Feliciano: depressão é doença, homossexualidade não. Por Nathalí Macedo

Atualizado em 5 de julho de 2018 às 15:20

É sempre assim: quando você tem certeza de que o seu país já te dá motivos suficientes pra sentir vontade de gritar, aparece Feliciano para te provar que as coisas sempre – SEMPRE – podem piorar.

Todo dia uma pataquada diferente pra chamar atenção – SÓ pra chamar atenção, mesmo, mas enquanto a gente considera a existência dele e de outros crentes charlatões pateticamente desprezível, eles institucionalizam violências como machismo (projeto de lei que tentava proibir aborto até em caso de estupro, lembram?) e homofobia (olá, cura gay).

Hoje, por exemplo, ele acordou querendo causar: Fez uma enquete no Facebook perguntando aos seguidores o que causa a depressão, se uma “doença natural” ou “demônios”.

Cara, deixa os demônios em paz. Por que crente tem essa mania irritante de enfiar o diabo em tudo? Aliás, as igrejas falam mais do Capeta do que de Deus – o que indica que aparentemente eles têm um preferido. Se cuida, Deus.

A ignorância protestante é a mais perigosa para o Brasil porque aqui temos uma bancada evangélica – e não uma bancada atéia, ou uma bancada muçulmana ou uma bancada budista. Cada um com seus demônios. Para todo brasileiro progressista, os demônios são os crentes que misturam política e religião.

Quanto ao desserviço feito por Feliciano ao postar essa enquete – ele fez um desserviço ao nascer, na verdade – essas mentiras convenientes só servem a quem está interessado em fazer o que pastores picaretas como o senhor, Feliciano, fazem: explorar a fé e a desgraça alheia. Dizer que é tudo culpa do demônio – inclusive as doenças – é a maneira mais mau caráter, e também a mais fácil, de arrancar o dízimo dos fiéis em troca da “cura”.

Porque se o demônio te adoece, Deus pode te curar – mas cobra 10% do seu salário. Nota: A igreja de Feliciano também aceita cartão de crédito e cheques.

Desculpem, crentes depressivos, mas não é tão simples assim: tratar depressão envolve exercícios físicos, remédios, psicoterapia, apoio de amigos e familiares e hábitos saudáveis. Se fosse só pagar 10% à igreja e sair curada, eu juro que já teria pago – e talvez o Padre Marcelo Rossi nunca tivesse adoecido – ou, uma vez doente, não teria precisado de tratamento médico.

Precisou. O milagre ficou pra outra ocasião.

A depressão mata milhões. Na verdade, é a doença que mais mata no mundo – se o demônio quisesse matar tanta gente assim, faria isso de uma só vez, mandando um dilúvio para a terra, por exemplo.

Argumentos como “depressão é falta de Deus” – “depressão é frescura”, “depressão é falta de sexo”, “vai carpir um lote”, etc etc – só fazem com que essa peste se alastre ainda mais terrivelmente sobre os viventes, e mate cada vez mais pessoas.

Mais quem se importa? Não a igreja. Muito menos Feliciano. Aliás, se tem uma coisa que realmente não preocupa Feliciano são as coisas que matam pessoas.

A homofobia, por exemplo, também mata milhões e no entanto o pastor propôs a “cura gay” pra alimentar a ideia de que orientação sexual é uma doença e colocar lenha na fogueira social que ainda queima gays, lésbicas, bissexuais e transexuais.

A ideia combina perfeitamente com o sistema de crenças patético dos protestantes: depressão – que faz com que as pessoas estagnem na vida ou se matem, mesmo – não é uma doença natural.

Só pode ser o demônio. Homossexualidade – que faz com que as pessoas simplesmente transem com quem quiserem transar – é doença e precisa de cura.

Claro, faz todo o sentido.

Tanto sentido quanto manter um pastor acusado de estupro no Congresso Nacional.