
Em seu gabinete, o ministro Gilmar Mendes afirmou que o enfrentamento à crise de segurança no Rio de Janeiro precisa ser conduzido de forma conjunta pelos Três Poderes. O decano do Supremo Tribunal Federal (STF) falou ao Estadão/Broadcast. Gilmar defendeu que não é o momento de buscar culpados pela operação policial considerada a mais letal da história do País — com 121 mortos, incluindo quatro policiais —, mas sim de promover uma ação articulada e estrutural entre governo federal, Congresso e Judiciário.
Para o ministro, a tragédia evidencia falhas profundas na política de segurança pública e exige uma revisão coletiva de responsabilidades, inclusive dentro do próprio Judiciário. Gilmar comparou o episódio a um “filho feio, sem pai”, ressaltando que todos os envolvidos precisam refletir sobre seus papéis e propor soluções concretas. Ele afirmou que o foco agora deve estar em organizar medidas efetivas para o futuro, de modo a impedir que operações dessa magnitude se repitam sem coordenação e resultados duradouros. Veja os principais trechos:
Estadão – Como o senhor vê a situação do Rio de Janeiro?
Min. Gilmar Mendes – Temos dedicado energia a isso, com a ADPF das Favelas. É óbvio que a gente lamenta tudo o que ocorreu, mas também é preciso reconhecer toda a dificuldade que existe no trabalho de segurança pública no Rio. Há problemas estruturais que precisam ser vistos. Está muito claro que o Estado necessita de ajuda, que não basta a ação local. É preciso que haja medidas também no plano federal.
Estadão – Como fazer isso? Se chegou a falar até em GLO (Garantia da Lei e da Ordem)…
Min. Gilmar Mendes: A própria PEC da Segurança Pública já indica a necessidade de maior coordenação. Fomos nós – na minha gestão aqui no Supremo – os primeiros a falar da criação de um sistema de segurança pública, naquela época da Estratégia Nacional de Segurança Pública, que lançamos junto com os outros setores, Legislativo e Executivo. Depois, no governo [de Michel] Temer, o [então ministro da Defesa] Raul Jungmann liderou essa ideia do Susp [Sistema Único de Segurança Pública]. Hoje, acho que se avança nesse sentido e, Oxalá, se consiga meios e modos de enfrentar essa questão. É um tema prioritário.
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Estadão – É preciso uma conversa com os outros Poderes?
Min. Gilmar Mendes – Ah, com certeza. Até porque há muitas questões. Agora mesmo o Congresso acabou de votar um projeto de lei sobre um tratamento mais rigoroso em relação ao crime de organização criminosa. É fundamental que o Congresso atue nessa matéria. Esteve aqui recentemente o governador [de Goiás, Ronaldo] Caiado, que vem obtendo resultados bastante expressivos em relação à segurança pública. Disse, por exemplo, que adotou um isolamento muito duro em relação aos líderes de facções criminosas – exatamente o ponto que não parece estar sendo cumprido no Rio de Janeiro. Então, são questões que envolvem a participação de todos, inclusive do Judiciário. Houve uma ordem de transferência de um chefe de Organização, mas o Judiciário deu uma liminar para que ele não fosse transferido. Então, a responsabilidade é nossa. É fundamental que haja essa revisão para todo mundo.
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Estadão – Ao que tudo indica, o advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, deve ser o escolhido do presidente Lula para a vaga aberta no Supremo com a saída do ministro Barroso. Alguns ministros do STF mostraram predileção pelo ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco…
Min. Gilmar Mendes – A opinião que a gente eventualmente externa sobre a qualificação das pessoas não envolve uma exclusão de outros. E obviamente a escolha é do próprio presidente da República com o referendo, ou não, do Senado. Todos sabem do papel que teve o Pacheco durante todo esse período de enfrentamento que nós tivemos, e daí a alta consideração que lhe votamos. Isso não significa que nós não reconheçamos o papel importante de outros, inclusive do Jorge [Messias]. Ele é um importante interlocutor que nós temos. Nesse momento de crise que a gente tem vivido com os Estados Unidos, ele tem sido um interlocutor extremamente importante, atua muito bem no Supremo, e se for ele o escolhido, será também igualmente bem recebido.
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