Herdeiro da CR Almeida, investigada na Lava Jato, bancou Olavo de Carvalho nos EUA

Atualizado em 8 de junho de 2020 às 12:44
Guilherme Almeida, herdeiro da construtora CR Almeida, e Olavo nos EUA

 

Heloisa de Carvalho Martin Arribas tem 47 anos e é bacharel em Direito. Formou-se pela FAAT (Faculdades Atibaia) e é filha primogênita do filósofo e guru de extrema-direita Olavo de Carvalho.

No dia 16 de setembro de 2017, ela publicou uma carta aberta devastadora sobre seu pai. “Na comunidade muçulmana que você criou em sua casa na Bela Vista, todos te apoiavam e te seguiam incondicionalmente. Na época, eu não sabia que aquilo era uma seita. Quando tudo explodiu, as pessoas te largaram, muitas sumiram e algumas ficaram loucas”, escreve.

O guru de extrema-direita classificou o texto como “fofoquinha”. Segundo ele, o estopim foi o filme “O Jardim das Aflições”, lançado em maio de 2017.

“Ela telefonou ofendidíssima porque meus filhos estavam todos participando do filme e ela não. Em seguida, começou a exigir que eu desse não sei quantas entradas gratuitas para a estreia do filme”, falou à Veja. Ela nega.

Heloísa de Carvalho diz que o grupo de estudos de Olavo é como uma “seita tipo reverendo Sun Myung Moon”, em referência ao controverso líder religioso sul-coreano que promoveu casamentos em massa e criou o jornal The Washington Times, de viés conservador.

Ao DCM, Heloísa contou que o empresário Guilherme Almeida, irmão de um político chamado Marcelo Beltrão Almeida, do PV do Paraná, bancou Olavo nos Estados Unidos.

Marcelo é um dos cincos políticos mais ricos do Brasil, segundo a revista Exame. Os dois são filhos de Cecílio do Rêgo Almeida, fundador da construtora CR Almeida. Morto em 2008, Cecílio deixou um império avaliado em 5 bilhões de reais.

A empreiteira está sendo investigada na Lava Jato num esquema de corrupção em obras de ferrovias federais. Três executivos foram alvo de condução coercitiva em Curitiba e Pinhais no ano passado.

Confira a entrevista.

DCM: Você descreve os seguidores do seu pai, Olavo de Carvalho, como uma seita. Por quê?

Heloísa de Carvalho: Meu pai sempre foi metido com atividades ocultistas. Eu sempre soube disso. A ida dele até a seita chamada Tradição fortaleceu amizades que ele mantém até hoje. Eu tenho uma desconfiança que alguns dos meus irmãos continuam envolvidos com isso.

Meu irmão Luiz ainda dá consultoria astrológica.  No site do instituto isso ainda está lá, embora o Olavo hoje se descreva como um cristão. Meu pai fala que não acredita nisso, que repugna, mas vive fazendo hangout com meu irmão sobre o assunto na internet.

O Olavo de Carvalho diz que não tem contato com seu filho Tales, que nunca soube que ele era muçulmano, mas é mentira. Quem levou esse meu irmão e todos nós para o islã foi meu pai. Agora o Tales de Carvalho aparece publicando uma carta de apoio ao Olavo.

Eu sempre vi muita ligação em atividades paralelas familiares com as do meu pai e isso tem uma ligação com os ataques que venho sofrendo. Meus irmãos falam que ele é um bom pai, mas isso tudo é mentira.

Meu pai está tentando conseguir uma internação psiquiátrica para mim. Ele pediu para um psiquiatra entrar em contato direto com um médico que me indicou, quando estava com problemas de insônia e me separando do meu ex-marido.

DCM: Ele está ameaçando te internar?

HC: A minha vida acalmou depois da separação, tanto que meu ex-marido frequenta a minha casa direto. Ele é uma pessoa que vive diariamente comigo, vem me ajudar na casa, enquanto o meu próprio pai tenta me mostrar como uma pessoa desequilibrada.

Meu pai está tentando me internar, assim como fez com minha mãe no passado. Ele de fato fez isso com ela. Quando a minha mãe começou a ficar revoltada pelo fato de ele ostentar ao ir nos restaurantes caros enquanto a família estava passando necessidade, o Olavo de Carvalho internou ela numa clínica psiquiátrica.

Você percebe que é uma pessoa que, quando surgem os podres da vida dela, faz de tudo para calar sua boca. Ele faz isso porque há de fato muita coisa errada na vida dele.

DCM: Ele é controlador?

HC: Controlador não é bem a palavra, porque ele nunca deu importância aos próprios filhos. Cada um podia fazer o que quisesse que ele não estava nem ai. O que não pode é contrariá-lo.

Contrariou, daí ele se transforma. Por isso ele não quer mais falar comigo no telefone. Ele se transforma tanto que tem medo que eu o grave na ligação.

Meus irmãos sabem disso, minhas ex-madrastas, a minha mãe…

O problema da família é que, além de depender financeiramente do Olavo, dependem também do nome dele para trabalhar dando aulas de religião ou consultas em astrologia. Alguns dos meus irmãos têm o dever de angariar seguidores, como fez meu pai.

No fundo, você olha para isso e percebe que de religião de verdade tem muito pouco. Meu pai se declara cristão, por exemplo, e xinga o Papa. Nunca vi um cristão fazer isso. É heresia demais pra mim.

DCM: Olavo foi casado quantas vezes?

HC: Ele se casou com minha mãe, Eugênia, em 1968. Em 2005, Olavo de Carvalho pediu pra ela assinar o divórcio e casar com a Roxane e ir aos Estados Unidos. Mas Olavo e Roxane estavam unidos desde 84. Naquela época, ele era muçulmano e se relacionou com pelo menos três pessoas.

Quero deixar claro que não tenho nada contra muçulmanos. Mas eu comento pra mostrar como meu pai sempre esteve envolvido com diferentes religiões.

Meu pai já foi e deixou de ser cristão pelo menos umas três vezes na vida. Antes da Roxane, e depois da minha mãe, ele se relacionou e se casou com a Silvana em 1981.

DCM: Você menciona publicamente que um seguidor de Olavo precisou de tratamento psicológico. O que aconteceu?

HC: A Meri Harakawa, que era a esposa número dois quando Olavo era muçulmano, abaixo da Roxane, teve problemas psicológicos sendo seguidora dele. Teve duas internações psiquiátricas, cortou relação com meu pai e hoje retomou a amizade. Foi inclusive ao enterro de minha avó.

DCM: Seu pai sempre foi envolvido com religião e filosofia. Como ele entrou na política?

HC: Ele começou a falar de política realmente há pouco tempo. Muito antigamente o Olavo de Carvalho nem ligava pra isso. Tocava uma vez ou outra no assunto, mas não era fervoroso.

A entrada do Olavo na política, dentro da imprensa, foi uma espécie de estratégia antes de ele se mudar para os Estados Unidos e se tornar famoso.  Dentro da filosofia ele só tinha meia dúzia de gatos pingados que gostavam dele, mas não era uma coisa no nível que virou hoje.

Hoje ele tem quase 400 mil seguidores fanáticos, pessoas altamente cegas. Olavo de Carvalho fala de educação, de moral, mas teve a vida que eu estou falando aqui. E ainda aponta dedo pros erros dos outros.

Se ele quer ser perdoado, por que não perdoa os outros?

DCM: Ele realmente apontou uma arma para os filhos, como você fala na carta aberta?

HC: Essa história da arma foi o seguinte: logo depois que ele foi embora de São Paulo, o Olavo estava muito desequilibrado emocionalmente. Teve um episódio, que eles provavelmente vão negar, envolvendo a Roxane, atual esposa dele. Ela pediu ajuda desesperadamente para minha mãe porque ele apontou a arma na cabeça dos filhos.

Olavo de Carvalho sempre teve armas, sempre gostou de andar armado, sempre foi uma pessoa paranoica, com mania de perseguição. Ele sempre disse que estava sendo ameaçado, mas eu nunca vi uma carta ou uma agressão. Foi isso que ele alegou para não vir ao Brasil visitar minha avó antes da morte dela. Meu pai disse que se sentia ameaçado aqui.

DCM: E o caso do abuso que você sofreu?

HC: Não chegou a ser um estupro com conjunção carnal, mas era só bolinação. Nessa época eu morava em São Paulo [hoje ela está em Atibaia] e o casamento com a minha mãe sempre foi de idas e voltas. Contei para ele e para minha mãe o que aconteceu na época. Olavo de Carvalho não disse nada para mim.

Nem tomou qualquer atitude. Olavo sempre ignorou e, inclusive, num dos telefonemas recentes, ele disse que “se você sofreu abuso, a culpa é sua”. Disse que só tinha nove anos na época e hoje ele me acusa de ser traidora.

Meu pai também me acusa de ter ido morar com pessoas com compactuam com abusos, mas eu me mudei porque eu não tinha quem cuidasse de mim.

DCM: A vida dele de fato era incompatível com a do restante da família?

HC: Sim, no final das aulas dele era comum jantares em restaurantes de alta gastronomia e caros. Numa dessas ocasiões eu experimentei lagosta pela primeira vez. Nos Estados Unidos ele mantém esses hábitos com os alunos, bancando tudo pra todo mundo e parecendo o bonzinho.

Tudo isso desde que você pague o curso. Qualquer um que o contradisser sofre. No Facebook dele, diariamente, tem gente falando que contradisse e ele bloqueou, isso quando ele não ataca publicamente.

Recentemente ele fez isso com uma mulher que fez um documentário sobre os muçulmanos num nível de baixaria que eu fiquei enojada, colocando a família dela no meio. Eu a defendi contra essa apologia ao ódio. Tudo isso me leva a crer que o que Olavo de Carvalho construiu é uma seita. A minha vida é mais comum.

Olavo ataca a tudo e a todos, sem o menor pudor. O que eles fizeram na época da morte da Dona Marisa Letícia, ex-esposa do Lula, foi absurdo. Tiraram sarro daquela situação. Olha, não importa quem ela era, porque era uma mãe, tinha família e merecia respeito como pessoa. Nada disso é cristão, me parece. Eu mesma fui condenada várias vezes ao inferno por essa gente.

DCM: Ele recebe algum tipo de ajuda financeira?

Ele também depende de outras pessoas. Um aluno dele de Curitiba continuou financiando meu pai na sua viagem aos Estados Unidos e seus filhos no Brasil. Ele foi fiador de imóveis e manteve uma relação estreita, com ajuda em dinheiro. O David, meu irmão, quase foi aos EUA com ajuda deste financiador e documentos forjados, mas teve o visto negado por nem ter o primeiro grau completo.

DCM: Quem é esse financiador de Curitiba?

HC: É uma pessoa que eu cheguei a ver umas três ou quatro vezes na vida. Ele comprou a casa do meu pai, Olavo de Carvalho, na Virgínia. Olavo pagava mensalmente essa pessoa para começar a morar lá.

O nome dele é Guilherme Almeida. Foi ele que financiou a ida do meu pai aos EUA. Ele ultimamente se afastou do Olavo de Carvalho porque ocorreu um desentendimento, nas palavras do meu próprio pai, que ele provavelmente vai negar. O Guilherme é uma pessoa boa.

Ele é irmão de Marcelo Beltrão Almeida, engenheiro e político do PV do Paraná. É próximo do senador Roberto Requião.

Quando meu pai foi para os Estados Unidos, a reforma da casa do meu pai saiu por R$ 15 mil porque ela estava destruída. O Guilherme Almeida também emprestou o carro dele com motorista para transportar os meus irmãos.

DCM: A mídia construiu quem ele é hoje?

HC: Sim, foi um trampolim para ele e isso é citado no currículo dele. Ele exibe isso e depois se faz de coitadinho da mídia, né? O que o Olavo escrevia sobre as pessoas era uma maneira muito agressiva e isso não interessa para a imprensa sempre.

Só que a mídia não o ajudou a ir embora do Brasil. A ajuda veio somente do Guilherme.

DCM: O Olavo tem ajuda de instituições americanas nos EUA?

HC: Olavo de Carvalho tem um visto especial, focado em cultura, e na época das eleições presidenciais americanas ele deu apoio ao Donald Trump, mesmo nem votando lá.

Meu ex-marido é espanhol e vota pelas eleições do país dele, mas não fica fazendo campanha. Tem interesse por trás das atitudes do Olavo, declarando apoio a um presidenciável de outro país.

Ele declarar voto no Bolsonaro eu entendo, porque ele vai votar no consulado. Fora isso, não, ainda mais uma pessoa polêmico como Trump, que é racista e preconceituoso. Ele tem muito perfil do meu pai e é igualzinho.

Hoje ele é preconceituoso e radical. Lembro de criança vários amigos do Olavo de Carvalho gays ou bissexuais. E a quantidade de namoradas que ele teve eu perdi a conta. É tudo muito estranho.

Olavo e a filha Heloísa

DCM: Qual foi o problema com o filme “Jardim das Aflições” que você teve com seu pai e com diretor Josias Teófilo?

HC: Houve uma divergência com o Daniel Aragão, que é o diretor fotográfico do filme. Ele tem uma bagagem profissional muito maior do que a do Josias. Na hora H deram um pé na bunda, tipo “você não serve mais, não queremos mais você”, deixaram o Daniel fora de tudo e começaram a ir até a mídia. Deram entrevista ao Danilo Gentili sem citar o nome dele.

Resumindo, o Daniel Aragão virou um zero à esquerda e ele ficou chateado com isso. Porque ele trabalhou e arrumou desavenças na cidade dele por ir trabalhar no filme do Olavo. Ficou mal falado por isso. Ele abraçou uma causa e, quando não precisaram mais dele, sacanearam.

Eu conversei com ele e falei que iria ligar para o meu pai e interceder por ele. Liguei e expliquei a situação do Daniel e falei que entraria com uma ação judicial em último caso, pois sou advogada. “Se o Daniel quiser, a gente entra com ação”.

Meu pai ficou possesso, transtornado. Ele, a Roxane e a Leilah só me xingavam pelo telefone aos gritos. Eu não conseguia falar. Xingavam o Daniel também. Olavo de Carvalho disse que eu iria prejudicá-lo e me bloqueou no Facebook.

Ninguém mais próximo do Olavo respondeu mensagem minha no WhatsApp. Foi assim que eu resolvi declarar meu apoio público ao Daniel Aragão.

Abri meus olhos a respeito de todas as atividades do Olavo de Carvalho e das pessoas próximas dele ao longo desses anos. Sempre soube do que acontecia, nunca fui participante ativa e acabava ficando quieta ao longo de toda a minha vida com eles.

Olavo diz que pouco conviveu comigo. Em número de anos isso pode até ser verdade, porque hoje tenho 47 anos. Deixei de viver na casa do meu pai por volta dos 18 anos, mas eu sempre mantive contato.

Ele nunca pagou pensão dos filhos para minha mãe.

DCM: O Olavo de Carvalho já foi internado alguma vez?

HC: Ele teve uma internação na época que eu era criança e eu fui visitá-lo. Olavo teve um acesso de loucura dentro da redação do Jornal da Tarde. Como era pequena, eu não prestei tanta atenção no que estava acontecendo naquela época.

DCM: Você tem alguma recordação boa do seu pai, sabendo do que sabe?

HC: Tenho, claro que tenho. Tenho das brincadeiras dele, que eram poucas. Meu pai convivia muito pouco conosco. Normalmente Olavo de Carvalho dormia o dia todo e passava a madrugada acordado, o que é difícil para crianças.

Não me lembro de nenhum passeio com ele. No acompanhamento escolar, ele foi uma vez na reunião de pais da minha escola, quando tinha por volta de 12 anos. Estudava numa escola de freiras, a madre chamou e Olavo de Carvalho foi.

Se você perguntar dos meus amigos de infância, ele não sabe citar nenhum. Mas eu sei o nome de vários amigos do Olavo de Carvalho.

DCM: Algo que eu não perguntei que você gostaria de falar?

HC: Meu pai pintou meus irmãos como pessoas idôneas por eles o defenderem. Eles apoiam por medo, por coação do meu pai. Não é a primeira vez que Olavo de Carvalho faz isso.
Muitos me apoiam, mas pedem para que eu não os mencione. Respeito o posicionamento deles. Meu tio deu todo apoio à minha avó na morte, sem ajuda alguma do Olavo. Ele está sofrendo e está muito abalado com isso.

Nunca pedi para ninguém ficar do meu lado, mas simplesmente não se meter. Há pessoas apagando contas de Facebook de quem me apoiou.

Olavo de Carvalho está tentando me internar, construindo uma imagem de que sou maluca. Já avisei meu ex-marido, meu filho e outras pessoas. Se eu sumir do dia pra noite, pode ter certeza que me internaram de forma forçada.