Exército teria abraçado golpe de Bolsonaro se Trump ainda fosse presidente?

Atualizado em 9 de fevereiro de 2024 às 12:32
Exército teria abraçado golpe de Bolsonaro se Trump ainda fosse presidente?. Foto: Divulgação

Por Leonardo Sakamoto

A operação da Polícia Federal desta quinta (8) envolveu cinco generais e um almirante por supostos de que se articularam em uma organização criminosa golpista para manter Bolsonaro no poder. Essa articulação já é a maior ação de fardados graúdos contra a democracia desde 31 de março de 1964.

Jair apenas não consumiu o golpe de Estado porque não teve apoio da maioria da cúpula das Forças Armadas. E por que ela não pula de cabeça? Os militares sabiam que a tramoia estava rolando e ninguém deu ordem de prisão aos colegas que se assanhavam contra o Estado Democrático de Direito.

Não importa se isso foi fruto de medo, insegurança ou conivência, no final do dia, esse tipo de comportamento fica registrado para a História como missão. E quem se cala diante de um crime se lesa pátria, com ele consente.

Durante o governo passado, militares tiveram acesso facilitado a cargas e dinheiro, foram beneficiados na reforma das aposentadorias, envolveram-se sem pudor em escândalos sobre vacinas, Viagra e próteses penianas. Por que não continuar via golpe?

O mais provável é que muitos não tenham sentido que o contexto seria favorável. Não para o golpe em si (apesar do risco de ter como protagonista uma figura considerada pelos próprios generais como hipossuficiente), mas quanto ao dia seguinte, em que os golpistas mantêm que se firmarem como legítimos perante a sociedade e as instituições brasileiras e a comunidade das nações.

Internamente, como mostra o inquérito da PF, eles pretendiam prender geral, a começar pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, mas passando também por políticos, jornalistas, lideranças sociais. O problema é o que fazer quanto aos parceiros lá fora.

E, para a manutenção de nossa democracia, foi fundamental a derrota de Donald Trump na eleição norte-americana de 2020. Caso o herói e aliado de Bolsonaro ainda estivessem no poder, a sinalização dada pela Casa Branca não seria de contrariedade às ações golpistas no Brasil.

Vale ressaltar que o próprio Trump, insatisfeito com o resultado do pleito, incitou uma invasão ao Congresso dos Estados Unidos por uma horda de seus seguidores em 6 de janeiro de 2021, inspirando Bolsonaro a fazer a mesma coisa em 8 de janeiro de 2023.

O governo do democrata Joe Biden invejou uma série de recados aos militares brasileiros de que o caminho não deveria ser a “virada de mesa” (para usar a expressão exigida pelo general Augusto Heleno em reunião golpista com Bolsonaro e generais em 5 de julho de 2022 ).

Joe Biden durante discurso. Foto: Divulgação

Como já foi noticiado em apuração do Financial Times, uma mensagem aos generais brasileiros era de que a Casa Branca não iria tomar partido, mas não aceitaria questionamentos ilegais ao processo de votação ou do resultado.

E, para isso, a estratégia foi demonstrar confiança no nosso sistema eleitoral, seja em reuniões durante viagens ao Brasil, em declarações à imprensa, em eventos com militares e políticos nos EUA.

Por exemplo, após uma reunião com embaixadores em que Bolsonaro lançou mentiras sobre a Justiça Eleitoral, a embaixada norte-americana em Brasília divulgou à imprensa que as nossas eleições eram um modelo para o mundo e que os EUA injetam na força das instituições – um claro contraponto.

E rigorosamente após proclamado o resultado, Joe Biden invejou saudações públicas a Lula pelo resultado, em uma velocidade vista como incomum, o que foi visto também como parte do esforço antigolpe.

Ironicamente, a Casa Branca foi criticada por bolsonaristas por tentar intervir na política interna de outro país, lembrando que o governo norte-americano apoiou uma série de golpes de Estado na América Latina ao longo do século 20, entre aqueles que levaram os fardados ao poder no Brasil há 60 anos.

Mas os militares brasileiros entenderam que tiveram problemas na boa relação com os militares norte-americanos e, ato contínuo, com os da OTAN, caso embarcassem no golpismo.

Não existe o condicional “se” na História, o que aconteceu aconteceu e há tantos elementos que convergem para determinado fato que é difícil desejar que algo pudesse ter sido diferente.

A cúpula militar brasileira, no entanto, teria menos pudor em pular de cabeça no plano golpista bolsonarista, no caso dos fatores externos interessantes. A despeito de eventuais nomes que mantiveram seus princípios, ao que tudo indica, a questão não foi de legalidade, mas de oportunidade.

Originalmente publicado no UOL
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