Greve da PM no ES teve execuções sumárias, saques e aliados de Bolsonaro entre os mentores. Por Sacramento

Atualizado em 22 de fevereiro de 2020 às 16:28
Jair Bolsonaro e Carlos Manato. Foto: Reprodução/EsHoje

Para entender as origens e as possíveis consequências do motim de policiais militares no Ceará, é preciso recordar o episódio da greve da PM no Espírito Santo.

Iniciada no dia 04 de fevereiro de 2017, o movimento durou cerca de 20 dias, com saldo de mais de 200 homicídios, saques a lojas e indícios da participação de grupos de extermínio. O prejuízo estimado no comércio foi de R$ 300 milhões.

De acordo com investigações da Polícia Federal realizadas na época, dois aliados do então deputado Jair Bolsonaro participaram da articulação do movimento: Carlos Manato, deputado federal, e Capitão Assumção, que ocupara o mesmo cargo em Brasília e na época do motim estava sem mandato.

Manato foi o candidato de Bolsonaro ao governo do Espírito Santo. Não se elegeu mas ganhou cargo no governo Bolsonaro, de onde foi exonerado no ano passado por Onyx Lorenzoni. Hoje é soldado bolsonarista na formação do partido Aliança pelo Brasil.

Assumção, por sua vez, foi eleito deputado estadual e vive a proferir discurso de ódio na tribuna da Assembleia Legislativa. Ano passado, prometeu o pagamento de 10 mil reais a quem matasse o suspeito do assassinato da jovem Mayara Oliveira Freitas, morta na frente da filha de 4 anos.

O movimento, contudo, se vendeu como espontâneo. Começou na madrugada do sábado, dia 04, no município de Serra, quando um grupo de mulheres, mães e irmãs de militares ficou em frente a unidades da Polícia Militar, impedindo a saída das viaturas.

Com este modus operandi, a manifestação se espalhou pelo estado, com os acessos a destacamentos, batalhões e até ao Quartel do Comando Geral bloqueados pelas manifestantes.

Logo no primeiro dia surgiram as notícias pelo Whatsapp alertando a população a respeito da paralisação da PM. Em seguida vieram as informações de roubos e assassinatos.

Na segunda-feira a Grande Vitória estava deserta, com escolas e comércios fechados. O caos estava instaurado.

A população se encastelou nos condomínios ou nas casas, enquanto acompanhava pelo Whatsapp a barbárie que chegava na forma de textos, áudios, fotos e vídeos. Cenas de saques e execuções à luz do dia lotaram as memórias dos aparelhos celulares.

Com o tempo veio o desabastecimento e as filas nos supermercados.

O governador na época, Paulo Hartung, pediu apoio ao governo federal, que enviou tropas do Exército e da Força Nacional.

A manifestação terminou sem que as reivindicações salariais dos policiais fossem atendidas. Em seguida veio a punição aos envolvidos, com exclusão de militares e extinção de batalhões.

O governador eleito no ano seguinte, Renato Casagrande, anistiou os participantes do motim, pagando inclusive os vencimentos retroativos a períodos em que estiveram afastados da corporação.

Três anos após a maior crise da segurança pública do Espírito Santo, boatos de uma nova paralisação indicam o quanto a anistia foi uma decisão arriscada.

Os rumores circularam pelo Whatsapp pouco antes da manifestação do dia 13 deste mês, em que policiais militares, civis e bombeiros protestaram por melhores salários.

Diferente de protestos de outras categorias profissionais, neste houve alertas de que as pessoas evitassem o centro de Vitória, para não ter problemas com engarrafamentos. As mensagens prestaram um serviço à população, mas provocaram um clima de angústia na sociedade que ainda sente os efeitos da crise de 2017.

Na manhã seguinte, por coincidência, a morte de um suspeito de tráfico de drogas durante uma operação policial em Vitória levou a uma onda de depredação numa das principais avenidas da capital. Lojas foram vandalizadas, veículos atacados com pedras e um ônibus incendiado.

Parecia a história se repetindo, o que não se confirmou. Pelo menos por enquanto.