Kast vence eleição presidencial no Chile e extrema direita retorna ao poder

Atualizado em 14 de dezembro de 2025 às 19:43
José Antonio Kast, do Partido Republicano — Foto: GUILLERMO SALGADO / AFP

O político de extrema direita José Antonio Kast foi eleito presidente do Chile neste domingo, 14, ao confirmar a vantagem construída ao longo da campanha do segundo turno. Com o resultado, o Palácio La Moneda volta a ser ocupado por um governo alinhado à extrema direita, após quatro anos sob a gestão de esquerda de Gabriel Boric. Kast será o primeiro chefe de Estado chileno a declarar admiração pública pelo ditador Augusto Pinochet.

Com 25% das urnas apuradas, Kast somava 59% dos votos, contra 40% da candidata governista Jeannette Jara, do Partido Comunista. Diante da diferença de quase 20 pontos porcentuais, projeções da Justiça Eleitoral chilena passaram a tratar o resultado como irreversível.

Levantamentos de intenção de voto já indicavam vantagem confortável para Kast depois que ele conseguiu concentrar o apoio dos demais candidatos da direita derrotados no primeiro turno.

Advogado, de 59 anos, católico praticante e pai de nove filhos, José Antonio Kast disputou a presidência pela terceira vez. Nas eleições anteriores, foi derrotado, sobretudo por causa de suas posições rígidas em temas ligados a costumes e gênero.

Em Conchalí, na Região Metropolitana de Santiago, a candidata do Partido Comunista, Jeannette Jara, vota no 1º turno das eleições presidenciais do Chile (16/11/2025). Os chilenos também foram às urnas para escolher deputados, senadores e autoridades municipais. Crédito: Facebook/Jeannette Jara – Reprodução.
Jeannette Jara ao votar no 1º turno das eleições presidenciais do Chile. Foto: Reprodução

Após os reveses eleitorais, Kast alterou sua estratégia. Reduziu a centralidade das pautas morais, ampliou a presença feminina na campanha e buscou ampliar sua aceitação junto ao eleitorado, especialmente em um cenário de disputa com uma candidata do Partido Comunista.

Nesta eleição, concorreu pelo Partido Republicano, fundado por ele há cinco anos, após romper com a direita tradicional, que considera excessivamente moderada. Uma das autoras de sua biografia, María José Hinojosa, afirmou ao Estadão que Kast se vê como “o salvador do Chile” e o descreveu como um político de forte apelo pessoal.

Entre as principais promessas de campanha estão o endurecimento das políticas de segurança pública e a deportação de cerca de 340 mil imigrantes em situação irregular, a maioria venezuelanos. O presidente eleito não apresentou detalhes sobre como pretende executar essas medidas, que exigem recursos elevados e acordos com outros países — inexistentes, no caso da Venezuela.

Kast assumirá o cargo em março diante de um Congresso favorável. O Partido Republicano ampliou sua presença na Câmara e no Senado e poderá contar com o apoio de outras siglas da direita para aprovar projetos centrais de sua agenda.

Após votar na comuna de Paine, a cerca de 40 quilômetros de Santiago, Kast foi recebido por apoiadores que entoavam gritos de “Presidente!”. Ele afirmou que pretende governar para todo o país. “Quem vencer precisa ser presidente de todos os chilenos”, declarou à imprensa.

“Vou votar em Kast porque ele me passa mais confiança. O comunismo nunca trouxe resultados positivos”, disse à AFP o caminhoneiro José González, de 74 anos, enquanto aguardava para votar no centro da capital.

Durante a campanha, Kast repetiu que “o país está caindo aos pedaços”. Em aparições públicas, muitas vezes protegidas por vidros blindados, descreveu o Chile como dominado pelo tráfico de drogas e distante do desempenho econômico que o destacou na América Latina nas últimas décadas.

“O que importa são empregos e segurança. As pessoas precisam sair de casa sem medo e voltar tranquilas”, afirmou à AFP Úrsula Villalobos, dona de casa de 44 anos que declarou voto em Kast.

Pesquisa do Ipsos divulgada em outubro indicou que 63% dos chilenos apontam o crime e a violência como principais preocupações, seguidos pelo baixo crescimento econômico. Especialistas, porém, avaliam que o medo percebido pela população supera os índices oficiais de criminalidade.

Embora os homicídios tenham dobrado na última década, os números estão em queda há dois anos. Ainda assim, houve aumento de crimes violentos como sequestros e extorsões, associado à atuação de grupos criminosos estrangeiros, entre eles o Tren de Aragua, da Venezuela.

O governo de Gabriel Boric, que chegou ao poder após os protestos de 2019, não conseguiu aprovar uma nova Constituição para substituir o texto herdado da ditadura. Para o cientista político Robert Funk, da Universidade do Chile, esse fracasso enfraqueceu decisivamente a sustentação política do presidente.

Kast apoiou o regime militar e já afirmou que Pinochet votaria nele se estivesse vivo. Na campanha mais recente, evitou tratar desse tema e de outras posições controversas, como sua oposição total ao aborto.

Reportagens publicadas em 2021 apontaram que o pai de Kast, nascido na Alemanha, integrou o Partido Nazista. O presidente eleito afirma que ele foi recrutado à força pelo Exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial e nega que tenha sido simpatizante do nazismo.

Desde 2010, a Presidência do Chile alterna entre governos de direita e de esquerda. Em 2021, após a disputa entre Boric e Kast no segundo turno, o país viveu seu período mais alinhado à esquerda na história recente, embora Boric tenha recuado para posições mais moderadas diante de derrotas no Congresso e no processo constituinte.