Francisco Mairlon é inocentado por crime da 113 Sul e deixa a Papuda após 15 anos

Atualizado em 15 de outubro de 2025 às 9:42
Crime da 113 Sul: após 15 anos preso, homem inocentado deixa a Papuda
Francisco Mairlon Barros Aguiar ao deixar o presídio da Papuda. Foto: Breno Esaki

Inocentado por decisão unânime do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Mairlon Barros Aguiar deixou o presídio da Papuda, em Brasília, na madrugada desta quarta-feira (15), após passar 15 anos preso por um crime que não cometeu.

Condenado aos 22 anos como um dos executores do “Crime da 113 Sul”, ele voltou a ser um homem livre aos 37 e foi direto à igreja agradecer pela liberdade.

Mairlon foi solto à 0h20 e deixou o Complexo Penitenciário da Papuda abraçando a família e acompanhado pelos advogados. Antes de ir para casa, parou em frente à Paróquia Nossa Senhora Imaculada Conceição, no Novo Gama (GO), onde fez uma oração de agradecimento. Depois, ligou para a mãe, que vive no Ceará, conforme informações do Metrópoles.

Em sua primeira declaração após a libertação, em entrevista à TV Globo, ele disse estar tomado pela emoção. “Não estou nem acreditando, o dia mais feliz da minha vida está sendo hoje. Muita gratidão a todas as pessoas que não desistiram de mim, à ONG Innocence que insistiu ainda. Família, amigos, não sei nem o que falar”, afirmou.

“É um momento de êxtase que ninguém pode imaginar. Fora os obstáculos, as adversidades que eu tive que passar aqui dentro, ser bastante resiliente com as coisas que aconteceram.”

Decisão do STJ e anulação da condenação

Na decisão desta terça-feira (14), o STJ determinou a “soltura imediata” de Francisco Mairlon e anulou todo o processo desde o início, classificando o caso como um “erro judiciário gravíssimo”. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal foi notificado para liberar o preso, que não é mais condenado nem réu.

O relator do caso, ministro Sebastião Reis Júnior, afirmou que a condenação foi sustentada apenas por elementos colhidos na fase extrajudicial, sem provas confirmadas em juízo, o que viola o direito à ampla defesa.

“É inadmissível que, em um Estado Democrático de Direito, um acusado seja pronunciado e condenado apenas com base em elementos de informação da fase extrajudicial, dissonantes das provas produzidas em juízo e sob o crivo do contraditório”, disse o ministro.

O ministro Rogerio Schietti destacou a necessidade de mudar o modo como depoimentos são colhidos no país. “Não se fie mais nessa técnica que tem sido reverberada há cerca de 70 anos. Precisamos adotar outro tipo de protocolo que dê confiabilidade a esta prova e dê racionalidade à atividade investigativa.”

Já o ministro Og Fernandes afirmou que os vídeos exibidos no julgamento mostraram depoimentos “sem busca da verdade, mas quase como uma coação moral, em regra aplicada a pessoas de pouca estrutura intelectual.”

A história de um erro judicial

Francisco Mairlon havia sido condenado a 47 anos de prisão, acusado de participar do “Crime da 113 Sul”, que chocou o país em 2009: o assassinato do advogado e ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela, sua esposa, Maria Villela, e a empregada Francisca Nascimento da Silva, mortos a facadas no apartamento onde moravam, em Brasília.

As confissões que o incriminaram foram obtidas sob pressão e jamais confirmadas em tribunal. A defesa, assumida pela ONG Innocence Project, sustentou que Mairlon foi “injustamente acusado por um crime que não cometeu” e que a polícia “não teve o cuidado de confrontar as declarações com provas reais.”

O que disse a defesa de Mairlon

A advogada Dora Cavalcanti afirmou que o caso se baseou apenas em confissões extrajudiciais. “A única coisa invocada como lastro para a denúncia, para a sua pronúncia, o único elemento apresentado aos senhores jurados e que, finalmente, foi também utilizado para que acabasse tendo sido mantida sua condenação, foram confissões extrajudiciais.”

A defesa também afirmou que Mairlon foi “quebrado” pelas múltiplas horas de depoimento e foi dado como “réu confesso” mesmo sem ter admitido ter dado facadas ou ter entrado no apartamento do crime.

“Não foi só ele, muitas pessoas podem ser ‘quebradas’ sob pressão policial. Abatidas, exaustas, desorientadas, muitas vezes privadas do sono e de boa alimentação. Depois de seis horas, a chance de alguém assumir a responsabilidade por um crime que não cometeu sob a falsa promessa de que vai ser liberado para ir para casa aumenta exponencialmente”, defendeu.

Francisco Mairlon deixou a prisão após mais de uma década e meia. “Mairlon está, infelizmente, há 15 anos… tendo sido denunciado, pronunciado e condenado única e somente com base em elementos do inquérito policial”.