Liminar de Gilmar sobre impeachment no STF segue padrão das democracias no mundo; confira

Atualizado em 3 de dezembro de 2025 às 18:57
O ministro Gilmar Medens, do STF

Ministros do STF avaliam que a liminar de Gilmar Mendes — que restringe ao procurador-geral da República a iniciativa para pedidos de impeachment contra integrantes da Corte — deve ser confirmada pelo plenário. A decisão, segundo membros do tribunal ouvidos pelo G1, reduz o risco de “uso político” do mecanismo e cria uma barreira institucional para episódios de retaliação, especialmente diante da mudança de composição esperada no Senado a partir de 2026.

Um ministro afirma que a medida eleva o ambiente de tensão entre os poderes, mas já produz “um freio de arrumação”. Outro vê a liminar como resposta ao acúmulo de pedidos de impeachment contra Alexandre de Moraes, todos abusivos: “A tendência era intensificar”. A ação foi apresentada pela Associação dos Magistrados Brasileiros e pelo Solidariedade, que contestam trechos da Lei 1.079/1950. A PGR e a AGU têm cinco dias para se manifestar.

O Supremo Tribunal Federal deve avaliar, entre 12 e 19 de dezembro, a liminar. A medida suspendeu o trecho da Lei do Impeachment que permite a qualquer cidadão enviar ao Senado uma acusação por suposto crime de responsabilidade cometido por ministros do STF — condição que pode levar à abertura de um processo de destituição.

Como a decisão foi tomada monocraticamente, ela precisa agora ser submetida ao plenário, onde os demais ministros irão decidir se mantêm ou não a restrição imposta. A medida desmonta uma articulação da extrema-direita que vinha sendo preparado para 2027 com foco na Corte.

O debate reacende uma questão mais ampla: como países desenvolvidos tratam a responsabilização de juízes de cortes constitucionais? Em geral, a possibilidade de destituição existe — mas é formulada como mecanismo excepcional, cercado de barreiras formais, políticas e simbólicas. Na maior parte das democracias, nunca foi acionado ou resultou em afastamento definitivo.

O padrão mundial é claro:
• o impeachment de ministros de cortes constitucionais existe;
• mas é tratado como instrumento raríssimo, cercado de exigências formais e políticas;
• e projetado para evitar usos casuísticos.

Nesse contexto, a liminar de Gilmar Mendes se alinha ao que democracias consolidadas adotam: mecanismos que impedem a banalização do afastamento e preservam a independência judicial — sem eliminar a possibilidade de responsabilização em casos extremos.

Veja como funciona em outras democracias:

ESTADOS UNIDOS

A Constituição prevê impeachment para juízes federais, incluindo integrantes da Suprema Corte, por “crimes graves e contravenções”.
• A Câmara faz a acusação por maioria simples.
• O Senado julga e exige dois terços dos votos.
• Em 235 anos, só um ministro da Suprema Corte foi acusado: Samuel Chase, em 1804, absolvido no Senado.
Juízes federais de instâncias inferiores já foram destituídos, mas nunca alguém da Suprema Corte.

REINO UNIDO

A Suprema Corte substituiu a antiga instância final exercida pela Câmara dos Lordes. Seus ministros podem ser afastados apenas por:
• incapacidade comprovada;
• má conduta grave.
Para isso, é necessária uma moção conjunta aprovada pela Câmara dos Comuns e pela Câmara dos Lordes. A remoção é formalizada pelo monarca, mas apenas com aprovação do Parlamento.
Não há nenhum caso desde a criação da corte. Mesmo antes disso, destituições de juízes superiores eram raríssimas — e tratadas como última alternativa.

Os juízes da Suprema Corte dos EUA

ALEMANHA

O Tribunal Constitucional Federal possui 16 juízes eleitos pelo Bundestag e Bundesrat. Eles podem ser processados por violar intencionalmente a ordem constitucional ou abusar de suas competências.
• A acusação parte do Bundestag ou Bundesrat.
• O julgamento é feito pelo próprio tribunal, exigindo maioria de 2/3.
• Nunca houve destituição.
O modelo alemão destaca dois pilares: estabilidade institucional e responsabilização interna, evitando interferência direta do Executivo.

FRANÇA

O Conseil Constitutionnel é composto por nove membros, com mandatos de nove anos e renovação parcial. Ex-presidentes também podem integrar a corte. Sua remoção é possível por decisão do próprio Conselho, em casos de incompatibilidade grave ou violação ética. Nunca foi aplicado. O design institucional é pensado para blindagem máxima.

ITÁLIA

A Corte Constitucional tem 15 juízes escolhidos em partes iguais pelo presidente da República, pelo Parlamento e pelos tribunais superiores.
A destituição pode ocorrer apenas por:
• fim do mandato;
• renúncia;
• incapacidade;
• condenação criminal definitiva.
Não há registro de remoção por mecanismos políticos.

ESPANHA

O Tribunal Constitucional pode afastar magistrados por incapacidade, incompatibilidade ou descumprimento de deveres, mediante processo interno. Casos disciplinares existem, mas remoções completas são extremamente raras — e nunca por motivação política direta.

A Suprema Corte da Alemanha

ARGENTINA

O modelo é semelhante ao dos EUA:
• A Câmara dos Deputados acusa.
• O Senado julga, exigindo dois terços.
A Argentina é um dos poucos países com precedentes modernos:
• Eduardo Moliné O’Connor foi destituído em 2003 por mau desempenho.
• Juan José Galeano foi afastado em 2005.
Outros ministros renunciaram para evitar julgamento. Ainda assim, os casos são exceções num sistema onde o impeachment permanece controverso.

CANADÁ

Juízes da Suprema Corte podem ser afastados apenas por recomendação conjunta da Câmara dos Comuns e do Senado, após investigação conduzida pelo Canadian Judicial Council. Nenhum ministro da Corte Suprema jamais foi removido.

AUSTRÁLIA

A High Court segue lógica semelhante: destituição só por “comportamento impróprio” ou incapacidade, aprovada por ambas as casas do Parlamento. Nunca houve remoção.