Feministas estão indignadas com a injusta prisão de Dado Dolabella. Por Nathalí Macedo

Atualizado em 18 de agosto de 2017 às 8:07
Ele

Detesto ser portadora de más notícias, mas às vezes é inevitável: é o fim do feminismo.  Ao menos no Brasil.

É que o nosso maior líder, que nos ensinou tudo o que sabemos sobre o movimento, acaba de ser preso. (Força, manas).

Dado Dolabella, muso inspirador do selo Dado “mais feminista que eu?”, foi preso em uma Ação de Execução de Alimentos por não pagar pensão alimentícia do filho. A dívida já ultrapassa R$190 mil.

Os policiais que efetuaram a prisão do “artista” (?)  aguardaram inacreditáveis quatro horas na porta de seu apartamento até que Dado resolvesse dar o ar da graça. Seria o modelo perfeito de democracia e polícia não-violenta? Na favela, entretanto, não esperam nem quatro minutos: pé na porta de preto e pobre é refresco.

Quando estagiária na Defensoria Pública – o lugar mais propício para assistir de perto (e com uma sensação terrível de impotência) a desgraça do ser humano – entre 2012 e 2014, vi pouquíssimas vezes homens serem presos por dívidas alimentícias. É fácil se livrar da cadeia em um processo como esse: basta pagar a dívida ou justificar (com provas) o fato de não poder fazê-lo.

Na prática, se ficar provado que um pai não contribui para o sustento material do filho porque não tem renda para tal, o juiz está legalmente autorizado – legalmente obrigado, na teoria –  a soltá-lo imediatamente após o pagamento da dívida ou comprovação de impossibilidade de pagamento.

Para a justiça, a lógica é que o homem precisa estar solto para trabalhar e sustentar os filhos. Mas na prática a teoria é outra: quando o homem ganha a liberdade prefere em geral permanecer formalmente desempregado para não correr o risco de ter cobradas judicialmente suas obrigações materiais de pai.

Na época assisti, indignada e mais de uma vez, alvarás de soltura serem expedidos para homens que claramente podiam, informalmente, cumprirem suas obrigações materiais como pais (já que obrigações afetivas sequer podem ser judicialmente cobradas, e nem deveriam), mas não o faziam e permaneciam livres, leves e soltos simplesmente porque estavam formalmente desempregados.

Quanto à mãe, é aquele ditado: vista sua roupa de sapo e dê seus pulos.

Dado, ator global, privilegiado de rostinho bonito, diz que não pagou porque está sem emprego. Segundo o Código Civil brasileiro, se o pai não tem condições de colaborar com o sustento do filho, os avós paternos ficam obrigados a fazê-lo.

A mãe de Dado, entretanto, está ocupada defendendo o mau-caratismo do filho: “Ele não paga porque está sem emprego, a fama atrapalha.”

Tia, não me leve a mal: eu também estou sem emprego – e sim, a fama atrapalha (risos) –  mas não falta comida nem aos meus gatos (imagine aos filhos, se eu os tivesse). A senhora já ouviu falar em freelancer? Bico? Biscate?  Trabalho informal?

Mães vendem cocada – mingau, biscoitos, lanches, o que de melhor souberem fazer – no ponto de ônibus quando estão desempregadas e o pai de seus filhos os abandonou (spoiler: não é raro).

Arranjam uma faxina ali, uma encomenda de crochê ali, uma bolsa família acolá, e vão levando: sua prioridade é não deixar que seus filhos pereçam, porque mães foram ensinadas a lutarem como leoas por suas crias e pais, por sua vez, sabem que serão perdoados se forem maus pais, porque o perdão sempre esteve disponível para eles em todos os níveis.

Embora Dado, de fato, não seja lá tão talentoso como ator – o que torna mais difícil a sua volta à plimplim, sobretudo pelo filme queimadíssimo – alguma coisa ele há de saber fazer: presença VIP em festinhas mixurucas de subcelebridades, biscates como gogo-boy (apesar de estar fora de forma, deve ter quem goste), propaganda de academia de ginástica ximfrim ou, se nada disso for possível, que arranje um emprego digno e tenha a decência de sustentar os próprios filhos.

“Difícil ser solto porque ele diz que não tem dinheiro”, disse o delegado.

Tadinho.

Em sua defesa, Dado disse que o acordo de alimentos foi celebrado quando ele estava contratado em um trabalho que acabou, e que já pediu “revisional” (uma ação judicial em que o valor da pensão alimentícia é reajustado de acordo às possibilidades financeiras do alimentante, no caso, o pai), e que “seus filhos são prioridade em sua vida.”

Aham. A gente acredita. Mesmo porque tô pra ver homem mais feministo que ele. Nunca levantou um dedo pra a Luana Piovanni nem pra mulher nenhuma e sempre defendeu o feminismo – mais do que isso, defendeu o humanismo! – nas redes sociais, um apoio realmente indispensável para nós, feministas.

Fora que estamos falando de um artista brilhante. Tão brilhante que seus tweets estão além de nossa capacidade de compreensão: “Feminista defende fêmeas. Mulherista defende mulheres. chega de hipocrisia!!! #GoVegan” (?)

O fato é que a justiça brasileira é cruel demais com homens brancos e está sendo cruel demais com o pobre Dado, feministo, ótimo pai e desempregado – é a crise, gente.

Onde está o Gilmar Mendes para impedir essa injustiça e soltar o pobrezinho?

Nós, feministas, estamos indignadas com a prisão do nosso líder.

Força, Dado.