Kennedy Alencar: por critérios da Lava Jato, há indícios e evidências de perseguição a Lula

Atualizado em 6 de abril de 2018 às 17:27
O triplex no Guarujá

Publicado no Blog do Kennedy

Numa analogia que leva em conta a forma como a própria Lava Jato interpreta e aplica a lei penal, sobretudo no conceito de prova suficiente para condenação, é possível dizer que existe um conjunto de indícios e evidências que demonstra que o ex-presidente Lula recebe tratamento diferente de outros acusados e condenados. Até mesmo para os parâmetros de celeridade estabelecidos pela Lava Jato, há uma rapidez maior quando se trata de analisar o caso do petista.

Essa é uma das razões que levam parte significativa da comunidade jurídica, especialmente uma parcela de advogados e professores de direito, a considerar que ocorre uma perseguição judicial a Lula, como se a prisão do ex-presidente fosse um troféu para a Lava Jato em geral e o juiz Sergio Moro em particular.

Segundo Lula e sua defesa, seria apresentado até o dia 09 de abril mais um recurso _embargos dos embargos. Os críticos dizem que se trata de manobra protelatória, explorando a possibilidade recursal do sistema jurídico brasileiro para arrastar processos e adiar decisões. Defensores da medida afirmam que se trata de respeito ao devido processo legal e à presunção de inocência.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região enviou ofício a Moro às 17h31 de ontem considerando que houve exaurimento de recursos na corte em relação ao processo do apartamento no Guarujá no qual Lula foi condenado. Em 22 minutos, às 17h53, Moro deu o despacho de quatro páginas com a ordem de prisão.

Tal agilidade transmite a imagem de ação parcial, de despacho pronto e coordenado com a comunicação que chegaria do tribunal a fim de permitir que Moro mandasse prender o ex-presidente em prazo recorde num processo já marcado por ligeireza. Para conter a ansiedade, Moro deveria levar em conta uma variação da figura da mulher de César. Além de ser imparcial e justo, deveria parecer imparcial e justo. A imagem de magistrados e procuradores justiceiros prejudica a Lava Jato e o combate à corrupção.

O STF (Supremo Tribunal Federal) terminou o julgamento do habeas corpus preventivo de Lula no início da madrugada de ontem. O pedido da defesa do ex-presidente foi negado. Mas a decisão só se torna oficial com a publicação do acórdão. Logo, o salvo-conduto expedido no final de março ainda estava valendo no momento em que Moro deu a ordem de prisão. Ritos no direito são sagrados.

Falando do Supremo, é importante notar que a votação do habeas corpus de Lula deixou claro que uma nova maioria se formou no tribunal contra a possibilidade de execução da pena de prisão após sentença condenatória na segunda instância.

Caso estivessem em votação as ADCs (Ações Declaratórias de Constitucionalidade) que questionam a prisão na 2ª instância, uma maioria de 6 a 5 contra essa possibilidade estaria formada devido à mudança de pensamento do ministro Gilmar Mendes e à confirmação de Rosa Weber que votou contra Lula porque se examinava o habeas corpus e não as ações de repercussão geral.

Essa nova maioria derrubaria o entendimento adotado pelo STF em outubro de 2016 a favor da possibilidade de aplicação da pena de prisão após condenação na segunda instância. Mas a presidente do Supremo, a ministra Cármen Lúcia, decidiu engavetar tais ADCs, apesar de o colega Marco Aurélio Mello tê-las liberado em dezembro para apreciação do plenário. Em episódios rumorosos envolvendo três políticos de expressão, o petista Lula, o tucano Aécio Neves e o emedebista Renan Calheiros, Cármen Lúcia atendeu a pressões políticas para definir a pauta. Nesses casos, a presidente do STF beneficiou Aécio e Renan e prejudicou Lula.

Em entrevista ontem ao “Jornal da CBN – 2ª Edição, o ministro Gilmar Mendes disse que a manipulação da pauta do STF não pode acontecer. Também em entrevista à rádio, Lula afirmou que Morou apressou sua ordem de prisão a fim de evitar uma eventual liminar do STF que pudesse impedir sua detenção.

No abaixo-assinado entregue por juízes e procuradores a favor da manutenção da possibilidade de aplicar a pena de prisão após condenação em segunda instância, há um trecho que fala das provas ao analisar a presunção de inocência.

Diz o abaixo-assinado, denominado nota técnica: “O caráter relativo do princípio da presunção de inocência remete ao campo da prova e à sua capacidade de afastar a permanência da presunção. Há, assim, distinção entre a relativização da presunção de inocência, sem prova, que é inconstitucional, e, com prova, constitucional, baseada em dedução de fatos suportados ainda que por mínima atividade probatória.

Disso decorre que não é necessária a reunião de determinada quantidade de provas para mitigar os efeitos da presunção de inocência frente aos bens jurídicos superiores da sociedade, a fim de persuadir o julgador acerca de decreto de medidas cautelares, por exemplo; bastando, nesse caso, somente indícios, pois o direito à presunção de inocência não permite calibrar a maior ou menor abundância das provas”.

Voltando ao processo do apartamento no Guarujá, três desembargadores do TRF-4 confirmaram por unanimidade a decisão de primeira instância do juiz Sergio Moro, mas elevaram a pena de prisão para 12 anos e um mês _dosimetria para impedir a prescrição. Votos tão semelhantes podem ser resultado da força das provas ou de uma ação corporativa de magistrados para não desmoralizar a decisão de Moro. No meio jurídico, houve intepretações nos dois sentidos.

Aplicados os critérios utilizados pela Lava Jato nesse processo, há evidências e indícios de seletividade na análise do caso de Lula. Boa parte da comunidade jurídica do país pensa assim. A História julgará com menos paixão as passagens e os personagens, maiores e menores, desse grave momento da vida brasileira.