Se tem um lugar onde a dissimulação e indignidade fizeram sua morada é na Barão de Limeira, 425, sede da Folha de São Paulo.
Em 2016, durante o golpe, o jornal subverteu regras elementares do jornalismo e publicava chamadas de atos contra Dilma no modo release, com serviço no pé, explicando num quadro ilustrativo onde, quando, horário e motivo das mobilizações.
Chegou ao requinte de explicar as melhores formas das pessoas irem aos protestos, se de metrô ou ônibus.
E ainda ensinou os manifestantes a se vestirem adequadamente – com a amarelinha da seleção, obviamente – para dar volume e engrossar o caldo dos atos infames.
Seus fotógrafos se esmeravam nas imagens de extremistas de direita fazendo selfie com PMs bombados. Uma festa.
O jornal conseguiu encontrar no meio da turba um que chamou de ‘gato’ – o bonitão que caiu na graça da mulherada.
Festejou a chegada de Temer ao poder como se não houvesse amanhã.
Acabou recompensada: o usurpador garantiu o que o jornal queria. Desmontou as regras trabalhistas, entre outras medidas antipopulares.
Normalizou Bolsonaro, fez o que pode para queimar a candidatura de Fernando Haddad, que disputou o segundo turno com o capitão, e seguiu sua sanha de defender a retirada de direitos, numa campanha para que o governo desmontasse de uma vez por todas a Previdência Social e entregasse o filão do negócio aos bancos.
Agora, com Bolsonaro fazendo ‘barba e cabelo’ no Congresso, com Rodrigo Pacheco no Senado, e Arthur Lira na Câmara, o jornal diz que a turma de Eduardo Cunha que retornou ao comando de Legislativo tem “poucas ideias e muito apetite por cargos e verbas”.
Jura? Poucas ideias e muito apetite por cargos e verbas?
Só esqueceu ressaltar seu próprio protagonismo nesta conquista.
Antes de ler o texto que expressa a opinião do jornal sobre mais essa imoralidade, não se esqueça que a Folha é o jornal que um dia classificou os horrores da repressão como ‘Ditabranda’.
Segue o Editorial para você julgar por conta própria!
As vitórias de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e sobretudo de Arthur Lira (PP-AL) para as presidências, respectivamente, do Senado e da Câmara consolidam a ascendência do centrão na política federal. Essa geleia geral de legendas —com poucas ideias e muito apetite por cargos e verbas— selou um pacto de ocasião com um presidente acossado pelo risco de impeachment.
Jair Bolsonaro, por seu turno, consumou o estelionato eleitoral ao despir-se dos últimos fiapos do disfarce de vingador da política que vestiu em 2018. Enganou apenas quem não acompanhou seus sete mandatos como deputado federal especializado na arraia-miúda das transações parlamentares.
Não deixa de ser uma evolução positiva, contudo, o presidente ter deixado de atiçar quarteladas e escaramuças com outros Poderes e passado a fazer política, ainda que no modo rebaixado que lhe restou.
A nota preocupante nessa acomodação de interesses e interessados diz respeito ao equilíbrio institucional. Desaparece das presidências do Congresso, pelo menos enquanto o butim prometido pelo Planalto estiver sendo entregue, a disposição de confrontar investidas autoritárias de Bolsonaro.
O provável enfraquecimento do contrapeso legislativo vai requerer de outras instâncias de controle, em especial do Supremo Tribunal Federal, uma vigilância ainda mais atenta. Aumentam as chances de novos desafios contra a marcha civilizatória nos próximos meses.
O correr do tempo vai responder às dúvidas sobre o tamanho real da força parlamentar do governismo e sobre o que o presidente da República deseja fazer com ela além de se proteger da deposição.
A perspectiva para a renda e o emprego das vultosas parcelas mais pobres da população é de acentuada deterioração. Qualquer remédio que não inclua impor derrotas a grupos privilegiados pelos orçamentos e as regras públicas vai resultar em desconfiança e inflação.
No combate à pandemia, o horizonte não é menos carregado. Meses de incúria e falseamento da realidade por Bolsonaro deixaram o país de joelhos diante do vírus, com precária capacidade de vacinação.
Ter-se associado a chapas vencedoras na Câmara e no Senado não dota o governo de uma súbita competência ou de uma instantânea disposição para enfrentar essas batalhas cruciais. Pelo contrário, o respaldo de maiorias legislativas acaba com desculpas esfarrapadas de que o presidente não pode fazer nada contra as crises.
Talvez ele não queira fazer nada. Talvez ele não saiba como extrair bem-estar para a população brasileira do imenso e ubíquo aparato do Executivo federal. Nesse caso, as vitórias no Congresso vão no máximo adiar a prestação de contas.