Por Marcos Sacramento
As polêmicas e atitudes tóxicas expostas na atual edição do Big Brother Brasil mostram o quanto é importante falarmos da saúde mental da população negra. Expostos ao racismo da sociedade e maioria entre os desassistidos pelas políticas públicas, negros e negras carregam ao longo da vida traumas que podem dar origem aos mais diversos transtornos mentais.
Protagonista de alguns dos episódios mais abusivos do BBB 21, a rapper Karol Conká revelou, em uma entrevista, a reação que teve após sofrer racismo na infância.
“Aos 9 anos, um coleguinha da escola disse que só falaria comigo quando eu fosse branca. Quando cheguei em casa, coloquei minha mão em um balde com água sanitária, porque via minha mãe clareando os panos de chão daquele jeito”, disse Conká.
Situações como a relatada pela cantora são capazes de deixar marcas emocionais por toda a vida de uma pessoa negra. Somadas a inúmeras ofensas e microagressões recebidas ao longo da existência, podem levar a transtornos como depressão e ansiedade.
O participante Lucas Penteado, com quem Karol Conká discutiu, informou no primeiro dia do programa que sofreu de depressão no passado. Como quase todo rapaz negro, foi alvo de abordagem hostil da polícia e teve viagem recusada sem motivo em transporte por aplicativo.
De acordo com uma pesquisa do Ministério da Saúde divulgada em 2019, o risco de suicídio na faixa etária entre 10 e 29 anos é 45% maior entre jovens negros do que entre brancos.
Inclusive, a exposição à violência e a privação de cuidados básicos é capaz de provocar prejuízo no cérebro de crianças e levar a efeitos semelhantes aos verificados em situações de estresse pós-traumático.
Não por acaso, um levantamento do Data_labe, laboratório de dados e narrativas da Favela da Maré, no Rio de Janeiro, constatou uma conexão entre as internações hospitalares relacionadas à violência e o aumento das internações psiquiátricas.
“Os territórios onde se concentram o maior número de internações por violência e de internações psíquicas também são os lugares onde a renda e a escolaridade são baixas e a moradia é mais precária”, diz um trecho da análise.
Seria leviano jogar todos os equívocos cometidos por Conká e Penteado no BBB na conta dos efeitos do racismo. Pensar assim é desprezar toda a complexidade deles enquanto seres humanos, passíveis de acertos e erros independente da raça.
Isso não significa achar que os dois cresceram incólumes em uma sociedade fundamentada na discriminação ao povo negro. Porque é impossível existir algum negro ou negra cujo emocional não tenha sido afetado, em maior ou menor escala, pelos efeitos do racismo estrutural.