Tribunal militar absolveu Bolsonaro contra a prova, afirma livro
Jair Bolsonaro foi eleito presidente sem que o País conhecesse circunstâncias sobre o mais grave episódio que marcou sua carreira militar e antecedeu sua entrada para a política: o plano de explodir bombas em quartéis do Rio, em protesto contra os baixos soldos em 1987. Por essa acusação, ele foi processado e absolvido pelo Superior Tribunal Militar (STM) por 9 votos a 4. Caso encerrado? Não. É isso o que afirma o livro O cadete e o capitão, do jornalista Luiz Maklouf Carvalho.
Após 32 anos, Maklouf conta que a análise das mais de 700 páginas do processo e dos 31 arquivos com as gravações inéditas da sessão de julgamento revela como a decisão dos ministros do STM contrariou os laudos grafotécnicos existentes da principal prova do caso: as análises de quem seria o autor de um croqui sobre como fazer e onde colocar uma bomba. Para tanto, uma artimanha da defesa teria sido fundamental: dizer que existiam quatro laudos válidos em vez dos dois existentes.
Além disso, o jornalista teve acesso aos áudios da sessão do julgamento no STM. Em suas falas, os ministros desculpam o acusado e vilipendiam a revista Veja – responsável por revelar a história –, transformando-a mais em ré aos olhos deles do que o capitão. Da animosidade dos julgadores não escapou nem o então ministro do Exército, Leônidas Pires Gonçalves, alvo de piadas e críticas na sessão. Fora ele quem havia submetido o caso de Bolsonaro ao STM.
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É necessário recontar a história, ainda que ela seja bastante conhecida. Em 1986, Bolsonaro escreveu um artigo na Veja com o título O salário está baixo. Foi punido pelo Exército com 15 dias de prisão. Em 28 de outubro de 1987, uma reportagem na mesma revista revelava a existência da Operação Beco Sem Saída, o plano de militares da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO) de explodir bombas em unidades militares em protesto contra os baixos salários. Bolsonaro era um dos acusados do plano. Primeiro, os oficiais negaram e receberam o apoio do ministro do Exército.
A revista publicou as provas que tinha – o livro mostra de forma inédita os bastidores que levaram à publicação do caso –, entre elas um croqui explicando como seria fácil pôr uma bomba na adutora do Guandu, do sistema de abastecimento de água do Rio. O documento, dizia a revista, era de autoria de Bolsonaro. O general Leônidas determinou que ele fosse submetido a Conselho de Justificação e afirmou que havia errado ao acusar a revista, pois Bolsonaro é que havia mentido. Por 3 a 0, o conselho julgou o capitão culpado.
Como o veredicto mudou? Maklouf mostra que tudo começou quando Bolsonaro apresentou sua defesa por escrito ao STM. Ele relacionou todos os exames grafotécnicos omitindo várias informações. O primeiro exame, por exemplo, era inconclusivo apenas pela forma como fora feito. Os peritos usaram cópias xérox, o que torna inviável a perícia, que exige o uso dos originais escritos. O outro laudo que Bolsonaro alegava favorecê-lo nem mesmo existia. Na verdade, o primeiro exame inconclusivo por falta de material adequado para análise foi complementado e o resultado mudou.