Há um fio de esperança. Por Alexandre Padilha

Atualizado em 4 de junho de 2018 às 21:50

Publicado originalmente na fanpage de Facebook do autor

POR ALEXANDRE PADILHA, ex-ministro

Thássia Alves, mulher de Alexandre Padilha. Foto: Reprodução/Facebook

Vencemos processo judicial por danos morais contra o grupo Abril Comunicações e Felipe Moura Brasil, à época colunista de Veja e hoje jornalista de O Antagonista, por “matéria” de suposto cunho noticioso que afirmava que o parto da minha companheira Thássia Alves e o nascimento de minha filha haviam sido uma “farsa no SUS”.

Não reproduzirei neste espaço mentiras e atribuídas a mim e à minha família, que foram destruídas com a apuração de testemunhas, do prontuário médico e registros do hospital. Faço aqui um esforço de reparar parte dos danos sofridos por nós, mesmo sem ilusões de que seja possível fazê-lo completamente. Afinal, a honra não é mensurável e, tampouco, quando atingida, pode ser restaurada de maneira absoluta.

Ficamos em silêncio por três anos. Acionamos a Justiça apenas no início de 2017, quando encerrei minha contribuição como secretário de Saúde do município de São Paulo, na gestão de Fernando Haddad. Isso porque, embora minha companheira tenha feito grande parte do pré-natal enquanto eu estive afastado de cargos públicos, julgamos que o correto era aguardar que eu estivesse fora da gestão, pois minha filha nasceu em um hospital administrado pelo município.

Quando ela me comunicou sua decisão de fazer o pré-natal e o parto no SUS, eu a apoiei. Thássia estava absolutamente ciente dos desafios, mas também dos cuidados, do nosso sistema público. Para ela, o mais importante era não perder a coerência da nossa trajetória. E também fugir das altas taxas de cirurgias cesárias – as “desnecessárias”, como ela chama -, tão praticadas nos partos dos planos de saúde.

Tive orgulho da decisão da minha esposa, tomada sem falsas pretensões, por uma mulher consciente que conhece o SUS além da miopia imposta por aqueles que desejam o fim da saúde pública.

Isso porque o SUS sofre uma campanha constante de desqualificação na mídia. É a tradicional lógica “se um cachorro morde um homem, não é notícia; se um homem morde um cachorro, é”. Ou seja, enquanto o SUS que salva vidas e promove saúde permanece invisível, as manchetes dedicam-se exclusivamente ao que falha.

Não se trata de atacar as premissas do Jornalismo, que deve sempre pautar-se pelo interesse coletivo, mas sim de questionar a quem serve essa desqualificação constante da ousadia brasileira de perseguir a saúde como direito e não como mercadoria.

Quando essa lógica impera, é preciso coragem para dizer a verdade. E a verdade é que uma mulher, cujo companheiro é médico e foi ministro da Saúde, optou por fazer seu pré-natal e ter seu parto no SUS, sem nenhum tipo de alegoria.

Foi um hospital do SUS que diagnosticou, nessa mulher, uma doença grave, maior causa de morte materna no Brasil. Diante do risco de vida à mãe e ao bebê, o tratamento adequado: a interrupção precoce da gestação por uma cesárea. Prematura, nossa filha teve de permanecer na UTI Neonatal deste hospital por 28 dias. Thássia por 24h na UTI Adulto.

Não foi fácil suportar neste período a disseminação de mentiras, baseadas na referida matéria. Perdemos a conta das vezes que nós e os profissionais que as atenderam tiveram que desmenti-las quando confrontados.

Como médico, posso afirmar: o desfecho poderia ter sido outro. Porém, permito-me dizer, pela primeira vez publicamente, após ter ganho esta causa na Justiça: não exagero ao afirmar que minha companheira e minha filha foram salvas no SUS real e por seus profissionais de verdade.

Durante este período, duas coisas nos indignaram sempre, particularmente por ser médico e Thássia jornalista.

Primeiro um jornalista e um veículo de comunicação fazendo o mal jornalismo, enfim judicialmente condenados. Segundo, profissionais médicos se disporem a criar e reproduzir inverdades sobre o quadro clínico e assistencial de uma mãe e de um bebê. Na nossa família sofremos até a tortura. Aprendemos que é possível esquecer o torturador, mas o crime nunca. Um crime à honra foi cometido em uma situação de extrema fragilidade. Isso jamais será esquecido.

A decisão dessa semana foi um alento em tempos tão sombrios, em que as mentiras e ataques preconceituosos de sempre se disfarçam de jornalismo para tentar confundir a sociedade. Especialmente quando essas mentiras são plantadas por aqueles cujo interesse permanece o mesmo: atacar minha honra em razão da minha permanente defesa ao programa Mais Médicos. Não deixemos nunca de denunciá-los e de lutar para que a verdade vença, pois não é a nós que a mentira interessa.

Aproveito para agradecer aos profissionais do Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha e da UBS onde Thássia começou o pré-natal. Eternamente gratos ao seu compromisso e competência, as restrições que enfrentam não os impediram de cuidar e salvar vidas.

Agradeço também ao trabalho do advogado João Vicente Augusto Neves por ter aceitado o desafio de encarar a mentira e buscar a justiça e a verdade.