Desde que tomou posse, o presidente da República “autoriza”, através de seus discursos, a garimpeiros, madeireiros, grileiros e pecuaristas a explorarem os recursos dessas áreas ao atacar publicamente a atuação de fiscais e, ao mesmo tempo, afirmar que as riquezas que nelas estão deveriam ser exploradas pelo país.
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“Presidente, com sua assinatura será a libertação. Ou seja, nós teremos a partir de agora a autonomia dos povos indígenas e sua liberdade de escolha”, disse. “Será possível minerar, gerar energia, transmitir energia, exploração de petróleo e gás e cultivo das terras indígenas. Ou seja, será a Lei Áurea.”
“Comer um capim”
Em maio de 2008, em meio a um bate-boca em audiência pública, na Câmara, para discutir se a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, deveria ser contínua ou não, Jecinaldo Sateré Maué, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, bateu-boca com Bolsonaro e jogou um copo de água na sua direção. “Ele devia ir comer um capim ali fora para manter as suas origens”, afirmou o então deputado.
Além de criadores de gado e fazendeiros de soja, madeireiros, garimpeiros e grileiros de terra também se sentiram empoderados pelas palavras do presidente Jair Bolsonaro, que prometeu que não vai demarcar mais terras indígenas ao mesmo tempo que está trabalhando para liberar a exploração econômica desses territórios por não-indígenas. O resultado é que a invasão de aldeias tem sido informalmente tolerada, causando violência e assassinatos.
“Escalada de ódio”
“Esses crimes refletem a escalada de ódio e barbárie incitados pelo governo perverso de Jair Bolsonaro, que segue nos atacando diariamente, negando o nosso direito de existir e incitando a doença histórica do racismo do qual o povo brasileiro ainda padece”, disse uma nota da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), durante a cúpula das Nações Unidas sobre o clima, em Madri, em dezembro. Vale destacar que o presidente chegou a culpar os indígenas pelas queimadas na Amazônia.
De acordo com antropólogo Spensy Pimentel, professor da Universidade Federal do Sul da Bahia e especialista na questão indígena no Mato Grosso do Sul, os ataques aos acampamentos na região de Dourados, nos últimos meses, criaram um capítulo à parte na já longa história envolvendo os Guarani e os Kaiowá. Embates que costumavam ser tipicamente rurais, nos últimos 35 anos, agora lembram cada vez mais as cenas de despejos e reintegrações de posse urbanos que volta e meia assolam grupos de sem-teto em megacidades como São Paulo.
“Os seguranças de sítios e fazendas próximas à reserva – chamados de pistoleiros pelos indígenas – teoricamente trabalham com os chamados ‘armamentos não-letais’. Na prática, um jovem de 14 anos morreu, após, segundo o movimento indígena, receber 18 tiros dessas armas, outro pode perder a visão em função dos disparos, e uma das bombas de ‘efeito moral’ abandonadas no local, na semana passada, arrancou os dedos da mão de uma criança”, afirma.