Grandes Personagens da Literatura: Sherlock Holmes é o nono da lista

Atualizado em 9 de janeiro de 2013 às 13:13

Como notou a escritora inglesa P.D. James – criadora de outro detetive notável, o Inspetor Dalgliesh, que além de desvendar crimes escreve versos de boa qualidade –, Holmes não desperdiçava esforço. “Era sua (de Holmes) política não adquirir nenhum conhecimento que não lhe fosse útil ou que não contribuísse com seu trabalho”, escreveu ela num livro sobre os segredos dos romances policiais.

Sherlock Holmes era um boxeador e esgremista experiente, e tinha um bom conhecimento prático do direito e de venenos, entre os quais beladona e ópio. Embora exaustivamente ativo quando envolvido em um caso, passava dias deitado em um sofá sem pronunciar uma só palavra, injetando-se cocaína regularmente num estado de torpor drogado. Era um extravante, essencialmente – e uma companhia potencialmente complicada. Ouçamos, uma vez mais, P.D. James: “Com seu estilo de vida errático e o hábito de disparar o revólver na sala de estar para fazer desenhos de buracos de bala na parede, ele deve ter sido uma companhia incômoda e às vezes para seu amigo e colega de apartamento, o dr. Watson. E a sra Hudson era, sem dúvida, uma senhoria muito tolerante.”

A sra Hudson era a dona do apartamento que Holmes e Watson dividiam, no célebre endereço imaginário de Baker Street, em Londres. Doyle não inventou apenas o detetive policial tão como o conhecemos. Construiu também a figura do companheiro fiel e meio atrapalhado, Watson. O Hastings que está sempre ao lado de Poirot nos romances de Agatha Christie é uma reprodução de Watson. Com Holmes e Watson nasceu o conceito de dupla, que mais tarde nos quadrinhos seria usada intensamente: um caso ilustre é o de Batman e Robin. Watson é um ex-veterano da guerra e um médico renomado. Em o Cão dos Baskerville, Holmes comenta com o amigo, ao ser ajudado por ele: “Você não é uma fonte de luz, mas um ótimo condutor desta.”

Holmes tem uma percepção rápida e certeira. Em o Construtor de Norwood, fala a um homem que acaba de conhecer: “O senhor disse seu nome como se eu devesse reconhecê-lo, mas garanto-lhe que, além dos fatos óbvios de que o senhor é solteiro, advogado, maçom e asmático, nada sei a seu respeito.” Em segundos, naquilo que se tornaria sua característica mais marcante, Holmes descobria uma série de fatos sobre recém-conhecidos por meio de pequenas – às vezes cômicas – pistas.

Conan Doyle era um homem de altas ambições literárias e, embora ganhasse a vida com as histórias de seu Holmes, não as levava a sério. Tinha a intenção de matar seu herói quando terminasse a primeira série, para poder se dedicar ao que considerava literatura prestigiosa. No conto O Problema Final, matou Holmes e seu adversário, Moriarty, atirando-os nas cataratas de Reichenbach. Num caso único na literatura, Conan Doyle foi obrigado a ressuscitar Holmes porque o público não se conformou com sua morte.

Holmes era idolatrado, amado por milhões de pessoas. Mas não pelo homem que o criou. Conan Doyle escreveu a um
amigo: “Tomei tamanha overdose dele que sinto por ele a mesma coisa que tenho por patê de foie gras, que uma vez comi demais: o simples nome me dá uma sensação de enjôo até hoje.” Não é incomum que grandes escritores detestem seus melhores personagens. Tolstoi não suportava a adúltera e fraca Ana Karênina, e isso ficou claro na forma como ele a matou sob as rodas de um trem.

Ao todo, Sherlock Holmes apareceu em quatro romances e cinco séries de contos do escritor. Arthur Conan Doyle podia não gostar dele, mas os leitores ficaram felicíssimos com a reaparição do detetive – e ainda hoje devoram seus contos e romances não com enjôo, mas com renovado apetite. Com o correr do tempo, Sherlock Holmes saiu das páginas dos livros para ser estrela de tevê e de cinema. Sem Sherlock Holmes não haveria os romances policiais tão desprezados por Conan Doyle – o inventor relutante de um gênero que, se não é muito reconhecido pelos críticos, é o predileto da maior parte dos leitores em todo o mundo.