Kakay: ‘Portaria 666, e parece que até o número indica, não é algo razoável. É muito grave’. Por Eduardo Maretti

Atualizado em 26 de julho de 2019 às 22:54
Kakay. Foto: CARLOS HUMBERTO/SCO/STF

Publicado originalmente no site Rede Brasil Atual (RBA)

POR EDUARDO MARETTI

“A Portaria 666, e parece que até o próprio número já indica, não é algo razoável. É muito grave. Eu penso que – com a manifestação da ABI, de jornalistas e advogados como um todo – isso não deverá dar em nada, porque seria um despautério (ação absurda, tolice), um retrocesso”, afirma o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, sobre a portaria que “regula o impedimento de ingresso, a repatriação, a deportação sumária, a redução ou cancelamento do prazo de estada de pessoa perigosa”, assinada pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, e cujo alvo principal é o jornalista Glenn Greenwald, do Intercept Brasil.

Para o criminalista, a portaria “é um desaforo, partindo de um ministro da Justiça”. “Cada vez mais ele perde as condições de continuar como ministro. É parcial, assim como foi enquanto juiz, e agora ele quer usar a estrutura do Estado, como usou a do Judiciário, para tentar atingir as pessoas que evidentemente têm a proteção constitucional do Direito e da plena liberdade do exercício do jornalismo”. Ele acrescenta: “Acredito que eles não vão tomar nenhuma providência contra o jornalista Glenn, até porque seria um escândalo internacional, com repercussão muito negativa”.

Em sua opinião, o ministro da Justiça teve o apoio do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para “fazer grandes absurdos”. “Mas ele está começando a entender que hoje não tem o apoio das pessoas que pensam neste país”.

“Há mais de dois anos eu dizia das dificuldades que esse cidadão teria se ocupasse um cargo político. Quando ele disse que ia assumir o Ministério da Justiça, dei uma entrevista ao Estadão onde dizia que ele teria um fim melancólico. E acho que ele infelizmente não tem a dimensão do que é ser ministro da Justiça”, afirma Almeida Castro.

Já o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, de acordo com a colunista Mônica Bergamo, afirmou que o ex-juiz e atual ministro da Justiça “usa o cargo, aniquila a independência da Polícia Federal e ainda banca o chefe de quadrilha ao dizer que sabe das conversas de autoridades que não são investigadas”. Em nota pública sobre a Portaria 666, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) afirmou que “considera inconstitucional e um abuso de poder”.

Na última quinta-feira (25), a Folha de S. Paulo publicou reportagem na qual revela que Moro avisou autoridades supostamente vítimas de hackers e que as mensagens relacionadas a eles precisariam ser destruídas. O argumento é a preservação da privacidade. Nesta sexta, em outra reportagem, o jornal informa ter contratado uma perícia que mostra “uma série de elementos de autenticidade” na gravação de áudio atribuída ao procurador da República Deltan Dallagnol, da Operação Lava Jato.

A informação sobre destruição de provas levou o ex-ministro e ex-candidato à presidência Ciro Gomes (PDT) a sugerir que o ministro de Bolsonaro deve ser preso. “É um dos casos clássicos de prisão preventiva: art.312 do código de processo penal: destruir provas… onde este senhor pensa que está?”, escreveu o pedetista.

Do outro lado, o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR) não perdeu tempo. Com a portaria 666 já em vigor, ele protocolou nesta sexta, na Procuradoria Geral da República (PGR), um pedido de prisão temporária de Glenn Greenwald para “melhor apuração dos fatos”, que, segundo ele, implicam o jornalista como coautor de “crimes informáticos” contra Moro e Dallagnol.

Governo atabalhoado

Para Kakay, o governo de Jair Bolsonaro “demonstra ser cada vez mais atabalhoado”.  “O presidente nem se diz. Muitas vezes ele se porta como se não tivesse noção da dignidade do cargo que exerce. E o atual ministro Moro, que enquanto juiz decepcionou a todos com uma postura absolutamente parcial, agora recorre a argumentos como essa portaria”.

O PT anunciou, nesta sexta-feira (26), uma ação no Supremo Tribunal Federal e uma representação na Procuradoria-Geral da República contra as ações de Moro, por “flagrante abuso de autoridade”, nos termos da Lei  4.898/65.

Em postagem no Twitter, o Psol questiona: “Até onde Moro pode ir?” De acordo com a legenda, o ministro “age como chefe de quadrilha”. Acrescenta que Moro perpetra “uma sequência de atentados à democracia: destruição de provas, ameaças, mentiras…”