“Indisfarçável desfaçatez”, “desvio de caráter”: políticos refutam fala de Bolsonaro na ONU

Atualizado em 22 de setembro de 2020 às 17:21

 

Bolsonaro durante o discurso, transmitido remotamente. Foto: Marcos Corrêa/PR

A autodefesa, as inverdades, os diversos ataques contidos no discurso de Jair Bolsonaro (sem partido) na abertura da 75ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) nesta terça-feira (22) suscitaram mais uma nova avalanche de críticas ao presidente brasileiro.

Parlamentares, políticos e autoridades refutaram a tentativa do mandatário de atenuar a crise econômica, sanitária e ambiental vivida pelo Brasil.

“Bolsonaro na Assembleia da ONU exibe para o mundo o seu despreparo, intolerância com os defensores do meio ambiente, guerra permanente a prefeitos e governadores, enfim, sem retoques, a tragédia brasileira que ele representa. Mente ao mundo com indisfarçável desfaçatez”, disse o vice-líder do PCdoB, deputado federal Márcio Jerry (MA).

Líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) questionou a conversão feita pelo presidente para chegar aos US$ 1 mil supostamente pagos aos mais prejudicados durante a pandemia. “Alguém sabe me dizer qual o brasileiro que recebeu esse auxílio emergencial de US$ 1.000,00 que Bolsonaro falou na ONU?? PS: 1.000 dólares são R$ 5.430,00”, esclareceu o senador.

A presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) alertou para a possível razão das incongruências no discurso do mandatário. “Devastação do Pantanal/Amazônia, fome, desemprego, economia em queda livre, mas o Brasil de Bolsonaro é um universo paralelo. Enumera mentiras na ONU como auxílio de U$1000, quem faz queimadas são os indígenas e caboclos. Não é só um mentiroso patológico, é desvio de caráter mesmo”, sentenciou.

Pré-candidato do PCdoB à Prefeitura de São Paulo, ex-ministro dos Esportes e deputado federal Orlando Silva também viu sinais de uma patologia na fala de Bolsonaro. “Bolsonaro é um mitômano. O discurso dele na ONU é puro chorume, não tem ali um mínimo de compromisso com a verdade factual. De tanto mentir, Bolsonaro passou a viver na própria Fake News.”

Líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE) lamentou o novo vexame brasileiro. Mais uma vez Bolsonaro coloca o Brasil em um grande vexame internacional em seu discurso mentiroso na Assembleia Geral da ONU. Com pantanal em chamas, país de volta ao mapa da fome e recorde de mortes pela Covid-19, Bolsonaro tenta esconder o desastre de seu Governo!”.

Companheiro de partido, o senador Humberto Costa (PT-PE) preferiu ironizar a frequente tendência de culpabilização do presidente pelos problemas enfrentados pelo Brasil. “Só faltou Bolsonaro falar na ONU que os satélites da Nasa, que constatam o recorde de queimadas no Brasil sob Bolsonaro, são comunistas. Porque ele voltou a mentir dizendo que a Amazônia não queima porque é úmida. Passou vergonha!”, disse.

O deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) usou dados estatísticos para contrapor as informações divulgadas no evento mundial. “Na Assembleia Geral da ONU, Bolsonaro disse que o Brasil contribuiu para que o mundo continuasse alimentado, mas ele esquece do próprio povo. A fome no país aumentou 43,7% em 5 anos, os preços dos alimentos só aumentam e o presidente ainda reduz o valor do auxílio emergencial”, comentou.

Referindo-se ao chefe de Estado como ‘incendiário’, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) previu reações às mentiras ditas no evento. “Na ONU Bolsonaro incendiário e apoiador de criminosos ambientais mente descaradamente sobre sua política ecocida na Amazônia e no Pantanal. Negacionismo e fake news são a base deste governo genocida. Discurso é revoltante e deve gerar reação mundial contra crimes de lesa humanidade”.

Sem papas na língua, o senador Cid Gomes (PDT-CE) disse que Bolsonaro ‘segue envergonhando o país’. “Em discurso na Assembleia da ONU voltou a exercer a negação como método. Negou os incêndios na Amazônia e no Pantanal. Negou a incompetência para enfrentar a pandemia. Como sempre, transferiu culpas. Como sempre, se apequenou”, narrou.

Líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ) disse que o governo ajudou mais de 200 mil famílias indígenas, quando na verdade vetou água potável para povos indígenas em meio à pandemia. “O presidente envergonha o Brasil diante do mundo. Mente sobre a trágica situação do Brasil. O fracasso no enfrentamento à pandemia e às queimadas no Pantanal e na Amazônia é o resultado da sua péssima condução do país. Intencionalmente descolado da realidade, Bolsonaro não assume sua responsabilidade”, analisou.

Para a relatora da CPMI das Fake News no Congresso, deputada Lídice da Mata (PSB-BA), um dos graves pontos do discurso foi a constatação da subserviência de Bolsonaro ao governo norte-americano. “O discurso do presidente na ONU não só nos envergonha pela falta de preparo, mas também pela subserviência ao mandatário dos EUA.”

Presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire disse que Bolsonaro cometeu mais uma “estupidez racista”. “Interesses escusos de Bolsonaro transformaram índios e caboclos em incendiários (uma estupidez racista), hidroxicloroquina em tratamento pra Covid, 600 reais em 1000 dólares, Pantanal em Califórnia, floresta úmida em à prova de fogo. Mente no Brasil, mente na ONU”, resumiu.

Já o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, preferiu quantificar as incorreções ditas pelo presidente. “Bolsonaro reinventou as fake news. Até então as notícias falsas eram plantadas anonimamente para repercutirem sem lastro e disseminarem a desinformação. Na Assembleia Geral da ONU nosso presidente sustentou vergonhosamente um discurso com média de uma fake news por parágrafo”, apontou.

Primeira deputada indígena do Brasil, Joenia Wapichana (Rede-RR) disse ser ‘leviana’ a responsabilização dos povos originários. “É vergonhosa e leviana a atitude do presidente Bolsonaro na ONU, ao jogar a culpa pelos incêndios ambientais aos povos indígenas, originários desse país. Isso prova o despreparo, a incompetência e irresponsabilidade em administrar o Brasil”, declarou.

Após o discurso, a ONG Observatório do Clima analisou o conteúdo do manifesto para indicar as mentiras verificadas. “Brasil é uma vítima de ‘campanha internacional escorada em interesses escusos’. MENTIRA – Não há qualquer evidência de ligação entre ONGs e cientistas que denunciam o desmatamento e interesses comerciais. Ao contrário, protecionistas europeus torcem por desmatamento”, citou em uma das checagens.

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