As melhores histórias de uma lenda viva do pôquer

Atualizado em 23 de setembro de 2012 às 4:03

O lendário Doyle Brunson conta das vezes em que presenciou um jogador morrendo à mesa

Aos 79 anos, ele segue forte no circuito

Houve um tempo em que aguentar longas sessões à mesa de pôquer era um motivo de glória e orgulho entre os jogadores. Partidas de 24 horas eram consideradas curtas; não raramente o jogo se estendia por semanas ou, até mesmo, meses. Como não se lembrar, por exemplo, do épico duelo entre Nick “The Greek” Dandalos e Johnny Moss, na década de 1940? Os dois jogadores se digladiaram em Las Vegas por cinco meses seguidos, fazendo pausas apenas para cochilar. Pior para o grego, que ao fim da maratona, estava num buraco na faixa dos US$ 3 milhões, uma cifra próxima aos US$ 20 milhões em valores atualizados.

Foi numa dessas sessões que o cowboy Doyle Brunson, hoje com 78 anos, presenciou pela primeira vez um homem morrendo de emoção – somado ao cansaço – à mesa. Ele conta a história no ótimo livro My 50 Most Memorable Hands (“Minhas 50 Mãos Mais Memoráveis”, sem edição em português). “No começo da minha carreira”, diz Doyle, “havia pôquer em todos os bares, hotéis e salões de bilhar da Av. Exchange, em Ft. Worth, no Texas. Foi lá onde joguei minha maior sessão, de cinco dias e cinco noites sem dormir. Eu só parava para comer e ir ao banheiro.”

“No quarto dia de jogo”, escreve ele, “jogávamos No-Limit Lowball de ás a cinco [a menor mão puxa o pote, sendo o melhor jogo A2345]. Um amigo meu, Virgil, estava tomando pílulas e bebendo muito para ficar acordado. Me envolvi num pote com ele com a mão  A235K. Apostei, ele repicou e eu paguei. Troquei uma carta [como no pôquer fechado, há uma troca] e peguei um 7. Agora eu tinha A2357, uma mão forte nessa modalidade.”

“Saí apostando e Virgil botou all-in”, narra Doyle. ”Paguei. Quando abri a minha mão, Virgil olhou e disse: ‘Não tenho um cinco na minha’. Então mostrou o A2347 vencedor. Ele tomou um gole de uísque e, quando esticou o braço para pegar as fichas, morreu ali mesmo. Foi nesse momento em que descobri como os jogadores pôquer podem ser frios. Todos nós conhecíamos Virgil há anos e havíamos jogado com ele várias vezes. Depois que os paramédicos levaram o corpo, resumimos a partida e jogamos por mais 24 horas seguidas.”

Em outra partida de No-Limit Lowball, muitos anos depois, Doyle assistiu uma nova fatalidade. “Se você não aguenta o estresse”, escreveu ele, “deve ficar longa de mesa de pôquer. Sempre me perguntam como aguento a pressão do high stakes sem deixa-la me afetar. Faço o melhor que posso, e daí paro de me preocupar. É uma regrinha simples que sigo. Se estou fazendo o meu melhor, por que agonizar caso eu perca? Uma vez, eu jogava No-Limit Lowball com um senhor chamado Red Dodson. Estávamos na mesa havia horas e Dodson era um dos jogadores mais conservadores que já conheci.”

“Passei horas seguidas blefando em cima de Dodson, e ele sempre fugindo do pote”, conta Doyle. “Senti como se o Papai Noel tivesse chegado mais cedo no ano. Finalmente, Dodson pegou uma mão feita de A2346, a segunda melhor possível. Com A235, pedi uma carta e peguei um 4, fazendo o nuts. Como de costume, apostei, esperando que Dodson fugisse mais uma vez. Para a minha surpresa, porém, ele repicou todas as suas fichas, gritando: ‘Sei que você passou a noite inteira blefando em cima de mim. Quero ver o que faz agora.’”

“Paguei”, diz o texano, “e quando ele mostrou seu 4-6, abri o meu wheel [o nuts do Lowball]. O rosto de Dodson começou a ficar azul. Ele caiu da cadeira e, antes de chegar ao chão, já estava morto. Os médicos disseram que ele teve um ataque cardíaco maciço. Senti-me mal, mas isso é o pôquer e bad beats acontecem. Você precisa saber lidar com elas. Esse foi o segundo homem que vi morrendo à mesa. Ambos estavam jogando Lowball. Talvez seja por isso que as pessoas prefiram, hoje, o Texas Hold’em.”

Poucos jogadores foram tão dominantes no pôquer quanto Doyle na década de 70