Governo Doria contrata museu que usa bandeira de escravocratas: “É um orgulho”

Atualizado em 17 de dezembro de 2020 às 11:23
Grupo exibe a bandeira dos confederados em festa no município de Santa Bárbara D’Oeste – Foto: Reprodução

Originalmente publicado em BRASIL DE FATO

Por Igor Carvalho

A “Virada SP Online”, evento da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do governo de São Paulo, contratou e exibiu, no último dia 5 de dezembro, uma programação em parceria com o Museu da Imigração, conhecido por fazer apologia aos confederados – grupo de defensores da escravidão no sul dos EUA durante a guerra civil americana.

Na entrevista de promoção da parceria entre o governo de João Doria (PSDB) e o Museu da Imigração, que foi ao ar nas redes sociais da Virada SP Online, Rose May Dodson Trochmann, fundadora e curadora do espaço, não esconde sua ligação com o grupo.

“É quase que um Coliseu em Santa Bárbara D’Oeste, ele (museu) é único. Usamos a bandeira dos confederados, é um orgulho ostentar aquela bandeira, porque representa as estrelas dos 13 estados confederados. Nunca tivemos problemas com isso e não há racismo entre nós.”

Na mesma entrevista, a fundadora do museu fala sobre as bonecas que estão expostas no espaço. “Elas são feitas em tamanho médio, na cor das meninas lá da África, na cor amarronzada das aldeias, é um negro que não é um negro, negro, é mais claro. Nós fazemos a boneca e fazemos e o cabelinho também fazemos com um tecido que é todo enroladinho, igual ao cabelo delas.”

No boletim “Dicas de Cultura” do último dia 4 de dezembro, que foi publicado no site da Secretaria de Cultura, o secretário da pasta, Sérgio Sá Leitão, indica a 25ª Festa do Imigrante, organizada pelo Museu da Imigração, em Santa Bárbara D’Oeste (SP), evento que a Secretaria de Cultura colocou na programa da “Virada SP Online.”

“Com apoio da Associação Paulista Amigos da Arte, o evento conta com lives de apresentações artísticas e oficinas gravadas de artesanato, dança e gastronomia. Durante a semana da celebração, a página disponibiliza, ainda, indicações e contatos de comunidades participantes para a aquisição de artesanatos e realização de pedidos de pratos típicos por delivery”, informa Sá Leitão.

As imagens da festa organizada pelo museu foram retiradas do ar ainda no mesmo dia. Em nota, a Amigos da Arte, Organização Social responsável pela curadoria do evento, se manifestou. “Não compactuamos com ideias e ações racistas e lamentamos profundamente a veiculação de um conteúdo com este teor na #ViradaSP de Santa Bárbara do Oeste, realizada entre os dias 5 e 6 de dezembro…Pedimos desculpas e estamos tomando todas as providências para que o fato não se repita. Conforme as diretrizes da política pública de cultura do Estado de São Paulo, a #ViradaSP é um programa plural e democrático, onde não há espaço para racismo, ódio, violência ou intolerância.”

Racistas

No último dia 24 de novembro, o Núcleo Especializado de Defesa da Diversidade e da Igualdade Racial da Defensoria Pública de São Paulo acolheu uma denúncia formulada pela deputada estadual Érica Malunguinho (PSOL). No documento, a parlamentar questiona o espaço por apologia de símbolos e grupos racistas.

“A História oficial do Estado brasileiro ainda reproduz narrativas que excluem as experiências das populações negras e indígenas. Esta manifestação do racismo estrutural cria barreiras para a efetivação plena da democracia”, afirma Malunguinho em seu ofício à Defensoria Pública.

A Festa dos Confederados ocorre anualmente, sempre no mês de abril, em Santa Bárbara D’Oeste e recebe pessoas de todo o país. De acordo com a organização, em 2019 foram 2.500 participantes. Em 2020, por conta da pandemia, o evento foi cancelado.

A Secretaria de Cultura e Economia Criativa por meio de nota disse que “repudia veementemente qualquer manifestação racista. Tão logo a pasta foi informada sobre a exibição do vídeo mencionado, determinou imediatamente que a entidade gestora do programa Virada SP suspendesse a sua exibição. Cabe esclarecer que os projetos culturais da Virada SP são propostos por prefeituras e selecionados por meio de chamadas públicas, cabendo às municipalidades, por meio de comissões independentes, a avaliação dos projetos”.