Filósofo americano diz que Brasil virou “exemplo mundial” ao enfrentar o fascismo e prender Bolsonaro

Atualizado em 15 de dezembro de 2025 às 7:20
O filósofo americano Jason Stanley. Foto: Reprodução

O filósofo americano Jason Stanley, um dos mais importantes especialistas em fascismo do mundo e autor do livro “Como Funciona o Fascismo”, disse, em entrevista por telefone à Folha de S.Paulo, que o Brasil é líder mundial contra o fascismo e virou exemplo ao prender o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL):

(…) E como o senhor avalia essa escolha agora? O que fez desde que saiu de seu país?

Bem, eu viajei o mundo. Eu acho que a luta contra o fascismo é uma luta global, e o Brasil está no centro dessa luta. O Brasil deu o exemplo e mandou seu líder autoritário, Jair Bolsonaro, para a cadeia por tentar permanecer no poder [após perder as eleições].

Apesar de enormes obstáculos, apesar da sua Suprema Corte ter sido alvo de sanções, o Brasil liderou a luta contra o fascismo. Suas instituições se mantiveram de pé. E o mundo agora quer entender como o Brasil fez isso, como derrotou esse inimigo. Todo mundo ama o Brasil neste momento e se pergunta: como vocês conseguiram?

Se o senhor tivesse que arriscar, como acha que o Brasil conseguiu?

Não sei. Seus ministros [do Supremo Tribunal Federal] foram corajosos, suas instituições foram sólidas, talvez o seu líder autoritário não conseguiu mobilizar a opinião pública de maneira eficaz ou não foi muito competente como líder autoritário. (…)

Havia uma impressão de que as instituições americanas eram sólidas, e que Trump teria dificuldade em erodi-las, mas o que vemos é outra coisa: a Suprema Corte, as universidades e parte da imprensa buscaram acomodar o presidente. Por quê?

Havia mesmo essa impressão? Sabe, eu gosto de conversar com jornalistas brasileiros porque vocês são muito mais realistas sobre os EUA do que os europeus. Os jornalistas europeus dizem: meu Deus, a América, a terra do leite e do mel, a terra da liberdade, o que está acontecendo? Mas os brasileiros me perguntam: quanto tempo a ditadura vai durar por aí? Vocês são latino-americanos, vocês não acreditam que os EUA sejam um paladino da democracia e da liberdade, acreditam?

É difícil acreditar nisso quando o golpe de 1964 foi apoiado pelos EUA.

Exatamente! Nós derrubamos governos e, quando vocês ficam democráticos demais, isso nos incomoda. Então, para responder sua pergunta, os EUA são um país corrupto. Basta olhar para os oligarcas e bilionários e a forma como o dinheiro tem um papel tão gigante na nossa política.

Explicar o escândalo que [tornou Bolsonaro inelegível por abuso de poder econômico e político] é impossível nos EUA: nós não temos leis de financiamento de campanhas eleitorais!

A realidade é que somos um país muito corrupto que, de alguma forma, vendeu a propaganda para o mundo de que não somos. (…)

Aposta bolsonarista em Trump contraria tendência global
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Foto: Reprodução

O senhor escreveu muito sobre fascismo e propaganda. Acredita que o objetivo final de Trump seja inaugurar uma ditadura fascista nos EUA?

Trump está envelhecendo, e deve haver uma disputa por sucessão em breve. O mundo tem sorte de Trump ter 79 anos de idade. Então, mais importante do que perguntar o que Trump quer é perguntar o que a máquina por trás dele quer.

Essa máquina é composta de diferentes grupos: um deles é abertamente supremacista branco, xenofóbico e fascista, sem dúvida. Outro orbita a manosfera. Outro são os oligarcas e bilionários que manipulam essas pessoas, que dizem: me dê o seu dinheiro e em troca destruiremos seus inimigos. Isso acontece nos EUA e no Brasil, aliás.

Mas esses grupos não têm os mesmos objetivos, o que os une é a figura de Trump. A questão é: qual deles vai liderar o movimento Maga? Não sabemos. J. D. Vance é o sucessor óbvio, e ele parece desejar uma ditadura cristã na qual ele tem todo o poder. Ele vai conseguir? Há forças poderosas que se opõem a isso. (…)