Itália e Portugal comemoram o fim de suas ditaduras enquanto o Brasil bolsonarista quer celebrar o início. Por Donato

Atualizado em 25 de abril de 2019 às 18:07
Marcha contra o fascismo em Milão, antes das eleições na Itália, em março de 2018

O dia 25 de Abril marca o fim de duas ditaduras na Europa. Na Itália e em Portugal.

A lembrança e comemoração da data revelam a enorme diferença que ainda há entre aqueles dois países e o Brasil no que se refere ao tema.

Hoje em Portugal celebra-se os 45 anos da Revolução dos Cravos, que pôs fim na ditadura imposta pelo “Estado Novo” de Salazar (são curiosos esses movimentos batizados com ‘novo’ ou ‘nova’, quando surgem pode crer que vem coisa bem velha e antiquada).

Em Portugal é feriado no país todo e neste ano haverá ainda a inauguração de um memorial em homenagem aos presos políticos. O local era um presídio durante os anos do regime autoritário. Fica a pouco mais de 100 km de Lisboa e tornou-se símbolo da repressão.

Um painel será instalado com os nomes de todos os 2.510 opositores ao regime fascista que ali ficaram detidos e ainda haverá uma exposição intitulada “Por teu livre pensamento”, com memórias da ditadura portuguesa.

Manifestações ocorrem todos os anos por todo o país e para o ano que vem está prevista a criação do Museu Nacional da Resistência e da Liberdade.

Na Itália, o 25 de Abril é dia oficial da libertação das garras do nazi-fascismo de Mussolini e Hitler, feriado nacional, com festejos e atos dedicados a não permitir que a memória seja enevoada.

Ainda que boa parte da população mundial tenha uma visão formada pela narrativa que situa o exército americano como o herói que expulsou o vilão, italianos sabem que em várias regiões a libertação se deu pelas mãos de civis que pegaram em armas e venceram as tropas nazi-fascistas.

Sobretudo no norte, onde durante vinte meses as batalhas foram cruéis entre pelotões fortemente armados contra jovens de pistola em punho que rejeitavam o governo fantoche de Mussolini e sua fictícia República de Saló.

Os exércitos dos Aliados muitas vezes chegaram bem depois de partigianos da resistência já terem libertado as cidades ao custo de fome, frio, sangue e muitas vidas.

“Se quiserem andar pelos lugares onde nasceu nossa Constituição, devem ir às montanhas onde morreram partigianos, devem ir nos cárceres onde foram aprisionados, nos campos onde foram assassinados”, disse Piero Calamandrei em seu discurso de janeiro de 1955.

Essa é a enorme distância que existe hoje em dia entre o Brasil e duas nações que aprenderam com os erros. Uma distância bem maior que o Atlântico.

Enquanto locais marcados pela repressão tornam-se memoriais, por aqui o Doi-Codi até hoje é uma delegacia.

Enquanto lá comemoram-se as datas de libertação, por aqui há uma turma querendo celebrar a data de enclausuramento da democracia que por mais de 20 anos sofreu torturas e deixou desaparecidos e famílias destroçadas.

Sim, é certo que na Itália de Matteo Salvini a extrema direita anda colocando as asinhas de fora e torcendo o nariz para as comemorações do 25 de abril. Isso causou o cancelamento das festividades em algumas pequenas cidades por precaução a conflitos.

Mas nem um radical como Salvini se atreve a elogiar o nazismo ou o fascismo nem seria imbecil suficientemente para vociferar “Viva il Dulce” no microfone do Congresso.