Anthony Hopkins, o homem, o mito, é também fã, daqueles que escrevem cartas. Ganhador de um Oscar, gênio, ele mandou uma mensagem ao ator Bryan Cranston, que interpretou o fantástico Walter White na fantástica série “Breaking Bad”.
Hopkins diz que o desempenho “foi a melhor atuação que vi desde sempre” e pede que ele transmita os cumprimentos ao resto do elenco. Steven Michael Quezada, que fez o tenente Gomez, postou o texto em seu Facebook.
Ele é o chamado monstro sagrado. Seu cicio como Hannibal Cannibal é antológico. Tem uma memória prodigiosa. Decorou um discurso de sete páginas em “Amistad” em minutos. Laurence Olivier foi seu mentor. Cranston vai imprimir a carta e anexá-la ao seu currículo (embora ele não precise mais disso).
Mas tem algo de errado aí. Hopkins fala que “esse tipo de trabalho/arte é raro e quando isso acontece, como nesse trabalho épico, nos recupera a confiança”.
Hopkins poderia ser a solução, mas é parte do problema do cinema. Se um talento como ele, consagradíssimo, admite que é raro ver algo como “Breaking Bad”, por que não faz nada a respeito? Por que insiste em papeis ridículos como o pai de Thor, Odin? Antes disso, ele esteve em “Red 2, Aposentados e Mais Perigosos”. Seus próximos projetos incluem “Noé”, em que será Matusalém (!!), e “Solace”, um daqueles thrillers cabeça oca.
Há quanto tempo você não o vê num filme decente? “Hitchcock” é o mais passável, apesar daquela mania de interpretação naturalista em que o que chama atenção é o trabalho que o maquiador teve para deixar o ator parecido com o personagem histórico.
Provavelmente, Hopkins não precisa de grana. Estava escrevendo de Malibu e deve ter uma ou outra propriedade em paraísos fiscais. Não necessita mais da mãe de todas as justificativas — “o leite das crianças”.
Tudo bem. Foi a carta sincera de um ator a um colega que esteve num seriado que marcou época. Cada palavra é merecida. Mas, Tony, Tony, que tal recusar uma das bombas que você topa enfiar goela abaixo de comedores de pipoca? Aí, quem sabe, você pode começar a recuperar a “crença” que afirma ter perdido.
A carta:
Caro Senhor Cranston.
Eu queria escrever-lhe este e-mail – então eu estou entrando em contato através de Jeremy Barber. Presumo que somos ambos representados pela UTA. Grande agência.
Acabei de terminar uma maratona de “Breaking Bad” – a partir de um episódio da primeira temporada – com os últimos oito episódios da sexta temporada. [na realidade, são cinco temporadas] (Eu baixei a última temporada na Amazon ) Um total de duas semanas (viciantes) assistindo.
Eu nunca vi nada parecido. Brilhante!
Seu desempenho como Walter White foi a melhor atuação que eu já vi — desde sempre.
Eu sei que há tanta puxação de saco e revoltante besteira neste negócio, e eu perdi a crença em qualquer coisa.
Mas esse trabalho de vocês é espetacular – absolutamente deslumbrante. O que é extraordinário é o poder absoluto de todos em toda a produção. Como foi? Cinco ou seis anos de filmagem? Como os produtores (você sendo um deles), os escritores, diretores, cinematógrafos… cada departamento — conseguiu manter a disciplina e o controle do começo ao fim é (aquela palavra tão usada) incrível.
O que começou como uma comédia de humor negro terminou num labirinto de sangue, destruição e inferno. Foi como uma grande tragédia grega, shakespeareana ou jacobiana [relativo ao período do rei Jaime I].
Se você tiver oportunidade, transmita meus cumprimentos a todos, Anna Gunn, Dean Norris, Aaron Paul, Betsy Brandt, R.J. Mitte, Bob Odenkirk, Jonathan Banks, Steven Michael Quezada — todos, todos deram aulas de mestres da atuação. A lista é interminável.
Obrigado. Esse tipo de trabalho/atuação é raro e quando, às vezes, ele acontece, como nesse trabalho épico, isso nos recupera a confiança.
Você e todo o elenco são os melhores atores que já vi.
Pode parecer rasgação de seda. Mas não é. É quase meia-noite aqui em Malibu e eu me senti obrigado a escrever esse e-mail.
Parabéns e meu mais profundo respeito. Você é realmente um grande, grande ator.
Saudações,
Tony Hopkins