Reinaldo Azevedo: Barroso quer reescrever as Tábuas da Lei
Da coluna do Reinaldão na Folha de S.Paulo.
O mundo conheceu até agora dois grandes legisladores, cada um deles “primus inter pares” desde que não postos em confronto. Houve o Licurgo de Esparta. E há o Licurgo de Ipanema, que também atende por Roberto Barroso, que, li numa entrevista, admira Beethoven e Taiguara. “Gente amarga mergulhada no passado/procurando repartir seu mundo errado”… Numa palestra proferida na segunda passada (16) nas dependências de Harvard, mas não em Harvard, o valente afirmou não ver a necessidade de uma nova Constituinte.
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Eu não apoiaria uma nova Constituinte, como Lula chegou a defender em seu comício pré-prisão, porque a nova Constituição sairia pior do que o soneto. Mas e Barroso? Não sei por que ele gosta de Beethoven, mas sei por que ele quer que se conserve o atual status: vai que o Parlamento feche aos caminhos ao Grande Legislador. Vai que a nova Carta o impeça de rasgar o Código Penal, por exemplo, como ele fez no caso da legalização cartorial do aborto até o terceiro mês.
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O PT, que o guindara ao tribunal, estava então no poder. Parecia mais eterno do que os diamantes e as respectivas embalagens de Creme de Arroz Colombo e Emulsão Scott. O expediente beneficiou, à época, os petistas João Paulo Cunha, José Dirceu e Delúbio Soares. “Lá colhi uma estrela pra te trazer/Bebe o brilho dela até entender”.
O doutor resolveu votar contra os infringentes para Paulo Maluf. E barbarizou: ora, se, num tribunal de 11, são necessárias quatro divergências para que se aceite o recurso, então, nas turmas, com cinco membros, seria preciso haver 1,8 ministro. Arredondou para dois. Como só ocorrera uma divergência no caso de Maluf, então ele negou o dito-cujo. O sujeito que atropela a letra explícita da Carta, do Código de Processo Penal, do Código Penal (e Deus que cuide!) chega ao extremo de transformar arredondamento de ministros (!!!) em categoria jurídica. E contra o interesse do réu.
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O ministro que hoje mantém gente em cana em nome do “sentimento social”, ao justificar, há cinco anos, a sua postura favorável, na prática, aos petistas, respondeu assim a uma ironia do ministro Marco Aurélio: “Não estou almejando ser manchete favorável. (…) Se a decisão for contra a opinião pública, é porque este é o papel de uma corte constitucional”.
O PT virou carne queimada, e o Licurgo de Ipanema descobriu “o sentimento social”.

