Jornais tentam desqualificar livro dos juristas para defender Moro, parceiro do golpe. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 15 de agosto de 2017 às 11:38
Auditório lotado, no lançamento que desconstrói o herói da mídia: foto que você não vê nos jornais

A reportagem do Estadão sobre o lançamento do livro “Comentários a uma sentença anunciada – O Processo Lula”, ocorrida ontem na PUC, chama de “juristas políticos do PT” os autores da obra que analisa a decisão de Sérgio Moro que condenou o ex-presidente a nove anos e meio de prisão — mesmo sem prova do crime. Eles faziam parte do público, juntamente com advogados e estudantes.

Havia políticos lá, como José Eduardo Martins Cardozo, que também leciona, e Fernando Haddad, que é formado em direito pela USP, onde também dá aula, mas na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, mas ao lado dele estavam Celso Antônio Bandeira de Mello e Pedro Serrano, juristas (ponto).

O repórter registra que uma das organizadoras, a professora Gisele Cittadino, foi questionada sobre o motivo de ter publicado o livro somente depois da sentença de Sérgio. Ora, pois, é porque se trata de uma análise da sentença do juiz Sérgio Moro. Sem ela, não haveria livro. Mas Gisele foi educada na resposta:

“Não é somente algo sobre o Lula. A sentença recai sobre o direito à soberania popular (pela possibilidade de tirar Lula da disputa em 2018). Neste sentido, Lula não é uma pessoa qualquer”.

A transcrição do que José Eduardo Martins Cardozo disse no lançamento do livro merece um lugar na antologia dos piores momentos do jornalismo. Diz a reportagem que José Eduardo fez referência ao papel de Saulo Ramos no governo de Getúlio Vargas, quando usou a lei de defesa dos animais para livrar um comunista argentino da prisão e do risco da tortura.

No período a que faz referência, Saulo Ramos era um adolescente. O advogado em questão era Sobral Pinto – mais tarde, bem mais tarde, na campanhas das diretas, já velhinho, lembrava que “todo poder emana do povo e, em seu nome, é exercido” – e o preso político, Luís Carlos Prestes – o Cavaleiro da Esperança. Prestes tinha passado um tempo exilado na Argentina, mas era brasileiro.

Erros podem acontecer, mas, em algumas situações na velha imprensa, isso é o que menos conta. Pelo tom da reportagem, o compromisso do repórter não era mesmo com a precisão. Era para defender o herói construído com a ajuda do Estadão, Sérgio Moro.

“Os oradores se revezaram durante mais de duas horas em críticas aos supostos abusos da Lava Jato e ao juiz Moro, sob o argumento de que faltam provas contra o petista”, escreveu.

Segundo ele, a denúncia dos “supostos abusos” é “uma das plataformas escolhidas por Lula e pelo partido para fazer a defesa do petista na Lava Jato e defender o direito de o ex-presidente disputar a eleição presidencial do ano que vem”.

Cento e vinte e dois operadores e pensadores do direito a serviço do PT, inclusive Alberto Toron, que entre outros defende Aécio Neves, ou Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que tem 18 clientes na Lava Jato, entre eles os senadores Edison Lobão (PMDB-MA) e Romero Jucá (PMDB-RR).

Para a velha imprensa, parece não haver a mais remota possibilidade de se tratar, efetivamente, de uma reação legítima da advocacia ao desequilíbrio que a ação de Moro na Lava Jato evidencia.

Por que, em vez de adjetivos, não se analisam os textos publicados?

A cobertura da Folha não tem erros grosseiros. Mas o título mostra a que se presta: “Advogados atacam Moro e Lava Jato em lançamento de livro pró-Lula”.

É também a defesa de um herói construído em meio a uma disputa política que resultou no golpe de 2016.

Como lembrou o advogado Toron, Moro teve um papel decisivo no processo que tirou Dilma do Planalto, ao divulgar interceptação telefônica ilegal. “Ele foi um juiz a favor do golpe. Não foi mera casualidade”, disse.

A velha imprensa, ao tentar desqualificar o trabalho de mais de uma centena de profissionais do direito, faz  agora o que é próprio de uma quadrilha: defende o parceiro.

Autores reunidos

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PS: os jornais publicam duas fotos parecidas, com José Eduardo Cardozo discursando – a mensagem que querem passar é a mesma, o de livro político. Nesta reportagem, publico duas fotos que encontrei no Facebook, uma do auditório lotado e outra de alguns dos autores reunidos. Retratam melhor o fato ocorrido na PUC, o resto é propaganda política para defender Moro.