“Golpe é palavra dura”: os golpistas agradecem a Haddad pela graça alcançada. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 11 de agosto de 2016 às 20:11
"Calma, Bernie"
“Calma, Bernie”

 

Primeiro foi Rui Falcão.

Na semana passada, o presidente do PT criticou a ideia de realização de um plebiscito sobre novas eleições.

“Não vejo nenhuma viabilidade para esse tipo de proposta”, disse. Dilma, afinal, estaria abrindo mão de seu próprio mandato. São “artifícios para tentar enganar quem não vai ser enganado”, concluiu.

O fogo amigo, fruto de um momento de suprema mesquinharia e falsa sinceridade, repercutiu da maneira que se esperava: foi largamente utilizado pelos defensores do impeachment.

E então apareceu Fernando Haddad.

Numa entrevista à TV Estadão, o prefeito de São Paulo deu um presente inesquecível aos golpistas. Diante de uma fileira de três jornalistas sentadinhos em suas cadeirinhas, Haddad evocou o que parece ser um pequeno Cristovam dentro dele.

“Golpe é uma palavra um pouco dura, que lembra a ditadura militar. O uso da palavra golpe lembra armas e tanques na rua”, definiu. Faltou fazer aspas com as mãozinhas à la Chalita, seu vice.

O impeachment contém, no máximo, “casuísmo”. Temer cometeu uma impropriedade, como que soltou um peido no jantar. “Não me parece de bom tom o que vem acontecendo: um vice se insurgir contra a cabeça de chapa”, afirmou.

O golpe de misericórdia em Dilma veio ao explicar por que ele não vai chama-la para sua campanha. “Ela está vivendo um momento difícil e me solidarizo. Sobrecarregá-la mais com esse tipo de abordagem não seria justo”, falou, com pena daquela coitada. Tradução: nem a pau.

A reação à conversa nos comentários da matéria do Estado é, obviamente, tenebrosa. De “comunopetista” para baixo. Sem surpresa. Trata-se do jornal que o chamou, em editoriais, de moleque, irresponsável, higienista, fisiologista e por aí vai. Estou citando literalmente. O público é esse.

Ok. Haddad aproveita o microfone. Mas essas tentativas de agradar grupos abertamente hostis com palavras de carinho — sem contar as gordas verbas de publicidade —, além de não render um mísero voto, fazem com que ele perca outros.

Foi assim, para ficar num exemplo, numa “sabatina” da CBN, rádio que se dedica a massacrar a administração municipal, na Livraria Cultura. Eduardo Suplicy foi xingado por ouvintes revoltados on line. Um espetáculo dantesco.

Acreditava-se que o mentor dessa tática suicida era o ex-secretário de Comunicação Nunzio Briguglio Filho, hoje desaparecido. Agora se vê que é coisa do chefe, mesmo.

Enfiado em seu buraco, Cristovam Buarque está rindo. Como revelou o DCM, ele pediu a Dilma que tirasse a palavra golpe da misteriosa carta dela aos brasileiros. Depois foi lá e votou feliz da vida pelo parecer de Anastasia.

Há dias, Bernie Sanders, numa nota em sua página no site do Senado americano, fez um apelo “para que os Estados Unidos tomem uma posição definitiva contra os esforços pela remoção da presidente do Brasil, Dilma Rousseff, de seu cargo”.

“Para muitos brasileiros e observadores, o controvertido processo de impeachment se assemelha a um golpe de estado”, escreveu. Stop it, Bernie. Pega leve, irmão.

Hora dessas cai a ficha de Haddad de que essa tentativa eterna de conciliação com setores que odeiam o que ele representa deu no que o país vive hoje. Arregar dessa maneira, além de indigno, não ganha eleição.

Por enquanto, os golpistas agradecem a ele e a Rui Falcão pela graça alcançada.