava manipulando o órgão genital dele pra fora”.
“Acho que todas as mulheres já passaram por esse tipo de situação. É cotidiano. E é isso o que a gente tem que romper. Mostrar a importância da sororidade, que são mulheres ajudando mulheres. Não é uma disputa. O feminismo é uma tentativa de igualdade entre homens e mulheres. Hoje não somos iguais. No século 21 a gente continua enfrentando problemas do século 18”.
“Não conheço mulher que não passou por uma situação de assédio. Talvez se não passou é porque não sabia que estava passando. O assédio não é só físico. É moral também”.
JOÃO DE DEUS
“Acho que todo mundo tinha curiosidade de conhecer Abadiânia [cidade em Goiás onde fica o centro espiritual do médium]. Eu fui porque estava fazendo um trabalho bem próximo e queria conhecer. Foi uma experiência maravilhosa. E pude observar que ele era um homem comum. Isso me chamou a atenção. Estar ali e poder ver os dois lados”.
Idade
“Completar 50 anos] Não tem uma chavinha que vira e faz clique. A minha idade é de uma mãe de um filho de dez anos e de um filho de três. Tive o primeiro com 38 anos. Foi natural. Foi prematuro, mas deu tudo certo. E não queria ser mãe de filho único. Tive três gravidezes naturais, mas não foram adiante. Aí decidi fazer uma assistida. E foi a melhor coisa que fiz. O Inácio e o Martim. Tenho idade pra eles”.
ESQUIZOFRENIA E ARTE
“Vivemos a era na qual a gente mais se comunica e na qual a gente menos conhece as informações que propagamos. Estamos vivendo uma era esquizofrênica [risos]. A arte é o antídoto contra essa esquizofrenia social, a ignorância. Quando você vê um quadro, um filme ou uma peça, não precisa ter estudado para entender. Aquilo se conecta com a tua alma. Nesse sentido, ela [a arte] é a libertação total. Um lugar onde nós todos somos iguais”.