Lições da prisão de Zinho. Por J. Carlos de Assis

Atualizado em 27 de dezembro de 2023 às 20:14
Miliciano Luis Antônio da Silva Braga, o Zinho. Foto: Reprodução

Com a decisão de Luis Antônio da Silva Braga, o Zinho, de entregar-se à Polícia Federal, ficou demonstrado que, com persistência e um trabalho policial sério e honesto, é possível vencer a guerra contra a milícia e o tráfico no Rio. Milhares de pessoas pagaram por isso com suas vidas, inclusive os três médicos mortos por milicianos na Barra da Tijuca, num crime bárbaro que sacudiu a consciência fluminense contra o crime organizado. Entretanto, a situação parece estar mudando.

A atuação da Polícia Federal tem sido decisiva nesse combate. Na medida em que ela, mesmo sem caracterizar intervenção, passou a integrar uma força tarefa conjunta contra a criminalidade no Estado, com participação das polícias e da Promotoria, houve importantes progressos no setor. É claro que isso foi fundamental para que a luta contra o crime não fosse entregue exclusivamente a uma polícia estadual em parte corrupta e manipulada por políticos inescrupulosos.

Um Estado onde cinco governadores foram afastados do cargo por corrupção, e o sexto corre o risco de também sê-lo agora, certamente não tem uma estrutura policial confiável. Há pouco tempo o chefe da Polícia Civil foi trocado por pressão do presidente da Assembleia Legislativa. O cidadão comum, a primeira vítima da corrupção de parte da Polícia, deve se perguntar por que deputados  tem tanto interesse em decidir na prática a nomeação de policiais e delegados.

A resposta a essa pergunta também acaba de ser dada pela Polícia Federal. Graças aos esforços principalmente dela e do Ministério Público, a deputada Lucinha, do PSD, foi desmascarada como a “madrinha” política da milícia de Zinho, que impõe uma perseguição implacável a 4 milhões de fluminenses. Sem a descoberta dos federais, a deputada continuaria mandando no sistema judicial do Rio, como tem acontecido com o acobertamento de muitos bandidos poderosos no Estado.

Assistimos aqui ao que aconteceu nos Estados Unidos anos 30. Também lá a cumplicidade das máfias com parte da polícia corrupta de muitos Estados – e, principalmente, em Chicago – aterrorizava boa parte da população. Até que, no Dia de São Valentim, em 1929, sete mafiosos foram massacrados pela facção rival. A população se indignou, e o FBI foi chamado a entrar em ação. Graças a isso, a influência da máfia no sistema judicial norte-americano começou a refluir.

Foi o assassinato covarde, e “por engano”, dos três médicos e um ferido na Barra que deflagrou a operação conjunta das polícias no Estado do Rio. Pouco antes o bando de Zinho, vingando-se da morte pela polícia de um comparsa da cúpula da milícia, desfechou na Zona Norte da cidade uma operação de terror incendiando 35 ônibus e paralisando a região. Foi demais. Se o Estado não reagisse, de alguma forma, a população se veria totalmente entregue nas mãos da criminalidade.

Espera-se que a prisão de Zinho, que se entregou por sentir-se ameaçado de morte, tenha sido o começo, não o fim, da luta contra o crime no Rio. Aliás, considero a atuação das milícias mais daninhas do que o próprio tráfico, embora os dois tipos de criminalidade frequentemente se cruzam. É que as milícias, e eventualmente também o tráfico, cobram de uma população tremendamente pobre por serviços que o Estado e as concessionárias de serviços públicos são obrigados a prestar. É uma covardia.

Entretanto, talvez a praga maior sob a qual vive a população fluminense está no sistema judicial. Há mais criminosos do que presídios, e o governo não amplia a rede deles. Talvez por isso há um tremendo relaxamento de prisões de criminosos, ditos de baixa periculosidade. Não é raro, entretanto, que saiam da prisão e logo voltem ao crime. Basta ver a quantidade deles que, novamente presos, exibem vasta fixa criminal. Assim, mesmo quando a polícia faz bem seu trabalho, apenas enxuga gelo.

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J. Carlos de Assis
Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)[2] e autor de mais de 20 livros.