A atriz Jodie Foster publicou um belo artigo sobre a cultura de celebridades, tema de que o Paulo Nogueira já tratou algumas vezes aqui no DCM. Apesar de algumas frases de efeito (é difícil crer que Jodie desistiria de ser atriz. Por que ainda não parou?), é um depoimento contundente sobre o lixo do celebritismo, a inutilidade das revistas de fofocas, a curiosidade mórbida sobre a vida alheia, o inferno da fama e o fim da privacidade. Parêntese: lembro-me de uma foto num site que virou motivo de piada na redação em que eu trabalhava: “Caetano sai de supermercado com sacolas de compras”, dizia a legenda, ou algo assim. E lá estava o velho baiano exatamente como descrito. Alguém deve ter achado aquilo realmente importante. Fecha parêntese.
Jodie estava saindo em defesa de Kristen Stewart, a mocinha da série Crepúsculo que foi flagrada dando uns amassos num diretor de cinema com quem estava tendo um caso. Ambos, Kristen e o diretor, eram casados. Tomou mais pedradas do que as adúlteras que o Talibã condena. Mas o melhor é deixar a própria Jodie Foster, 49 anos, ex-criança prodígio (seu primeiro papel foi aos 3), falar. Abaixo, alguns trechos de sua defesa da colega Kristen:
Não tenho lembranças de uma infância longe dos olhos do público. Muitas vezes, completos estranhos se aproximam de mim e perguntam: “Como você ficou tão normal?” A verdade é que, como um mutante radioativo curioso, eu inventei as minhas próprias ferramentas de sobrevivência góticas. Talvez eu tenha organizado as minhas opções de carreira para que eu (e os que realmente amo) tenhamos dignidade pessoal máxima. E, sim, eu sou neuroticamente adaptada para o esporte gladiador da cultura da celebridade, a crueldade de uma vida vivida como um alvo móvel. Na minha época, por meio de disciplina e força de vontade, você ainda podia ter a autenticidade de uma vida privada. Você tinha que aprender a submergir sob o ar poluído e respirar através de um canudo. Mas pelo menos podia se levantar e dizer: eu não vou participar voluntariamente da minha própria exploração. Não é mais possível.
Se eu fosse um jovem ator ou atriz começando na nova era das mídias sociais e sua temporada de caça, eu iria sobreviver? Será que eu me afogaria em drogas, sexo e festas? Será que eu estaria perdida? Eu já disse isso antes e vou dizer outra vez: se eu fosse uma jovem atriz, hoje eu iria desistir antes de começar.
Eu não acho que poderia sobreviver emocionalmente. Outra atriz poderia certamente ter tomado meu lugar, abrir a alma para criar os personagens, mostrar suas vulnerabilidades. Mas ela teria sobrevivido aos paparazzi perscrutando suas janelas, o assédio online, as humilhações públicas, sem uma overdose num quarto de hotel ou enfiando agulhas na cara até se tornar irreconhecível até para si mesma? Atores que se tornam celebridades deveriam ser gratos pelo interesse público. Afinal, eles estão sendo pagos. Mas um salário para um determinado desempenho na tela não inclui o direito de invadir a privacidade de ninguém.
Em 2001, eu passei cinco meses com Kristen Stewart no set de O Quarto do Pânico num espaço do tamanho de um closet de Manhattan. Nós conversamos e rimos por horas. Aprendi a amar aquela garota. Ela fez 11 anos durante a filmagem e, no aniversário dela, pedi para uma banda de mariachis fazerem-lhe uma serenata num bar de tacos. Ela dançou em torno de um sombrero comigo, mas logo correu para um jogo de basquete com a equipe do filme. Sua mãe e eu a vimos jogar, aplaudindo cada cesta. “Ela não quer ser atriz quando crescer, quer?” Eu perguntei. Sua mãe suspirou. “Sim… infelizmente.” Nós dois sorrimos e encolhemos os ombros com a ambivalência que nasce da experiência. “Você não consegue convencê-la a sair fora?”, eu disse. “Oh, eu tentei. Ela adora isso.” Mais suspiros.
Eu estava grávida na época e me vi sonhando com a criança que teria em breve. Seria ela como Kristen? Todo o talento, a beleza, o destemor… ela iria saltar e enterrar e me deixar orgulhosa? Há esta imagem que eu tenho de um momento perfeito: ela vem até mim como num filme caseiro de super 8, nenhum som, apenas um looping arranhado… Há uma menina de cabelos brancos surfando. Ela está cantando a plenos pulmões, pulando e girando na água fria. Ela está inconsciente da câmera, é claro, em seu próprio mundo. A câmera treme um pouco. Talvez a mãe dela esteja rindo atrás da lente. Poderia uma criança ser mais amada do que neste momento? Ela é perfeita. Ela é absolutamente perfeita.
Corta para hoje. A bela mulher anda sozinha, de cabeça para baixo, mãos crispadas. Ela vai rápido, correndo em torno dos homens enormes com câmeras empurradas sobre sua boca e seu peito. “Kristen, como você se sente?” Sorria, Kris!” “Eu tenho a foto. Eu a peguei!” Ela mantém a cabeça baixa, os punhos em seus bolsos. Não fale. Não olhe. Não chore.
Minha mãe tinha um ditado que distribuía após cada pequena injustiça, cada mágoa, cada momento de sofrimento abjeto. “Isso também passará.” Deus, eu odiava essa frase. Na verdade, tudo passa. Mas, no processo, você confia menos. Você calcula seus passos. Você sobrevive. Na esperança de que você não perca a capacidade de atirar os braços no ar novamente e girar em abandono selvagem. Esse é o “Fodam-se” definitivo e a ferramenta de sobrevivência mais bonita de todas. Não os deixe tirar isso de você.