Lamento tucano: o governo acabou de morrer em fevereiro, diz consultor do PSDB. Por Miguel Enriquez

Atualizado em 16 de maio de 2018 às 19:14
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POR MIGUEL ENRIQUEZ

A bateria de números negativos sobre o desempenho da economia brasileira divulgados nesta semana colocou em polvorosa  setores importantes do mercado financeiro e do empresariado.

A despeito da tentativa de Michel Temer de dourar a pílula e festejar com fanfarras o segundo ano de seu governo, a realidade se encarregou de colocar as coisas nos devidos lugares.

Primeiro foi o relatório da Serasa Experian, com os dados da inadimplência no país, que atinge a marca recorde de 61,2 milhões de consumidores, o equivalente à população da Itália.

O segundo, ficou por conta do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-BR), liberado nesta quarta feira,16. 

De acordo com IBC-BR, que é uma prévia do PIB, no primeiro trimestre deste ano, a economia apresentou um resultado negativo de 0,13%, puxado pela queda de 0,74% em março, na comparação com o mês anterior.

A esses péssimos indicadores se soma o crescimento da taxa de desemprego apurada pelo IBGE, que chegou a 13,1%.

A perplexidade que tomou conta da turma que vinha apostando todas as suas fichas na retomada do crescimento e das reforma na economia pode ser aferida pelas declarações de Sérgio Valle, economista chefe da MB Consultores, a mais tucana das firmas de consultoria brasileira, de José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazendo, no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Otimista inveterado, antes, durante e depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff, Em entrevista à rádio Jovem Pan, Valle não escondeu sua decepção com a conjuntura que teima em desfazer suas previsões, colocando, ao lado de fatores externos,  o fracasso do governo Temer como os principais responsáveis pela reversão de expectativas.

“O governo teve uma parada cardíaca, em maio do ano passado, ficou de cama e acabou de morrer em fevereiro”, afirmou.        

A seguir, os principais trechos da entrevista:

O número foi pior do que a gente imaginava. Na verdade, a gente está vendo esses números de atividade ao longo de todo este ano, especialmente neste primeiro trimestre, que estão de fato desapontando. De forma quase generalizada, os indicadores nacionais estão mostrando números aquém do que a gente gostaria.

Infelizmente, a gente já está com quatro meses completos de  2018, e com o primeiro trimestre fechado. Em termos de dados, os números, de fato, foram muito ruins, e isso impacta no ano de forma muito concreta.

Os números de previsão do PIB por conta disso, infelizmente, começam a ser rebaixados. A gente começa a ter a visão de um PIB que, se tudo der muito certo, consegue chegar a 2,5%. Mas tem a tendência de ficar entre 2% e 2,5%, pelo andar da carruagem. Precisaria melhorar bastante para a gente chegar a 2,5%.

De fato, a gente teve surpresas bem negativas na atividade, neste ano, que aparentemente podem continuar um pouco nos próximos meses, por conta de todos os riscos que ainda existem.

A gente tem um cenário internacional que está ficando um pouco mais complicado, por conta dos Estados Unidos, o petróleo subindo por conta de riscos geopolíticos e, aqui dentro, a eleição. Cada mês que passa fica mais incerto sobre quem vai vencer. Com as opções que se tem, a gente fica com uma insegurança muito grande sobre o que fariam de política econômica. Então, você junta todo esse cenário e realmente fica uma expectativa de crescimento bem desalentadora. “

Um elemento extremamente relevante aqui é o que aconteceu no ano passado. Crescimento não vem por coisas que estão acontecendo apenas naquele exato momento. A economia tem um certo dinamismo e responde a fatos que aconteceram no passado, na maior parte das vezes.

No ano passado, a gente teve a crise do Temer em maio, a crise política. A partir daí,o governo praticamente morreu. Foi uma parada cardíaca e ele terminou de morrer em fevereiro, com o fim  da reforma da Previdência.

Então, essa paralisação das reformas que eram tão necessárias, a partir daquele momento (e o governo que ficou quase 100% do tempo na defensiva), atrasou tudo o que a gente precisava avançar para continuar estimulando o crescimento da economia.

Dou um exemplo muito concreto disso. O Cadastro Positivo, que se não tivesse tido a crise a gente teria muito provavelmente aprovado no ano passado, atrasou demais. Tem talvez agora a chance de ser aprovado no Senado, mas a gente perdeu muito tempo com isso. E o cadastro positivo traria a chance de se ter uma queda relevante do spread bancário, que poderia estar ajudando no crescimento de consumo neste ano.

São elementos que atrasaram todo o caminho de reformas que a gente estava fazendo desde 2016. Aí. você junta duas dinâmicas que apareceram neste ano e que estão servindo para arrefecer o crescimento.

Uma é o cenário  externo, que entrou de forma pesada nste ano, jogando a taxa de câmbio lá para cima e trazendo riscos mais à frente para as expectativas de investimento, para as expectativas de consumo.

A outra é a eleição. O cenário político apresentava no início do ano, para o mercado e para a maior parte dos analistas, uma grande chance de eleger alguém de centro, reformista. No entanto, hoje,  aumentou muito a possibilidade de alguém não reformista, populista, levar eventualmente essa eleição. E, com isso,  consequentemente, a  gente deverá ter dificuldades para aprovar a reforma da Previdência e para o gerenciamento da economia para o ano que vem.

São conjuntos de vários fatores, mas esses três são extremamente relevantes: a morte súbita do governo, em maio do ano passado, o cenário externo complicado desde o início do ano e o cenário político que está ficando mais adverso.

Eu brinco assim: o governo teve uma parada cardíaca, em maio do ano passado, ficou de cama e acabou de morrer em fevereiro. Esse limbo aí, entre maio e fevereiro deste ano, já foi quase mortal para a economia, que paralisou praticamente boa parte das decisões que seriam positivas para continuar estimulando o crescimento.

A gente está hoje sofrendo o efeito disso. É sempre difícil imaginar o tamanho desses impactos, de mensurar o real impacto desse tipo de paralisia na economia. Hoje, a gente está vendo um pouco desse efeito. Um crescimento mais baixo, caminhando para alguma coisa entre 2% e 2,5%,  que poderia ser muito melhor se a gente tivesse um governo funcionando normalmente, que não tivesse paralisado daquela forma que paralisou a partir de maio.