O grau de insolência de um desvairado aumenta na razão direta em que ele não é importunado.
Considere Gilmar Mendes.
Pouco depois de gastar cinco horas no STF não para defender alguma ideia mas para massacrar o PT, como se fosse não um juiz mas sim um político provinciano em campanha, ele renovou e reforçou suas agressões.
Provavelmente se animou com a reação covarde do PT.
Na nova rodada, Gilmar disse esperar que não o acusem da morte de Celso Daniel.
Sem muita sutileza, e sem temer consequências, ele acrescentou este caso à lista de crimes petistas.
Mas não.
Não é Celso Daniel que deve ser invocado contra Gilmar Mendes.
São outras pessoas, a começar pelo estuprador serial Roger Abdelmassih.
Abdelmassih estava preso, sob torrenciais provas de abuso sexual de clientes que iam a sua clínica em busca da gravidez sonhada e não realizada, quando Gilmar decidiu soltá-lo, em 2009.
Na época, Gilmar era presidente do STF.
O resto é conhecido. Abdemalssih aproveitou-se da liberdade que Gilmar lhe concedeu para fugir do Brasil.
Só seria capturado no ano passado, no Paraguai, onde vivia uma vida de luxo e, segundo os relatos, sem remorsos.
Quando Gilmar se desculpou às vítimas do médico monstro?
Nunca.
Quando a imprensa, tão ávida em ouvi-lo a respeito de qualquer coisa que possa ser usada contra o PT, fez a ele uma pergunta sobre Abdelmassih?
Nunca.
Gilmar Mendes, e não é de hoje, é um embaraço não apenas para a Justiça, não apenas para o STF – mas para a sociedade.
Juiz não faz política: é o beabá das regras da magistratura e, no entanto, Gilmar só faz política.
Se ele gosta tanto assim de política, por que não se submete aos votos em vez de se aproveitar do palanque que lhe foi dado por FHC?
FHC, sempre sob o silêncio cúmplice da imprensa, aparelhou o STF, a Polícia Federal e a Procuradoria Geral da República com pessoas da sua turma.
FHC foi bolivariano e se faz de morto hoje. Montou uma estrutura de estado destinada a proteger não a sociedade, mas a ele próprio.
Um dos frutos do bolivarianismo de FHC é Gilmar Mendes.
Não é apenas o PT que não sabe como tratar deste caso.
Também são os colegas de Gilmar no STF. Como ele pode, por motivos políticos, segurar o processo de financiamento de campanha por mais de um ano sem que ninguém publicamente o cobrasse?
Ao contrário: Toffoli, quando indagado sobre o interminável prazo que Gilmar se autoconcedeu, encontrou justificativas.
Lewandowsky, na presidência do STF, não tem nada a dizer sobre o comportamento de Gilmar?
Ah, a etiqueta diz que magistrado não deve falar de magistrado. Só que Gilmar já rasgou há muito tempo a etiqueta ao sobrepor a política à Justiça.
Luciana Genro, em 2008, propôs o impachment dele. Ficou falando sozinha.
É tempo de retomar o assunto.
Um país civilizado não pode ter um juiz como Gilmar na sua corte mais alta.
É uma vergonha nacional.
Quem sabe, sem a toga, ele se anime a falar sobre o HC que concedeu a Abdelmassih. Teresa Cordioli, uma das vítimas do maníaco sexual fantasiado de médico, disse tudo: “O maior estupro foi feito pelo ministro Gilmar Mendes, que o soltou”.
Considere a história de Teresa, abusada aos 18 anos.
“Eu tive uma crise de cólica renal, e meus pais me levaram para Campinas, no INPS da época. Eu fui atendida por ele [Roger], que me encaminhou para o hospital e fez a internação. Já no consultório, ele foi me ajudar a deitar, e eu senti que ele estava excitadíssimo. Fiquei assustada, mas achei que fosse algum aparelho de médico. Fui internada e só ele entrava no quarto. Ele não deixava ninguém mais ser internada junto comigo. Só deixou uma mulher cega e disse que ele era esperto. Ele erguia minha roupa, me manipulava. Eu estava de sonda, com soro nos dois braços. Ele sugava meu seio, lambia as partes, queria que eu fizesse sexo oral, esfregava o membro no meu rosto.”
De novo.
Sobre Celso Daniel, Gilmar não será jamais responsabilizado. Mas sobre Abdelmassih sim.