Quem foi Cassandra Rios, a escritora mais censurada no período da ditadura militar

Da BBC Brasil.
Ninguém foi mais perseguida pelos censores da ditadura militar brasileira (1964 – 85) do que Cassandra Rios, escritora recordista em vetos durante o regime, com 36 dos seus 50 livros publicados censurados durante a vida – fora algumas edições clandestinas.
“Cassandra Rios incomodou os militares por várias razões. A principal delas é o conteúdo erótico de seus livros, contrário a ‘moral e aos bons costumes’, como se dizia na época”, explica Rodolfo Londero, professor da Universidade Estadual de Londrina e autor do livro Pornografia e censura: Adelaide Carraro, Cassandra Rios e o sistema literário brasileiro nos anos 1970.
Nascida em 1932, em Perdizes, bairro classe média alta de São Paulo, Cassandra era pseudônimo de Odete Rios. Em 1948, aos 16 anos, publicou seu primeiro livro, A Volúpia do Pecado, uma história de amor entre duas adolescentes, se tornando a primeira autora do país de romances eróticos voltados ao universo homossexual feminino.
Na época, após ter sido rejeitado por todas as editoras de São Paulo, A Volúpia do Pecado foi publicado pela própria Odete com dinheiro emprestado pela mãe, dona Damiana, uma imigrante espanhola burguesa e católica. Sob o pseudônimo de Cassandra Rios, originalmente a sacerdotisa grega que profetizou o episódio do “cavalo de Troia”, o livro de estreia fez tanto sucesso que chegou a ser reeditado nove vezes em pouco mais de dez anos.
Até que, em 1962, foi proibido e tirado de circulação por ofender os valores familiares. Entre 1964 a 1985, anos da ditadura, outras três dezenas de livros da escritora seriam proibidos.
Para Londero, mais que o conteúdo erótico e homossexual, foi a combinação de duas características perigosas aos olhos dos militares que transformaram Cassandra Rios na “escritora maldita”, modo como era chamada pela ditadura: a sua sexualidade – a escritora era assumidamente lésbica – e a sua popularidade.
“Enquanto escritora, Cassandra sabia se comunicar com as classes populares”, afirma o pesquisador. “Enquanto lésbica, sabemos, baseados em farta documentação, que a ditadura considerava perigosa qualquer orientação sexual que escapasse da heteronormatividade.”
“A sociedade rotula o homossexual como cachaça de macumba, não como uísque”, brincou a escritora em 2001, pouco antes de morrer, ao lembrar da sua trajetória.
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