Governos tucanos de SP pagam tarifa maior e privilégios para a Linha 4 do Metrô

Atualizado em 31 de agosto de 2020 às 19:55
Considerada um modelo de gestão, a linha 4 amarela tem privilégios e ganhos acima do Metrô estatal

Publicado originalmente na Rede Brasil Atual:

Por Rodrigo Gomes

A linha 4-Amarela (Butantã/Luz) do Metrô de São Paulo, administrada pela concessionária privada ViaQuatro – formada pelas empreiteiras Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e pelo Grupo Soares Penido –, é considerada um modelo de concessão e um caso de sucesso pelos sucessivos governadores do PSDB em São Paulo. No entanto, a realidade é bem diferente. Recebendo um valor maior por passageiro transportado, tendo prioridade no repasse de verbas e com garantia de aumento da tarifa anualmente, a linha 4-Amarela recebe privilégios dos governos tucanos que são negados ao Metrô estatal e público – que fica no prejuízo.

RBA obteve dados, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), que revelam que, enquanto a tarifa paga pelo usuário do Metrô é de R$ 4,40, o governo paulista paga R$ 4,5359 por passageiro para a ViaQuatro. Ao final de cada ano, a diferença de pouco mais de 13 centavos resulta em milhões de reais em recursos públicos para o grupo empresarial privado.

Além disso, o valor pago por passageiro integrado – que veim de outra linha antes de entrar na linha 4-Amarela – é de R$ 2,2680, enquanto a tarifa de integração do Metrô é de R$ 2,20.

Disparidade

O impacto do sistema de aumento anual concedido para a linha 4-Amarela, independentemente do reajuste da tarifa ao usuário resulta num aumento contínuo de receita ano a ano. Aumento que é também muito superior ao crescimento do número de passageiros transportados a cada período. Entre 2014 e 2019, a remuneração anual da ViaQuatro subiu de R$ 350,1 milhões para R$ 545,6 milhões (55,8%). No mesmo período, o número de passageiros transportados naquela linha cresceu apenas 18%, de 194,3 milhões, para 229,5 milhões. Ou seja, a remuneração subiu mais que o triplo em relação à demanda de passageiros.

Outra medida que impacta no aparente “sucesso” da concessão da linha 4-Amarela é o privilégio da ViaQuatro no repasse de valores pelo governo paulista. Toda a arrecadação de tarifas pelo Metrô, pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), pela ViaQuatro e pela ViaMobilidade (concessionária da linha 5-Lilás) é concentrada na chamada Câmara de Compensação. Este sistema é utilizado pelo governo paulista para definir a partilha dos valores. Mas a ViaQuatro é sempre a primeira a receber. Depois vem a ViaMobilidade – que pertence ao mesmo grupo empresarial. Só então vêm o Metrô e a CPTM que, via de regra, são as que arcam com o prejuízo.

A remuneração maior para a concessionária privada prejudica o sistema estatal. Tanto que, entre 2011 e 2015, o governo de Geraldo Alckmin deixou de repassar R$ 1,1 bilhão ao Metrô, o que levou à necessidade de um acordo para o governo paulista recompor as perdas do sistema estatal todos os anos. Apesar disso, em 2019, a arrecadação tarifária total foi de R$ 2,6 bilhões. Mas o Metrô estatal recebeu R$ 1,8 bilhões e ficou com um prejuízo de R$ 599 milhões. E isso, mesmo depois de receber outras receitas, como publicidade e compensação por gratuidades. Em 2018, o déficit foi de R$ 672 milhões.

Tirando do povo

Além dessas benesses, o contrato de concessão da linha 4-Amarela à ViaQuatro ainda garante uma tarifa de contingência – que o governo paulista deve pagar se a demanda de passageiros ficar abaixo do que foi estipulado em contrato. Segundo o acordo, com uma diferença de até 10% na demanda estimada de passageiros – para mais ou para menos – o risco é exclusivo da concessionária. Acima disso, porém, o risco é compartilhado com o governo paulista, que tem de ressarcir a empresa. Ou seja, se a empresa não transportar o número estimado de passageiros, o poder público é que cobre o “prejuízo”.

Para o coordenador geral do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Altino de Melo Prazeres Júnior, a concessão da linha 4-Amarela é um esquema de “Robin Hood ao contrário”. Ou seja, em sentido figurado, tira-se do povo pobre para entregar aos senhores ricos. “O sistema de transporte de passageiros sobre trilhos nunca deu muito dinheiro. Ele não gera tanto lucro quanto o setor de cargas e tem um componente político-social que é a tarifa, que não pode ser tão aumentada. Quando se fez a concessão da linha 4-Amarela, fez-se uma mágica. O Estado subsidia o setor privado. O risco da concessionária é zero. O Estado garante a lucratividade se não tiver passageiro ou se a tarifa não subir. É um absurdo completo”, afirmou.