O desafio que é entrar na mente de um parricida como Gil Rugai.
Gil Rugai foi condenado a 33 anos e 9 meses de prisão por matar seu pai e a madrasta em 2004. Poderá recorrer em liberdade e pedir a extensão desse regime por um sexto da pena. Como já ficou dois anos e meio na cadeia, deve permanecer na prisão por apenas mais dois.
É absurdo, mas é a Justiça. Ele primeiro matou Alessandra e depois o pai, que tentou se esconder em uma sala. Arrombou a porta e abateu o homem pelas costas. Sua principal motivação, segundo a promotoria, era colocar as mãos no dinheiro de Luís Carlos Rugai, dono de uma produtora (a herança é de 22 milhões de reais). Gil teria sido responsável por um desfalque de 100 mil reais. Alessandra Troitino, mulher de seu pai, o teria proibido de movimentar qualquer quantia depois disso. Rugai, um ex-seminarista, além de problemas em casa, tinha uma arma e usava drogas (os promotores incluíram na acusação o fato de que ele seria também homossexual e teria uma vida dupla — por ciúme, Rugai deu uma garrafada na cara da namorada de um garçom por quem estava interessado).
Uma vez um delegado competente me disse o seguinte sobre os motivos de um crime: “Não acredite nos livros e filmes. É sempre por dinheiro e por vingança”. Agora, o que vai na mente de um filho que mata os pais? Rugai está em péssima companhia: apenas para citar um exemplo recente, temos Suzane Richthofen. Os irmãos Cravinhos, aliás, seus comparsas, ganharam o direito ao regime semi-aberto por bom comportamento. Jorge Bouchabki, da rua Cuba, está solto.
O parricídio é um crime hediondo que assombra todas as culturas. O mito de Édipo é construído sobre isso. Até 1968, o Japão punia com prisão perpétua ou pena capital.
Uma professora da Universidade da Flórida, Kathleen M. Heide, especializada em criminologia, lançou recentemente dois livros sobre o assunto: “Por que Filhos Assassinam Seus Pais” e “Entendendo o Parricídio”. Ela reuniu milhares de casos e tentou traçar um perfil da mente dessas pessoas. Kathleen dividiu os perfis dos assassinos em três: jovens abusados severamente, os doentes mentais e os perigosamente antissociais. Gil Rugai se enquadraria entre estes últimos. Diz ela:
“Eles matam seus pais para alcançar seus objetivos. Pode ser para ter mais liberdade, para continuar namorando uma pessoa que foram proibidos de ver ou para herdar um dinheiro que acabaria vindo de qualquer maneira. Eles têm um padrão de violar as regras quando lhes interessa. Começa na infância. Jovens que desafiam continuamente os adultos, fazem o que querem com seu tempo e não aceitam responsabilidade por seus atos. Se esse padrão de comportamento não for corrigido, eles tendem a praticar atividades que incluem violência contra animais ou pessoas, destruição de propriedades, mentiras compulsivas ou roubo. Esse tipo de parricida é mais perigoso para a sociedade em termos do risco de ferir outros no futuro”.
De acordo com ela, o que leva a esse crime são fatores relacionados ao stress e à dinâmica doméstica. “Um dos problemas de analisar as famílias e separar as funcionais das disfuncionais é que muita coisa é varrida para debaixo do tapete”, afirma. “Leva muito tempo para entender a profundidade do que acontece”.
A única pessoa que sabe o que realmente aconteceu na noite de 28 de março de 2004 é Gil Rugai. Digam o que quiserem seus acusadores, suas razões permanecerão um mistério. E não é confortador saber que, daqui a um par de anos, ele poderá estar no metrô, sentado ao seu lado, com aqueles óculos Ray Ban cavernosos.