Greve secreta da Petrobras entra no 18º dia e só agora vira notícia. Por Ricardo Kotscho

Atualizado em 18 de fevereiro de 2020 às 23:07

Publicado no Balaio do Kotscho

Petroleiros em greve

Maior paralisação nas instalações da Petrobras desde 1995, ainda no governo de FHC, a greve dos petroleiros de 2020, até agora solenemente ignorada, só ganhou espaço na mídia no 18º dia, depois de ser decretada ilegal pelo TST do ministro Ives Gandra, aquele célebre carrasco dos trabalhadores que inspirou a “reforma trabalhista” de Michel Temer.

Com 21 mil empregados e 122 unidades da Petrobras paradas, segundo a Federação Única  dos Petroleiros (FUP), até esta terça-feira a greve era secreta.

O que mudou no Brasil nestes últimos 25 anos, desde a última greve, que durou 32 dias?

A grande diferença está no comportamento da mídia, que durante o governo FHC dava notícias sobre a paralisação na Petrobras todos os dias, em todos os telejornais, mantendo a população informada.

Agora, não. Sob Bolsonaro, virou um assunto proibido porque o importante é aprovar as “reformas” de Paulo Guedes, antes que o governo Bolsonaro afunde de uma vez.

A Petrobras não comenta, mas as 11 grandes refinarias do país aderiram ao movimento, o que pode provocar o desabastecimento de combustíveis, em meio a uma ameaça de paralisação dos caminhoneiros.

Em 1984, toda a grande mídia, com exceção da Folha, também ignorou a campanha das Diretas Já, que estava tomando as ruas de todo o país, até que houve um momento que não dava mais para esconder o que estava acontecendo. Saiu até no Jornal Nacional.

O perigo é sempre ter algum repórter solto na rua disposto a contar o que os donos do poder tentam esconder.

Já em 1992, após a redemocratização, nos estertores do governo Collor, que acabou impichado, acontecia outra greve secreta dos petroleiros.

Na página 147 do meu livro de memórias “Do Golpe ao Planalto – Uma vida de Repórter” (Companhia das Letras, 2006), conto o que aconteceu quando pegamos a estrada num carro do Jornal do Brasil, já falecido, para fazer uma reportagem sobre outro assunto no interior de São Paulo.

“Cruzamos com um terminável comboio militar logo no início da via Anhanguera. Pedi ao motorista Ferreirinha que seguisse o comboio. Pouco depois de Campinas, num entroncamento, o comboio parou, e alguns oficiais do Exército desceram dos carros para confabular. Apresentei-me, ele estranharam a presença de um repórter ali, porque a operação não havia sido divulgada., mas me deram a pista: em instantes, ocupariam a Refinaria de Paulínia, a maior do Brasil, cujos operários estavam em greve. Entramos na refinaria junto com os militares, fizemos a reportagem completa sobre a ocupação e, quando o restante da imprensa descobriu o fato, já estávamos terminando o trabalho”.

Logo a notícia seria divulgada no mundo inteiro, com fotos de Zaca Feitosa, do JB, que estava dormindo no carro quando vimos o comboio, deu uma olhada, e desdenhou:

“Larga pra lá, parece foca. Isso é manobra militar de rotina…”

Na tarde dessa terça-feira, tem uma grande manifestação marcada em frente à sede da Petrobras, no Rio, contra as demissões e a privatização da empresa.

Será que vai virar notícia?

Vida que segue.