Governo Bolsonaro comprou blindados ‘bichados‘ a preços superfaturados de empresa amiga

Atualizado em 2 de março de 2024 às 17:27
Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), os órgãos federais adquiriram veículos blindados que somaram mais de R$ 38,9 milhões aos cofres públicos, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU).

Identificados pelo TCU como um possível indício de superfaturamento, esses veículos adquiridos estão abaixo dos padrões de qualidade. O contrato foi firmado entre a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a Polícia Federal (PF), o Ministério da Defesa e a Polícia Militar do Rio de Janeiro com a empresa Combat Armor Defense.

A informação foi revelada pela revista Veja e confirmada pelo Globo, que teve acesso ao relatório do TCU. Segundo o tribunal, a empresa americana passou a ter representação no Brasil logo após a posse de Bolsonaro em 2019. As atividades foram encerradas no primeiro semestre do ano passado, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu o cargo.

O TCU destacou que o braço americano da Combat Armor seria uma empresa de papel sem qualquer relação com a fabricação de blindados, vencendo os pregões por favorecimento da “condescendência de agentes públicos”.

“Verifica-se que a empresa venceu os referidos pregões com atestados de capacidade técnica potencialmente inidôneos, favorecida pela condescendência de agentes públicos, diante das evidentes fragilidades dos documentos apresentados”, disse o relator do caso na Corte, Jhonatan de Jesus.

Na gestão Bolsonaro, a empresa venceu quatro pregões com a PRF e um com o Ministério da Defesa, totalizando R$ 47,4 milhões. Além disso, em 2020, a Combat Armor ainda venceu um pregão junto à Polícia Militar do Rio de Janeiro, um valor estimado em R$ 20,8 milhões.

As investigações revelaram que a Combat Armor recebeu R$ 38,9 milhões da União durante o governo de Bolsonaro, sendo R$ 33,5 milhões via PRF.

Três acordos foram firmados em dezembro de 2022 — um de R$ 17,7 milhões para a aquisição de veículos blindados operacionais; outro de R$ 9,1 milhões para a “transformação de viaturas destinadas ao enfrentamento ao crime organizado, incluindo blindagem”; e outro, de R$ 6 milhões, para a “implementação de proteção balística parcial para viaturas da PRF”.

Em julho de 2022, a empresa venceu um pregão no valor de R$ 14,1 milhões para adquirir viaturas especiais para a mesma PRF no Distrito Federal. Até 2020, a Combat Armor não havia firmado nenhum contrato com o governo federal e, segundo o TCU, não há evidências de que possuía a capacidade técnica e econômica necessária para cumprir os contratos.

Além do possível “superfaturamento” identificado pelo TCU, a Combat Armor também teria entregado “veículos blindados com qualidade aquém ao especificado no termo de referência”. Com o encerramento de suas atividades no início de 2023, a empresa teria deixado de cumprir o prazo de entrega de viaturas blindadas e manutenções periódicas.

Segundo o TCU, a maior parte dos valores firmados com a Combat Armor foi paga nos últimos três meses de 2022, no final do governo Bolsonaro. Entre 14 de outubro e 30 de dezembro, a PRF desembolsou R$ 12,4 milhões à empresa, incluindo pagamentos de R$ 2,6 milhões em 5 de dezembro e outros R$ 2,4 milhões em 30 de dezembro.

Silvinei Vasques, ex-diretor da PRF durante o governo de Jair Bolsonaro. Foto: Carolina Antunes

O relatório do TCU também levantou a possibilidade de “favorecimento” da empresa por Silvinei Vasques, então diretor-geral da PRF, em contratações feitas pelo órgão. Segundo o relatório, Silvinei considerou os certames “convenientes e oportunos” no auge da pandemia da Covid-19, entre 2020 e 2021, e indica também uma correlação entre sua atuação e os pagamentos à Combat Armor.

“As três unidades gestoras que mais despenderam valores à Combat Armor são a Superintendência do RH, onde o Sr. Vasques atuou como superintendente até abril de 2021, o Departamento de Polícia Rodoviária Federal em Brasília (durante o período em que Silvinei Vasques ocupava o cargo de Diretor Geral), e a Superintendência da PRF em SC, onde ele também já exerceu a função de superintendente”, disse o documento.

Ainda segundo o relatório, foram entregues a essas unidades R$ 16,3 milhões, R$ 6,1 milhões e R$ 4,4 milhões, respectivamente.

Após a saída de Silvinei do governo, em 2023, há registros de uma relação entre a Combat Armor e a empresa F5 Consultoria, que opera no mesmo local da Victory Consultoria, fundada em janeiro de 2023 pelo ex-diretor da PRF.

Silvinei está preso desde agosto de 2023 por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sob acusação de tentar interferir nas eleições de 2022 durante o segundo turno. Na ocasião, a PRF realizou uma série de bloqueios em estradas de regiões onde o então candidato Lula havia recebido mais votos do que Bolsonaro no primeiro turno.

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