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“Quem insufla o ódio?”: Jean Wyllys responde artigo de secretário de redação da Folha

Da coluna de Jean Wyllys na Carta Capital:

 

“Dilma insufla ódio”, diz o secretário de Redação da Folha de S.Paulo, Vinícius Mota, num artigo cheio de delírios paranoicos e escrito com uma terminologia retrô que parece saída do túnel do tempo.

Possuído pelo espírito do senador americano Joseph McCarthy, Mota denuncia supostos planos da “elite vermelha” (!) para — inspirada nas “derivações subletradas do marxismo” — promover a violência política e o “prazer estético pela depredação”, deixar “mortos e feridos” e produzir um “banho de sangue”; mas, ao mesmo tempo, justifica a violência real, não imaginária, que as polícias militares produzem diariamente há décadas no país.

Isso mesmo: enquanto uma jovem é cegada em São Paulo pela polícia por protestar pacificamente contra o golpe de Estado e dezenas de pessoas, em diferentes cidades, são detidas sem motivo, espancadas nas ruas e vitimadas pela violência de um poder público fora de controle que age no vácuo da legalidade, um escriba orgânico dos golpistas faz historinhas de bicho-papão e comunistas que comem criancinhas. Esse filme a gente já assistiu há muitas décadas e não preciso dar spoilers para que vocês saibam como continua.

O senhor quer falar sobre o ódio? Falemos, então. Mas falemos sério, com honestidade intelectual.

Ódio é o que boa parte da imprensa plutocrata desse país promoveu ao longo dos últimos 12 anos e ainda promove, tentando associar todos os males sistêmicos do nosso sistema político (entre eles, a corrupção que gangrena as estruturas do estado, dos partidos, da polícia, da imprensa, das empresas e até do judiciário) a um único partido, fazendo uma cobertura parcial e tendenciosa das notícias que coloca alguns culpados na manchete de capa e outros na lata de lixo da redação. Aliás, essa imprensa não aprendeu, depois de ter apoiado no passado golpes militares e ditaduras!

Ódio é o que promovem os grupelhos fascistas que, nos últimos anos, construíram verdadeiras redes criminosas na internet, dedicadas a espalhar notícias falsas, acusações caluniosas, racismo, machismo, homofobia, xenofobia e todas as formas de preconceito, incitando à violência e promovendo o assassinato de reputação de pessoas honestas por meio da injúria e da difamação — grupelhos aos quais a Folha de S.Paulo deu uma coluna, escrita por um analfabeto político transformado em figura pública pela força da grana dos grupos econômicos que promoveram o golpe.

Ódio é o que provocaram editoriais desse jornal que cobravam mais repressão contra as manifestações cidadãs que não coincidiam com sua linha editorial (porque as que coincidem são tratadas como legítimas expressões da indignação do povo). Editoriais, aliás, que serviram para justificar uma brutalidade policial que atingiu, inclusive, jornalistas desse veículo, trabalhadores que não têm a culpa dos delírios autoritários dos editorialistas.

Ódio é o que se expressa nos ataques contra artistas e políticos em lugares públicos, como livrarias, restaurantes e voos comerciais — lembremos, por exemplo, o que aconteceu com o cantor Chico Buarque, com o ex-senador Eduardo Suplicy e com o ex-ministro Alexandre Padilha —, resultado da campanha raivosa de estigmatização da esquerda, da qual o artigo do senhor Mota é um exemplo paradigmático.