“Eu tentei proteger as crianças e a PM desceu a borrachada”. Nosso repórter na ocupação de uma escola estadual

Atualizado em 11 de novembro de 2015 às 20:36
O professor Leandro Oliveira se defende da PM
O professor Leandro Oliveira se defende da PM

 

Uma escola cercada por policiais é uma cena inquietante.

Cerca de 50 estudantes estão ali desde o dia anterior. Do lado de fora, aproximadamente 300 pessoas entre pais, alunos e professores. No meio, um cordão policial compacto.

Tão logo a reportagem do DCM chegou à Escola Estadual Fernão Dias Paes, uma enorme confusão teve início. Um pequeno grupo de estudantes começou a sair da escola, porém a polícia abordou-os e começou o “fichamento” dos adolescentes (só estão podendo deixar as dependências da escola após fornecer os dados pessoais).

O professor José Roberto Guido revoltou-se com a forma truculenta e questionou o comando da polícia. Logo foi imobilizado pelos PMs. Os manifestantes tentaram intervir mas um agrupamento de policiais anvançou. Sobrou cacetada e agressões em todos que tentaram impedir sua detenção.

A visão de professores sendo agredidos é duplamente inquietante, triplamente revoltante.

“A polícia do governador é autoritária, agride e reprime a população. Aqui estamos lidando com jovens, crianças e adolescentes. É um absurdo essa atitude da polícia militar. E se você se manifesta, eles alegam desacato à autoridade. Nós estávamos negociando a saída de alguns alunos e fui agredido”, afirmou o professor Leandro Oliveira. Ele também foi agredido e jogado ao chão.

Rose é mãe de aluno e tomou um golpe de cacetete no braço direito. “Eu fui afastar as crianças pois vi que polícia ia passar por cima, como fazem sempre. Daí começaram a distribuir borrachada. Só quem não sabe negociar nem dialogar faz isso. Querem impor uma reorganização, sem diálogo”, afirmou. Ela não tem filhos naquela unidade porém é contrária à reformulação pois teme a superlotação.

A Fernão Dias Paes terá só o nível médio a partir de 2016, o que significa que 213 alunos do fundamental serão transferidos. Isso faz parte do plano de ‘reorganização’ do governo do Estado de São Paulo que pretende segmentar escolas por ciclos de ensino. Fundamental 1 (do 1º ao 5º ano), Fundamental 2 (do 6º ao 9º ano), e Ensino Médio serão ministrados em locais distintos. Sem aviso prévio nem consulta popular, a decisão da Secretaria de Educação do governo Alckmin desagradou a todos.

 

O portão do Fernão Dias
O portão do Fernão Dias

 

Desde a tarde de ontem, a Fernão Dias Paes está ocupada por alunos contrários ao plano de alteração no ensino estadual. Após uma noite em que a água chegou a ser cortada com o objetivo de desestimular os estudantes, muitos permaneciam nas dependências da escola durante todo o dia de hoje. Não se sabe por quanto tempo. A Procuradoria Geral do Estado informou já ter entrado com um pedido de reintegração de posse da escola. Enquanto isso, o acesso é proibido a todo mundo. Nem pais, nem professores, ninguém entra. A não ser, claro, a polícia.

Mas estudantes estarem na própria escola é uma ocupação?

“Para a polícia sim, pois ela entende que os jovens estão lá sem autorização. Mas é um direito dos alunos. É uma manifestação espontânea e acreditamos que acontecerá em outros lugares porque a Secretaria de Educação não quer dialogar. Ninguém sabe quem vai para onde. Professores, funcionários, pais e alunos estão apreensivos”, disse Audimar de Assis, advogado da Apeoesp. De fato, a Escola Estadual Diadema também está ocupada por estudantes desde às 19h de segunda-feira (dia 9).

Com o passar das horas a tensão vai aumentando pelo aguardo da ordem de reintegração. “O governo alega que tem uma liminar mas até agora não conseguimos localizar esse processo. De qualquer maneira estamos aqui acompanhando”, completou  Audimar.

A aluna Mariana Martins, 16 anos, é do 2º ano médio da Fernão Dias Paes e havia passado a noite na escola. Saiu para atender ao pedido da mãe que estava muito temerosa com a iminente violência policial. “A gente sabe que eles não vão entrar de forma pacífica.”

Há poucos dias, um policial dos Estados Unidos entrou em uma escola e arrancou uma aluna à força da sala de aula. Parece que estamos nos aproximando desse estágio. Para o governador Geraldo Alckmin, educação é um problema de polícia. Para o diálogo ele envia a Tropa de Choque. Aliás, já se tornou um clássico. Para todo e qualquer problema o governador envia sua PM. Até adolescentes como Mariana sabem. Não precisa cair no Enem, é muito fácil.

 

O professor José Roberto Guido dialoga com a polícia
O professor José Roberto Guido dialoga com a polícia