Igreja Anglicana critica assédio espiritual e diz que “candidatos não são Messias”

Atualizado em 13 de outubro de 2022 às 19:37
Catedral Anglicana da Santíssima Trindade de São Paulo

A Catedral Anglicana da Santíssima Trindade, igreja autônoma da Comunhão Anglicana, emitiu uma nota na qual critica lideranças religiosas de outros credos pelo “assédio religioso” que vêm promovendo ao longo da campanha eleitoral de 2022  e ainda diz que há igrejas “pregando fundamentalismo político”. Veja abaixo a manifestação da instituição:

A Catedral Anglicana da Santíssima Trindade tem visto com grande preocupação e perplexidade a postura e a atitude que alguns líderes e denominações cristãos têm adotado com relação às Eleições de 2022. Em nosso dever profético perante Deus e perante a sociedade paulista e brasileira às quais servimos, nos posicionamos em defesa da democracia e da laicidade do Estado, reiterando nosso profundo respeito e zelo pela liberdade religiosa, de culto e de livre associação asseguradas a todas as pessoas pelas leis e pela Constituição.

Como Jesus no deserto, a Igreja é sempre tentada pelo desejo de dominar os “reinos do mundo” (Mt 4.8-9). Por isso é tempo de redobrar a vigilância e de usar a sabedoria e o discernimento (1Co 12.8-10), dons que o Espírito concede ao Corpo de Cristo. Mas, alguns políticos e lideranças religiosas, sedentos de poder, têm causado feridas profundas no Corpo de Cristo. A História nos ensina: sempre que o Estado ou governo se confundiu com a religião, o resultado foi destrutivo. Por isso cabe lembrar que igrejas não são legendas partidárias e candidatos não são Messias.

No cenário brasileiro, há igrejas pregando fundamentalismos políticos, fazendo declarações antidemocráticas e sufocando a liberdade de consciência das pessoas de fé, constrangendo- as a sacralizar ideologias extremistas e a demonizar o que for divergente.

Marina Silva em evento na Catedral Anglicana em Setembro. Facebook

Esse assédio moral e espiritual aumenta a tensão própria das eleições, e provoca divisões nas comunidades e nas famílias, e traumas irreparáveis em indivíduos. Em preparação para o 2º Turno, algumas instituições religiosas já reforçaram a promessa de punir membros e líderes que manifestarem preferência contrária às indicações oficiais. Tais atitudes, a nosso ver, violam diretamente as liberdades religiosa, política e de expressão.

Além de praticar o “voto de cabresto”, os mesmos grupos politico-religiosos disseminam medos, preconceitos e fake news que DISTORCEM OS FATOS E A VERDADE:

Desprezam as famílias brasileiras por não reconhecerem as diversidades e reafirmarem modelos anacrônicos de família. Ou seja, lares adotivos, mães ou pais solo, casais sem filhos, uniões LGBTQIA+, órfãs, solteiros, viúvas, pessoas em segundo ou terceiro casamento e até as famílias da Bíblia – inclusive a de Jesus – não seriam consideradas famílias de verdade;

Combatem a igualdade de direitos promovendo retrocessos em prol da manutenção das desigualdades e dos privilégios de poucos. Ameaçam conquistas trabalhistas, sociais, políticas, econômicas, bem como na saúde e na educação da sociedade brasileira;

Pregam intolerância e discriminação, contra religião, gênero, raça, cultura, sexualidade não normativas, isto é, incitam direta ou indiretamente várias formas de violência;

Rotulam as iniciativas de inclusão e respeito às diversidades como se fossem uma “ideologia de gênero”, tentando estigmatizar e silenciar o tema. Assim, atingem principalmente minorias, crianças e mulheres – que são maioria nas igrejas e, antes de tudo, imagem de Deus;

Fazem parecer que direitos reprodutivos são mera apologia à interrupção da gravidez. Não mencionam políticas públicas como: saúde integral e sexual, métodos contraceptivos e alternativos ao aborto, abandono parental, nem a autonomia da mulher – por séculos tratada como subalterna e à serviço do patriarcado;

Pe. Julio Lancelotti em diálogo com anglicanos. Facebook

Censuram professoras e professores, numa espécie de caça a inimigos imaginários, fazendo patrulha ideológica. Reivindicam uma “escola sem partido”, mas tomam eles mesmos partido ao relativizar a ditadura militar, o racismo, os direitos das mulheres, a justiça social, a crise climática, a importância da vacinação e da ciência;

Silenciam as discussões de gênero e a educação sexual, impedindo a conscientização pelo respeito, equidade, a prevenção de abusos, inclusive os que acontecem dentro de casa e das igrejas;

Negligenciam a Criação: florestas, águas, animais, bem como os direitos de povos indígenas, fazendo parecer normal – e sinal de progresso – as queimadas, desmatamentos, exploração dos recursos naturais e a flexibilização das leis de proteção ambiental;

Transformam o tema da segurança pública em guerra e terror para, assim, poderem facilitar o acesso às armas de fogo, criminalizar pessoas pretas, pobres e periféricas e justificar a violência policial;

Falam de drogas como crime ou problema moral, ignorando a dimensão da saúde, das vulnerabilidades, da falta de legislação adequada e até das possibilidades do uso medicinal.

A IGREJA DEVE SER UM LUGAR SEGURO, de cura e que não faz acepção de pessoas (At 10.34; Tg 2.9), onde se possa experimentar o amor de Deus por toda a gente: crianças, mulheres, jovens, pessoas dosas ou vulneráveis, socorrendo as vítimas e responsabilizando os agressores. Deve ser sinônimo de esperança, comunhão e paz, e não de opressão.

Por isso, estendemos nossa SOLIDARIEDADE E ORAÇÕES às pessoas que, nesses tempos sombrios, foram colocadas à margem de suas comunidades de fé, e se encontram carentes de acolhimento pastoral e de comunhão fraterna.

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