Juristas denunciam prefeito de Porto Alegre por crime de responsabilidade. Por Jeferson Miola

Atualizado em 29 de janeiro de 2020 às 18:42
Nelson Marchezan Junior (PSDB) é o novo prefeito de Porto Alegre. Foto: Divulgação/PSDB

Publicado originalmente no Blog do autor

POR JEFERSON MIOLA

A AJURD – Associação de Juristas pela Democracia ingressou no Ministério Público do RS com representação contra o Prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan Júnior/PSDB pela prática de crime de responsabilidade no uso de verbas públicas para gastos com publicidade ilegal, em desacordo com a Lei Orgânica do Município e as Constituições Estadual e Federal.

A representação é assinada pelo Presidente da AJURD, Mario Luiz Madureira, e por juristas como o ex-Procurador-Geral do Estado, Gabriel Pauli Fadel, o professor e pós-Doutor em Direito Lenio Streck, as advogadas Jucemara Beltrame, Luciane Toss, Luísa Stern, Maritânia Dallagnol e os advogados Daniel Severo Schiites, Jorge Buchabqui, Jorge Garcia de Souza, Leonardo Kauer Zinn e Ramiro Goulart.

Na representação [na íntegra adiante] a AJURD pede que o Prefeito seja afastado do cargo já durante a instrução criminal. A entidade requer, ainda, a apuração do montante de gastos feitos indevidamente com publicidade ilegal, com vistas ao ressarcimento aos cofres públicos.

Nos últimos dias de dezembro passado, o governo municipal veiculou ampla propaganda em órgãos de imprensa locais e, também, nacionais.

A publicidade fora de Porto Alegre não tem nenhum objetivo de informar os munícipes, e está claramente proibida na Lei Orgânica do Município – norma jurídica que tem eficácia equivalente à de uma Constituição Municipal e que estipula no seu artigo 125:

§ 2º – Ficam proibidas a publicidade e a propaganda de órgão da administração direta e indireta fora do Município, seja qual for o objetivo, exceto aquelas referentes à atividade turística”.

No parágrafo 8º do mesmo artigo 125, a Lei Orgânica tipifica como crime de responsabilidade o descumprimento desta proibição:

§ 8º – O não-cumprimento do disposto neste artigo implicará crime de responsabilidade, sem prejuízo da suspensão da propaganda ou publicidade e da instauração imediata de procedimento administrativo para apuração do ilícito”.

Além de descumprir a Lei Orgânica, a propaganda do prefeito Marchezan Júnior também descumpriu as Constituições do Estado [artigo 19] e Federal [artigo 37], que obrigam a observância do caráter educativo, informativo ou de orientação social da publicidade oficial, e proíbem o uso de “símbolos, expressões, nomes, ‘slogans’ ideológicos político-partidários ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridade ou de servidores públicos”.

As peças de propaganda veiculadas nos jornais do sudeste do país como Valor EconômicoO Estado de São Paulo e Folha de São Pauloforam consideradas “de cunho eleitoral” pela Juíza Keila Silene Tortelli, que em 2 de janeiro determinou a suspensão da publicidade governamental.

Um desses materiais de propaganda tinha como mensagem “As reformas que o Brasil precisa, Porto Alegre já fez”, embora tivessem como justificativa oficial a campanha para pagamento antecipado do IPTU [sic].

Os aspectos legais e processuais concernentes a crimes de responsabilidade cometidos por Prefeitos Municipais estão disciplinados no Decreto-Lei 201/1967. Caso acolha a representação da AJURD, o Ministério Público denunciará o Prefeito Municipal, que então terá de responder a processo criminal na Justiça, “independentemente do pronunciamento da Câmara de Vereadores” [artigo 1º do Decreto 201/1967].

Uma vez denunciado ao Judiciário, o juiz poderá acatar o pedido da AJURD de afastamento do Prefeito Marchezan Júnior do cargo durante a instrução criminal, como prevê o inciso II do artigo 2º do Decreto-Lei 201/1967.

Além do crime de responsabilidade, o prefeito fica ainda passível de julgamento por improbidade administrativa, se houver iniciativa neste sentido no Legislativo Municipal. Neste caso, porém, que pode culminar no impeachment do Prefeito, o julgamento é realizado na Câmara de Vereadores, diferentemente do rito de julgamento por crime de responsabilidade, que ocorre no Judiciário.

Se for condenado, Marchezan Júnior perde o mandato e fica inabilitado por 5 anos para o exercício de cargo ou função pública. Além disso, será obrigado a ressarcir os cofres municipais pelas verbas públicas empregadas em publicidade ilegal, como especifica o Artigo 1º do Decreto Lei 201/1967:

§ 1º Os crimes definidos neste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos”.

§ 2º A condenação definitiva em qualquer dos crimes definidos neste artigo, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular”.