Zé de Abreu relata no Twitter prisão e tortura na Ditadura: “Éramos mais de 700 estudantes”

O ator José de Abreu foi às redes sociais para relatar sobre a prisão e tortura que sofreu na época da Ditadura.
Nesta quarta-feira (31), completa-se 57 anos do golpe militar de 1964.
Segundo Abreu, “Éramos mais de 700 estudantes, presos no Congresso da UNE em Ibiúna. Nosso crime: fazer o congresso.”
Confira abaixo na íntegra:
Éramos mais de 700 estudantes, presos no Congresso da UNE em Ibiúna. Nosso crime: fazer o congresso. Depois de passarmos quase um mês presos no antigo Presídio Tiradentes, os não paulistas foram mandados para seus estados de origem e nós ficamos. Uma madrugada vieram os milicos.
Nos acordaram violentamente, nos colocaram em fila indiana com as mãos na cabeça e levando pontadas de cassetetes nos rins fomos andando até o pátio. Lá, sob ameaças de morte, fomos colocados num ônibus de transporte de presos. Quando perguntávamos para onde estávamos indo riam e diziam que não tinha importância porque não voltaríamos com vida. E de quebra, uma cacetada em algum lugar bem dolorido.
No ônibus, todo fechado, apenas com alguns furos na lataria para entrar ar, ficamos nos perguntando para onde nos levariam. Foi mais ou menos uma hora de uma apavorante viagem quando o ônibus parou. Saímos e vimos estarmos num pátio de presídio. Não foi difícil descobrir que era o Carandiru. Na fila indiana fomos levados sob porrada para o banho, não sem antes deixarmos todas as roupas e demais pertencer e receber um uniforme de presidiário. Uma camisa e uma calça de brim azul claro, um par de alpargatas roda, uma japona de lã azul marinho. E um pedaço de barbante como cinto. Fomos considerados presidiários sem julgamento, sem processo, sem dada.
Estudantes criminalizados por se reunir. Fiquei mais dois meses preso até que um dia fui – com mais alguns colegas – levado ao temido DOPS, onde havia um famoso centro de tortura liderado pelo sanguinário Delegado Fleury. Lá nos colocaram em fila indiana e um milico olhava pra cara de um e dizia “você fica”. Olhava pra outro e dizia “você vai.” Assim, pelo gosto pessoal dele. Quando chegou a minha vez ele me deu um tapão na cabeça, me chamou de cabeludo veado e disse “você vai”. Foi assim que deixei de ser preso político. Mas o processo foi aberto na Lei de Segurança Nacional. Nunca foi julgado.
Nas fotos (acima), minha foto da ficha policial e minha mãe protestando na frente do DOPS, a Delegacia de Ordem Política e Social, centro de tortura. Saí dois dias antes da decretação do AI-5. Depois disso ninguém mais saiu. Eu tinha 22 anos.
Éramos mais de 700 estudantes, presos no Congresso da UNE em Ibiúna. Nosso crime: fazer o congresso.
Depois de passarmos quase um mês presos no antigo Presídio Tiradentes, os não paulistas foram mandados para seus estados de origem e nós ficamos. Uma madrugada vieram os milicos.— Jose de Abreu (@zehdeabreu) March 31, 2021