Os nossos barões são figuras de rodapé comparados aos gigantes ingleses.
Os barões da imprensa brasileiros são opacos quando comparados aos congêneres ingleses e americanos — em inovação, em inventividade, em talento jornalístico e até em extravagâncias.
Considere Lorde Beaverbrooke.
Lorde Beaverbrook foi o maior barão da imprensa da Inglaterra na primeira metade do século 20. Foi a era de ouro dos jornais – que não enfrentavam ainda a concorrência da televisão e do rádio. Nascido no Canadá, ele se mudou para Londres em 1904. Era jovem, mas já fizera fortuna no ramo dos seguros por conta de sua extraordinária capacidade de gerar dinheiro.
Depois da Primeira Guerra Mundial, Beaverbrook começou a construir uma rede de jornais que se mostraria extraordinariamente influente entre os britânicos. Fortuna ele já tinha antes de investir em imprensa. Mas ele queria mais: reputação e poder. Os jornais lhe dariam exatamente isso. Títulos de Beaverbrooks como Evening Standard e Daily Express comandavam a agenda política e econômica inglesa. Em 1950, o Daily Express era o jornal mais vendido do mundo, com uma circulação de quase 4 milhões de exemplares.
Excepcional alpinista político, Beaverbrooks acabaria sendo uma das pessoas mais próximas do primeiro ministro Winston Churchill, de cujo ministério foi integrante durante a Segunda Guerra. Acompanhou Churchill aos Estados Unidos em algumas visitas ao presidente americano Franklin Roosevelt, de quem acabaria também se tornando amigo pessoal. Como quase todo barão da imprensa, Beaverbrook tinha sua lista negra – desafetos que não deveriam receber nenhuma cobertura de seus jornais. Um dos listados era o escritor e cineasta Noel Coward. Numa cena de um filme em que um um destróier inglês afundava, Coward colocou um exemplar do Daily Express flutuando nas águas do mar.
Beaverbrook, nos anos 1930, quase derrubou com seus jornais o líder do Partido Conservador Stephen Baldwin. Baldwin defendia o protecionismo econômico, e Beaverbrook queria para a Inglaterra um regime de livre comércio na plenitude.No fragor do conflito, Baldwin pronunciaria um discurso que se tornaria célebre. Segundo alguns, o texto era de autoria do escritor Rudyard Kipling, primo de Baldwin. “Alguns jornais não são jornais no sentido estrito da palavra, mas motores de divulgação de mutantes idéias, caprichos, gostos, simpatias e antipatias de seus proprietários”, disse Baldwin. “O que esses donos estão buscando não é o poder, mas o poder sem responsabilidade, algo que ao longo da história foi prerrogativa das prostitutas.” Com este discurso épico, Baldwin calou Beaverbrooks, e se manteve na liderança dos conservadores.
Como tantos barões da imprensa, Beaverbrooks era um excêntrico. Ditava por vezes cartas vestido apenas com um chapéu panamá e despachava com subordinados enquanto estava sentado na privada. Sua fé no poder dos jornais era avassaladora. Não havia político capaz de resistir a tiros dos jornais quando bem dados, afirmava. Mas a maioria dos proprietários não se dava conta disso, afirmava ele, e por isso era como se tivessem “revólveres descarregados”.
Jornalistas eram vassalos para ele. O diretor de redação que mais tempo ficou a seu lado certa vez pediu que ele autografasse uma foto em que estavam juntos. Beaverbrooks recusou, e notou que a relação entre ambos já estava suficiente clara na imagem. O jornalista olhava reverencialmente para Beaverbrooks, e este tinha um ar sardônico no rosto.
Beaverbrooks, que se fazia chamar de “Senhor”, era um chefe absolutamente controlador. Num único dia, ele enviou 147 ordens a seus editores. Seus assistentes recebiam ordens de passar instruções aos editores mesmo quando estes estavam no banheiro.
Numa ocasião, um assistente de Beaverbrooks bateu na porta do banheiro que um editor estava usando para avisar que tinha um recado do dono. Veio uma resposta que entraria na história do jornalismo inglês como um dos grandes momentos vividos nas redações: “Diga ao Senhor que estou cagando, e só consigo lidar com uma merda por vez.”
Clap, clap, clap. Aplausos. De pé.