Evangélicos são cúmplices de um projeto de terror político, diz pastor

Atualizado em 22 de novembro de 2024 às 17:56
O ex-presidente Jair Bolsonaro ao lado do pastor Silas Malafaia. Foto: Dhavid Normando/Futura Press

Por Ranieri Costa, teólogo, pastor, jornalista, mestre em Linguagens, Mídia e Arte (pela PUC-Campinas) e doutorando em Comunicação e Cultura (pela Universidade de Sorocaba)

Bolsonaro acabou de ser indiciado pela Polícia Federal, ao lado de outras 36 pessoas, por possível envolvimento em uma tentativa de golpe contra a democracia. Cada novo avanço nas investigações afasta ainda mais qualquer noção plausível de inocência do ex-presidente. A Polícia Federal revelou um plano para assassinar o presidente Lula, o vice Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, discutido na residência do general Braga Netto, então vice de Bolsonaro. A gravidade disso é imensa. Um plano para assassinar não apenas o presidente e seu vice, mas também um dos ministros mais importantes do STF representa uma afronta direta à Constituição e um ataque sem precedentes às instituições mais altas do país.

Não se trata de rumores ou insinuações vazias, mas de um projeto que visa destruir a espinha dorsal da democracia brasileira: o voto popular, a representatividade e o equilíbrio dos poderes. A execução de um plano desse tipo significaria uma catástrofe nacional, mergulhando o Brasil em uma instabilidade institucional sem precedentes e rompendo o pacto social que sustenta a nossa democracia. Imaginemos o caos que seria instaurado com o assassinato simultâneo das três principais autoridades do país. Os impactos iriam muito além da esfera política – afetariam a economia, a segurança pública e, principalmente, a confiança da população em suas instituições.

Ainda assim, com evidências tão perturbadoras surgindo, há líderes evangélicos que insistem em defender Bolsonaro. Desde sua candidatura, o ex-presidente contou com o apoio de pastores de grande e pequena influência, que promoveram sua eleição como uma missão divina, distorcendo a fé para justificar um apoio político. Durante a campanha, inúmeros relatos emergiram de lideranças que abusaram da fé de seus fiéis, coagindo-os a apoiar Bolsonaro sob ameaças de serem considerados “rebeldes” ou “endemoniados”. O ex-presidente foi apresentado como um “escolhido de Deus”. Mas que Deus é esse? Como poderia um candidato cujo discurso destila ódio contra mulheres, negros, pobres e LGBTQIA+ ser associado ao Deus que, na figura de Jesus, não só pregou o amor, mas o encarnou plenamente?

Jair Bolsonaro sendo batizado por Edir Macedo. Foto: reprodução

Não era evidente que alguém que dizia frases como “tinha que ter matado 30 mil” ou “vamos metralhar a petralhada” se posicionava em total oposição aos ensinamentos de Cristo? O retrato do “defensor dos valores cristãos” foi um engano, pois não havia nenhuma semelhança entre Bolsonaro e o exemplo de amor e respeito encarnado por Jesus.

E agora, onde estão os pastores que promoveram essa ilusão? Como conseguem se justificar diante de um homem que demonstra repetidamente ser desprovido de amor – o fundamento maior da fé cristã? Com que respaldo continuaram ao lado de Bolsonaro após sua negligência genocida na pandemia? Com que princípios sustentam seu apoio mesmo frente aos inúmeros escândalos de corrupção e abuso de poder? E como ousam, neste momento, defendê-lo?

Entre eles, Silas Malafaia é talvez o mais obstinado. Em suas declarações, afirma que Bolsonaro é alvo de uma “perseguição política” e acusa o STF e o ministro Alexandre de Moraes de conduzirem uma trama para impedir sua candidatura em 2026. Malafaia insiste que as investigações são injustas, que as provas são manipuladas e que a imprensa é parte de uma conspiração. Contudo, ele evita mencionar a gravidade das acusações, não condena a violência e não sugere qualquer compromisso com a verdade ou com uma investigação rigorosa. Para Malafaia, as evidências robustas não passam de um plano para incriminar o ex-presidente.

O que Malafaia e outros defensores do ex-presidente ignoram é o perigo de uma complacência diante de um plano de assassinato político. Isso não é apenas uma questão de apoio ideológico ou lealdade partidária, mas de cumplicidade moral com atos que flertam com o terrorismo e a desestabilização do país. Nenhum líder cristão deveria se omitir diante de tamanha afronta à vida e à ordem constitucional.

Bolsonaro nunca foi o candidato de Jesus – e Lula também não o é. Não há respaldo nos Evangelhos para qualquer líder que incentive violência ou ironize a morte alheia. No meio evangélico, uma pulseira popular entre jovens e iniciantes na fé traz a sigla “OQJF” (O Que Jesus Faria?), servindo como um lembrete para que suas ações sigam os ensinamentos de Cristo. Malafaia e outros líderes poderiam considerar essa pergunta antes de submeterem o Evangelho a interesses pessoais tão distantes do Reino de Deus. A pulseira é facilmente encontrada por aí.

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