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Felipe Neto clama por frente ampla enquanto ataca candidata do PT. Faz sentido? Por Tiago Barbosa

Felipe Neto. Foto: Divulgação/Twitter

POR TIAGO BARBOSA

A distorção das palavras da candidata a vereadora Tamires Sampaio (PT) por Felipe Neto escancarou prática recorrente entre recém-convertidos às ideias progressista após endossar narrativas de ódio úteis à escalada da extrema-direita ao poder.

É a tentativa de lavar a biografia arrependida e capitalizar bandeiras democráticas através do sequestro da vitimização e do silenciamento de vozes progressistas consolidadas para fazer da falsa equivalência espécie de antipetismo 2.0.

O movimento é calculado para igualar (e isolar) a esquerda mais combativa ao bolsonarismo e viabilizar a ascensão de uma via “moderada” entre dois “extremos” – ou o extrato da direita envergonhada por eleger o miliciano boquirroto.

Os atores dessa “alternativa” operam mais com jogos de cena e omissões e menos com posições e alinhamentos assertivos para serem palatáveis à compreensão média do cenário atual.

Flertam com ideias progressistas, mas se eximem de ataques incisivos à raiz dos problemas e emudecem a oposição capaz de evidenciar e empoderar o contraponto.

A Globo, por exemplo, critica ações do governo na área do meio ambiente e da cidadania e omite a paternidade de conquistas mundialmente reconhecidas e alcançadas em governos petistas – a orfandade relega avanços sociais ao acaso e nega ao público o conhecimento da alternativa.

A emissora critica a devastação ambiental e endeusa o agronegócio, no exercício diário de pura esquizofrenia televisiva.

A mídia hegemônica finge compaixão pelas vítimas da pandemia enquanto avaliza a agenda econômica predatória do serviço público – único escudo social contra a selvageria do mercado.

Listado como figura das mais influentes do mundo pela Time, Felipe Neto entende o peso mobilizador da menção e da publicidade das escolhas, mas transita sob a penumbra de um discurso cujo resultado prático marginaliza a esquerda e, assim, fortalece o bolsonarismo.

O youtuber clama por frente ampla, mas violenta o PT.

Prega união e igualdade dos democratas, mas reforça o preconceito contra o partido.

Salienta a importância de aparar diferenças, mas mantém no silêncio lideranças petistas.

O desejo dele de articulação pela democracia é menor que a disposição de conversar com Lula, o principal nome da oposição e único capaz de fazer frente a Bolsonaro, segundo as pesquisas atuais?

Por que a dificuldade de mobilizar os milhões de seguidores em torno de candidatos nitidamente contrários ao bolsonarismo? Fazer frente aos concorrentes da extrema-direita não vale o esforço?

Felipe Neto já declarou apoio a candidatos-chave na disputa pelas prefeituras brasileiras? É Guilherme Boulos e Jilmar Tatto em São Paulo? Manuela Dávila no Rio Grande do Sul? Benedita da Silva no Rio de Janeiro?

Não há espaço para meio-termo quando, do outro lado, estão representantes do autoritarismo, portadores da destruição democrática.

A resposta desproporcional, agressiva e partidária dada a Tamires Sampaio repete essa violência contra a esquerda cometida todos os dias através da omissão, do silenciamento e da transformação de críticas legítimas em um extremismo fraudulento.

É ainda mais grave porque a candidata petista é mulher, negra, periférica e simboliza a luta de um Brasil cuja opressão dos vulneráveis pelas elites passou a ser abertamente glorificada pelo Estado.

O respeito à condição dela não minimiza, claro, os ataques bolsonaristas a Felipe Neto – mas é ofensivo se comparar à luta natural de quem nasce sob o revés do preconceito de origem, pele e gênero.

O combate ao fascismo à brasileira requer uma postura mais assertiva, clara e firme de quem dispõe de todos os meios para multiplicar o grito contra a destruição do país.

Felipe Neto se agiganta quando coloca a popularidade a favor de causas progressistas, dá visibilidade a pessoas excluídas e condena afrontas bolsonaristas.

Mas encolhe quando padece ao discurso direitista da falsa simetria e menospreza (ou oprime) quem, desde sempre, milita pelo campo civilizatório.

Faria bem – a ele e ao país – se descartasse de vez a venda sob a qual ignorou o país durante tanto tempo.

 

Tiago Barbosa

Jornalista formado pela Universidade Católica de Pernambuco, pós-graduado em História e Jornalismo pela Unicap. Ex-editor do caderno e do site de Cultura do Diario de Pernambuco

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