Juíza enquadra Olavo de Carvalho em ação estapafúrdia do guru: “Não afronte a civilidade”. Por Vinícius Segalla

Atualizado em 31 de março de 2019 às 14:22
Olavo de Carvalho

POR VINÍCIUS SEGALLA

A Justiça cansou. A boçalidade perdeu sua vez.

É isso o que se depreende dos autos do processo 1000250-02.2019.8.26.0050, que corre na 2ª Vara Criminal – Foro Central da Barra Funda -, em São Paulo.

Nele, o escritor Olavo de Carvalho processa o filósofo e professor da da Universidade Federal da Bahia Daniel Tourinho Peres.

Na ação penal, o escritor e guru do governo Jair Bolsonaro acusa o filósofo da UFBA de calúnia e difamação.

Ocorre que, no processo, é o próprio Olavo – por meio de seu advogado – quem ofende, com palavras chulas e agressivas, o professor Tourinho Peres.

É de tal maneira descabida a peça processual apresentada por Olavo à Justiça de São Paulo que a magistrada Daniela Martins de Castro Mariani Cavallanti, responsável pelo julgamento, se viu obrigada a tomar uma medida que raramente se vê nos tribunais: ela ordenou que Olavo de Carvalho se comportasse direito perante à Justiça.

Mandou ele começar o processo todo de novo, dessa vez sem usar ofensas e termos indevidos.

Disse, por fim, que deixa disponível ao professor da UFBA todas as ofensas que sofreu de Olavo neste processo, caso queira ele próprio processar o guru de Bolsonaro.

Veja o que escreveu a magistrada:

“Verifica-se a existência na peça inicial de palavras que afrontam às regras processuais relacionadas à linguagem cortês, civilizada e urbana. Intime-se o advogado constituído pelo querelante, o Dr.Francisco Carlos Cabrera de Oliveira, a excluir ou substituir expressões ofensivas da queixa-crime ofertada, tais como:

(i) “delinquente travestido”;

(ii) “caso de possível esquizofrenia”;

(iii) “cabeça incauta ou doente”;

(iv) “narrado pelo idiota”;

(v) “apenas discorre o bestial”;

(vi) “jargão que alguns nojentos  

(vii) “por canalhice própria”;

(viii) “este desqualificado”;

(ix) “canalhas, canalhas e canalhas”.

Sim, é difícil de acreditar, mas, sabe-se lá por que, Olavo decidiu processar alguém por injúria fazendo ele mesmo uso de inúmeras injúrias para tanto.

Veja, abaixo, alguns dos trechos da peça processual de Olavo, considerada incivilizada pela Justiça. Há muitos erros de português.

Todos constam no documento original e são aqui apenas transcritos.

“Assim, qualquer cidadão com um intelecto mediano, percebe de forma límpida que este desqualificado, militante, ou incauta, em tese, que assinou a matéria supracitada, terá que provar os fatos, ou seja, que o QUERELADO disse as palavras descritas nas mesmas disposições e que suas interpretações estão equivocadas.

Atingindo ainda, por via transversa, a Honra de Autoridades constituídas pelo Nobre Povo Brasileiro, vide inteligência de todo o contido na matéria. Como aceitar isso de um Professor Universitário, pois, em tese, mais parece coisa de aluno que não tem apreço ao verdadeiro estudo.

Muito nos preocupa o nível de alunos que estaremos formando, tomando como base este tipo de Professor, que com todo respeito: não sabe interpretar um texto de baixa complexidade. Por isso que estamos nos últimos lugares nos quadros mundiais da educação.”

(…) “O Mestre Olavo quando interpretou certos aspectos de Kant, não menosprezou o QUERELADO, se quer citou seu nome, pois nem o conhece. Agora o QUERELADO por sua vez, exara pelo inteiro teor da matéria, palavras não ditas por Olavo,após faz criticas depreciativa ao seu trabalho, tudo isso, por canalhice própria, ou, a mando de terceiros, em tese.” (…)

“O delinqüente travestido de Colunista, em tese, escuta aulas inteiras na internet, algumas duram mais de uma hora, a respeito de diversos temas e, ao seu bel prazer: interpreta da forma que lhe aprouver. Ora, ora, a que ponto chegamos isso não é liberdade de expressão, isso além de velhacaria, é crime, em tese, pois ao inserir e retirar frases e palavras do contexto, apenas desenforma a população.” (…)

“Nada mais surreal que: inventar que fulano disse uma coisa, que todos sabemos que não disse para depois interpretar a sua maneira fatos inexistentes. Sem duvida é um caso de possível esquizofrenia, ou mercancia, em tese.”

Estes são apenas alguns exemplos. Chega a ser chocante.

De qualquer forma, a juíza ordenou que Olavo atente para a civilidade no último dia 18.

No dia 20, seu advogado respondeu à Justiça, pedindo desculpas pela impostura, dizendo que agiu “no calor do momento”, e que jamais quis ofender ninguém, já que tanto ele quanto Olavo de Carvalho são “cristãos”.

É ler para crer:

“Em atenção ao r. despacho proferido por Vossa Excelência, este patrono, tendo conversado com o AUTOR (Olavo), data vênia, após o calor das injustas agressões perpetradas pelo RÉU, em tese, onde já se passaram o calor do momento, resolve emendar a exordial, em especial no sentido de atender os requerimentos perpetrados pelo M. M. Juízo, pois tanto este Patrono, como o AUTOR são Cristãos e nunca tiveram a intenção de ofender terceiros, pois as palavras foram colocadas no contexto genérico, as vezes, fazendo alusões a condenados judicialmente como: Lula e outros, bem como produzidas no momento em que o AUTOR estava sendo agredido de forma injusta, ou seja, no calor do momento, vide nexo causal, numa tentativa de repelir a supracitada injusta agressão nas matérias e vídeos veiculadas diversas vezes.”

Olavo de Carvalho pede ainda dez dias extras para enviar uma nova queixa crime, dessa vez – espera-se – feita aos moldes do que exigem as leis do Direito e do bom senso.