
Por Vivian Oswald, no RFI
O governo brasileiro articulava uma conversa telefônica entre Lula e Trump para os próximos dias sobre o tarifaço e esperava que as tratativas avançassem. Mas a prisão domiciliar de Bolsonaro, decidida na segunda-feira (4), poderá afetar a retomada do diálogo.
Cabe ao republicano liberar os canais diplomáticos para que os dois países retomem as negociações, interrompidas dias antes de Trump condicionar a suspensão da tarifa de 50% à interferência do poder Executivo no processo judicial contra Bolsonaro. Agora, fontes do governo ouvidas pela RFI alertam para o risco de agravamento da crise e reforçam que é hora de atenção.
No setor produtivo, o clima é de apreensão. Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, José Augusto de Castro, ainda não há luz no fim do túnel.
“Este é o momento de hibernação, porque qualquer faísca é capaz de explodir o cenário como um todo. Todos estão com os nervos à flor da pele”, afirmou.
Castro explica que as empresas que ficaram fora da lista de isenções do aumento tarifário enfrentam dificuldades para encontrar novos mercados ou preços competitivos como os que tinham nos Estados Unidos.
Novo discurso em defesa da soberania
O presidente Lula discursa nesta terça-feira (5) em defesa da soberania e da união nacional durante a nova edição do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, o chamado “Conselhão”. O encontro reúne 155 participantes, entre ministros e representantes de diversos segmentos da sociedade, que aconselham o governo na formulação de políticas públicas.
A reunião acontece na véspera da entrada em vigor da tarifa de 50% sobre parte das exportações brasileiras. O vice-presidente Geraldo Alckmin, responsável pelas negociações com os EUA e pela interlocução com o setor produtivo nacional, deve reforçar essa mesma linha em seu discurso durante o evento.

Consulta à OMC
Na segunda-feira (4), Alckmin presidiu a reunião do Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior, que aprovou uma consulta à Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre o caso das tarifas. A decisão final sobre como e quando acionar a OMC caberá ao presidente Lula.
O governo ainda calcula os impactos do tarifaço anunciado por Trump. Segundo cálculos oficiais, 12,5% das exportações brasileiras têm como destino os Estados Unidos, e o tarifaço deve atingir 35% desse total. A lista com 694 isenções anunciada na semana passada trouxe algum alívio, mas a decisão do ministro Alexandre de Moraes de decretar a prisão de Bolsonaro reacendeu tensões e gerou novo clima de incerteza.
Empresários aguardam plano de apoio do governo
Por ora, os empresários não querem ouvir falar em retaliação, temendo agravar ainda mais o cenário. O que esperam do governo é um plano de contingência, atualmente em fase final de elaboração, para apoiar os setores mais afetados. Entre as medidas em estudo estão linhas de crédito com recursos do BNDES, ações para a manutenção de empregos e mudanças regulatórias para estimular o consumo interno de produtos antes exportados.
O governo federal já decidiu priorizar a compra de produtos da indústria nacional para abastecer o Sistema Único de Saúde (SUS), e avalia fazer o mesmo com alimentos.
Empresários que se reuniram com Alckmin pediram a ampliação da Lei Acredita Exportação para grandes empresas. O texto, em vigor desde segunda-feira, prevê o ressarcimento de 3% do valor exportado para micro e pequenas empresas, por meio de créditos tributários. Como isso tem impacto fiscal, o governo ainda avalia o custo de estender o benefício às empresas de maior porte.
Abrir novos mercados
Alckmin também afirmou que o Executivo está concentrando esforços para abrir novos mercados para os produtos brasileiros. Estão em fase final as negociações políticas para que o Reino Unido e a União Europeia voltem a comprar pescado do Brasil, produto que era amplamente exportado para os Estados Unidos e foi sobretaxado em 50%.
O vice-presidente brasileiro voltou a criticar o percentual imposto por Washington. Ele destacou que oito em cada dez produtos exportados pelos EUA ao Brasil têm imposto zero, enquanto a tarifa média brasileira sobre produtos americanos é de apenas 2,7%.
As novas tarifas americanas entram em vigor às 00h01 desta quarta-feira (6).