Quando a gastronomia se posiciona politicamente contra seu governo, você chegou ao fundo do poço

O jornalista Marcos Nogueira, especializado em gastronomia, mandou um bom recado para Bolsonaro em seu blog Cozinha Bruta na Folha de S.Paulo:
“O país vive um momento crítico. Caíram as máscaras. Caiu a ficha até para quem não queria enxergar o circo de horrores que foi montado em Brasília. Ficou feio não se posicionar. O pessoal do setor tem cadeira cativa em cima do muro porque morre de pavor de perder a clientela. Dá para entender, mas não dá para aliviar a barra dessa gente. Nas circunstâncias presentes, a omissão é –pardon my French– coisa de cagão, de bunda-mole. Restaurantes e bares são mais do que pontos de venda de comida. Eles funcionam, acima de tudo, como centros de acolhimento e de convivência. A cadeira não escolhe a bunda que vai se sentar nela. Recebe ateus, macumbeiros, maconheiros, pinguços, artistas, poetas, palhaços, políticos e até dentistas”.
Ele desenvolve o raciocínio: “A cozinha acolhe imigrantes, ex-detentos, HIV-positivos, transgêneros, desajustados em geral. Cozinhar é uma atividade colaborativa, cooperativa, altruísta. Só não escrevo aqui a palavra ‘social’ para evitar ser apedrejado pelos valentões da internet. Ops, escapou. A gastronomia não pode compactuar com a intolerância. Não pode fazer vista grossa e ouvidos moucos para a escalada da barbárie. Não pode fingir que a cruzada anticivilizatória não tem nada a ver com ela”.
E completa: “Não dá mais para a gastronomia passar pano para gente de mentalidade medieval. Não interessa se o cara é um chef famosinho da TV. Não interessa se o cara faz o melhor sushi da galáxia”.