
Familiares das vítimas da Operação Contenção, a mais letal da história do Brasil, denunciaram nesta quinta-feira (30) que policiais tentaram colher depoimentos enquanto eles reconheciam os corpos no Instituto Médico Legal (IML) do Rio de Janeiro. A operação, deflagrada nas comunidades da Penha e do Alemão, deixou 121 mortos, incluindo quatro policiais.
De acordo com a Defensoria Pública do Estado, agentes de segurança abordavam parentes durante o processo de reconhecimento e faziam perguntas sobre supostas ligações das vítimas com o crime. Mães, pais e companheiras foram questionados sobre o trabalho, amizades e possíveis envolvimentos com facções. O defensor Pedro Carriello, que acompanhou a situação, classificou o episódio como “inadequado e desumano”.
“Ali não é a hora nem o local de tomar depoimentos”, afirmou Carriello. Segundo ele, mesmo que alguns familiares quisessem falar, o momento era de luto e não de investigação. A Defensoria orientou os presentes a não responder e interveio para que os agentes encerrassem a coleta de informações, o que acabou acontecendo após conversa entre as partes.

Além do constrangimento, a Defensoria apontou que o procedimento é ilegal. De acordo com decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e de cortes internacionais, a própria polícia não pode conduzir investigações em casos de violência estatal, justamente por envolver a atuação de seus próprios integrantes. Nessas situações, cabe a órgãos independentes realizar a apuração.
O defensor explicou que, segundo a lei, a polícia só poderia solicitar informações básicas, como o grau de parentesco, endereço e documentos que comprovem a ligação familiar com o morto. Qualquer tentativa de vincular as vítimas ao crime, afirmou, extrapola as atribuições legais e viola direitos humanos fundamentais.
As denúncias reforçam o clima de tensão após a chacina, criticada por organizações de direitos humanos e investigada por órgãos estaduais e federais. A operação, liderada pelo governo Cláudio Castro (PL), é alvo de questionamentos sobre abuso de força e execução sumária. As famílias, além do trauma, agora enfrentam a desumanização no próprio processo de reconhecimento dos corpos.

