O advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, encontrou-se em fevereiro de 2022 com Rodrigo Tacla Duran em Granada, na Espanha. O encontro foi o segundo entre os advogados.
O ex-defensor da Odebrecht acusa Sergio Moro, Deltan Dallagnol e a força-tarefa da Lava Jato de cometerem crimes para obterem delações premiadas.
Kakay concedeu uma entrevista ao DCM Ao Meio-Dia e falou sobre suas conversas com Tacla Duran e que enxerga uma “asfixia” contra o juiz Eduardo Appio, novo juiz da Lava Jato em Curitiba.
Confira os principais trechos.
“Kakay, você é persona non grata”
Esse depoimento do Tacla Duran é gravíssimo [o depoimento à Justiça Federal em Curitiba ocorreu na terça-feira (9), em audiência virtual]. Quero só fazer uma observação da importância de existir um juiz independente, um juiz sério, um juiz que respeita a jurisdição, e que respeita a Constituição.
Tenho dito e isso não é segredo que existia um conluio perigosíssimo e absolutamente calhorda em Curitiba. Sei disso porque, quando advoguei para Alberto Youssef no início da Lava Jato, no primeiro dia da operação, que foi março, seis meses depois pedi um habeas corpus afirmando que aquele caso deveria ser arquivado.
Ou seja, já naquele momento eu coloquei minhas barbas de molho e comecei a observar a politização da Lava Jato. Naquele momento eu não tinha certeza de nada. Comecei a debater. E ouvia muito de procuradores que respeito e de delegados de polícia: ‘Kakay, você é persona non grata. Você é uma das pessoas que eles pedem para delatar. Você é a pessoa que pedem para não contratar’.
E tínhamos advogados de aluguel no caso. Eu disse e escrevi para que a Ordem [dos Advogados] tomasse providências. Eram advogados que se viam como força auxiliar do Ministério Público.
É incrível. Certa vez eu tive um cliente muito importante que já tinha pago os honorários. Ele me disse: ‘Kakay, eu estou constrangido, recebi uma manifestação de um amigo comum no Ministério Público de Curitiba que eu teria que te deixar como meu advogado’. Respondi a ele que não vendo resultado. Sou um advogado. Eu trabalho.
Se ele, que corria o risco de ser preso, tem esse contato com Curitiba, eu saio do caso.
Não divido substabelecimento com esse tipo de advogado. Sai do caso e ele contratou um advogado que fazia parte dessa panela de Curitiba. Isso eu tenho dito a vocês há muitos anos.
Documentos avassaladores
Veja bem! Eu não estou fazendo qualquer tipo de acusação. Qual é a questão central? O Tacla Duran me procurou há algum tempo atrás. Fui para a Espanha e estive duas vezes com ele.
Na primeira vez, ele me impressionou muito. É sério e concatenado nas colocações. Ele é inteligente. Tudo o que ele faz tem começo, meio e fim. E Tacla Duran me mostrou alguns documentos avassaladores.
Um especialmente que infelizmente eu não posso falar, mas que eu espero que ele tenha apresentado ao doutor [Eduado] Appio na 13ª Vara.
É um documento que comprova, de uma forma cabal, boa parte do que Tacla Duran está dizendo. Eu vi este documento. Estive com ele em mãos. A vontade dele era fazer uma delação.
Eu disse: ‘Tacla, eu não posso advogar com uma delação. Eu sou crítico das delações premiadas. Desde o início da Lava Jato. Eles estupraram o instituto da delação. Nem para chegar nas pessoas que eu acho que fizeram isso eu topo fazer’.
Até indiquei para ele um grande advogado para tomar as devidas providências. Depois eu voltei à Espanha. E Tacla Duran me chamou para conversar novamente. Essa foto que saiu hoje na imprensa é da última reunião que tive com ele.
Tacla Duran estava com a documentação.
Qual é a questão central? Ele queria falar. Ele era arrolado como testemunha e o doutor Sergio Moro não o deixava falar. Nunca vi isso antes em 40 anos de advocacia.
Estão asfixiando a 13ª Vara de Curitiba
Todo cidadão tem o direito de arrolar quem quiser para sua defesa dentro Direito Constitucional, no direito a ampla defesa que Sergio Moro não permitia na Lava Jato.
Felizmente o Supremo Tribunal Federal agora considera que toda delação tem que ter o que se chama de elemento de corroboração externo. Antes era mentira atrás de mentira, o que fazia a delação não valer nada.
Eu estou acompanhando agora um processo em que é realmente inacreditável o que o cidadão covarde faz através de um advogado que faz delação premiada.
Como não tinha nenhum elemento de corroboração, a polícia pediu uma busca e apreensão afirmando que era necessário provar.
Você não pode ter uma fala de um delator sem nenhuma prova. A partir do momento em que o Supremo diz toda e qualquer delação tem que vir acompanhada de uma corroboração externa garantista e cumpridora da Constituição, para a proteção dos direitos individuais.
O Tacla Duran está querendo falar. Com ele, eu vi documentos que são muito sérios e, se eles forem entregues para as autoridades, passarão em uma perícia muito competente da Polícia Federal.
Eles verificarão se tem montagem e, se for verdade, é possível fazer uma quebra de sigilo bancário para verificar as transações.
Perdi dezenas de clientes por conta dessa panelinha das delações, inclusive deixei de atender um senador. Ele foi até a minha casa à noite de um sábado e disse: ‘Olha tive uma proposta agora irrecusável e vou ter que contratar um cara para fazer uma delação’. E era uma pessoa que eu tinha na melhor conta.
Aquele ex-cliente fez uma delação para não ser processado, para não ser denunciado.
Eu não faço delação. Temos colegas que fazem e é dentro da ética, dentro da normalidade democrática.
Teve um caso de delação interessantíssimo. Por que foi interessante? Porque o juiz Sergio Moro exigiu numa época determinar alguma medida cautelar.
O cidadão decidiu fazer uma delação. Então as autoridades desistiram da prisão cautelar porque o acusado iria trazer o dinheiro de fora do país. Como assim? Então não tinha necessidade de medidas cautelares, que seguem requisitos específicos.
As delações transformaram isso num balcão de negócios. Quantas vezes eu pedi ao conselho federal da Ordem dos Advogados para abrir uma investigação sobre esses advogados que desonram a classe?
Pelo menos agora temos um juiz independente e sério na Lava Jato. E estão asfixiando o juiz Eduardo Appio, eu estou sabendo disso.
Ele não tem mais assessor. Eu fui recentemente à 13ª Vara de Curitiba, onde nunca fui porque não tratava com o juiz Sergio Moro. Eu tinha dignidade suficiente para não me sentar na frente do juiz que eu desrespeitava e que não levava em consideração.
Agora eu fui lá. Tiraram toda a estrutura do juiz Appio. Ele não tem um assessor. É claro que agora os ventos estão mudando depois que um determinado desembargador pediu a suspensão. Sei do movimento que foi feito pelo CNJ e sei que o ministro Salomão foi muito expedito.
Appio tem independência e já comprovou que a tem. Tacla Duran queria vir ao Brasil para poder prestar um depoimento de viva voz, o que é muito mais importante.
Foi publicado que Tacla Duran teria um pedido de prisão. Ele me ligou e eu disse que ele não deveria chegar aqui correndo o risco de ser preso. Me disseram que o Tacla teria salvo conduto para vir ao Brasil, mas as pessoas não confiam. Ele ficou inseguro.
Mas temos um juiz equilibrado agora. Quando Tacla Duran falou sobre o senador Sergio Moro, o doutor parou o depoimento para encaminhar essa parte ao STF. Ele então recomeça o depoimento pedindo que não se fale sobre o ex-juiz para não interromper novamente.
Veja a entrevista completa.